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Que história mal contada

Há histórias que conhecemos desde sempre. Sejam aquelas contadas pelas mães e avós antes de dormir ou aquele livro clássico que quase todo mundo leu e, quem não leu, conhece mesmo assim. Certos de que essa familiaridade com os enredos e os personagens seria suficiente para agradar o público, muitos produtores investem em títulos baseados e adaptados sem perceber que a chance de dar errado aumenta de acordo com a intimidade que existe entre o espectador e a história.

Tentativas de modernização, alteração ou ausência de alguns personagens e mesmo uma visão diferente daquela que existe no imaginário popular são mal aceitas e a decepção é, geralmente, o resultado mais comum.

Entre as muitas histórias já (mal) contadas algumas se destacam. Vamos a elas:

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Branca de Neve e o Caçador e Espelho, Espelho Meu

Pele branca como a neve, cabelos negros como ébano e lábios vermelhos como o sangue. Essa é a descrição da princesa Branca de Neve quando a história era contada de mãe para filho, na publicação dos Irmãos Grimm e até nas duas últimas adaptações cinematográficas da história. Mas ainda que alguns elementos estejam presentes, as semelhanças estão longe de ser muitas. Além de em ambos títulos a rainha má ser muito mais bela do que as próprias princesas, tentativas de modernização e uma até interessante tentativa de diminuição do machismo comprometem o resultado final. Em ambos, Branca vira uma espécie de guerreira. No primeiro o caçador é um aliado efetivo nas batalhas e no segundo a madrasta tenta casar-se com o príncipe para fugir das dívidas, entre tantas outras alterações.


Deu a Louca na Chapeuzinho e A Garota da Capa Vermelha

“Pela estrada a fora, eu vou bem sozinha levar esses doces para a vovozinha”. Nem mesmo a canção que embalava a jornada da menina com capa vermelha até a casa da avó faz sentido nas novas adaptações da história. Na primeira tem investigação policial, vovó praticante de esportes radicais, esquilo hiperativo e por aí vai. Na segunda, a trama é mais macabra e tenta desesperadamente, e sem sucesso, despertar suspeitas e assustar o espectador.


Robin Hood
Robin Hood era filho de um nobre inglês que virou herói roubando dos ricos para dar aos pobres e combatendo o tirano príncipe João, que usurpara o trono de seu irmão, Ricardo Coração de Leão. Em sua recente adaptação cinematográfica, porém não quase nada disso está presente. Ricardo já morreu e Robin não é filho de ninguém. Bom, pelo menos ele sabia usar arco e flecha.


Arthur
Aqui a história é um pouco mais complicada. O que conhecemos de Arthur envolve magia de druidas como o mago Merlin, a espada mágica excalibur fincada em uma pedra, Avalon, o santo graal e os cavaleiros da távola redonda, mas existe uma corrente histórica que defende o mito. Para eles, Arthur era um guerreiro romano em plena queda de seu império. O filme opta por contar essa versão histórica e, no lugar de magia, dá-lhe muita correria, batalha e sangue.


Imortais e Percy Jackson, o Ladrão de Raios
A mitologia grega também sofre com as adaptações. Teseu é personagem principal de Imortais. Aqui o herói ateniense recebe um monte de ajuda divina para derrotar o Minotauro e mistura a história do rei Egeu com uma espécie de segunda edição da Titanoquia. Já em Percy Jackson o problema é maior ao isolar pré-adolescente semideuses em um acampamento dos dias atuais. Esta invenção é anterior ao cinema, vem de uma série de livros, mas é claro que também chegou às telas diferente do que estava escrito.


A Fera
Modernização do conto de fadas A Bela e a Fera, aqui um estudante metidão do segundo grau tem uma maldição lançada por uma colega que maltrata e se transforma na tal “fera horrenda” do clássico, só que cheia de tatuagens e piercings. Ele ainda tem um prazo determinado para fazer alguém gostar dele de verdade, mas o isolamento é no Brooklyn, acompanhado de uma empregada e um professor cego. A bela é a jovem filho de um viciado em drogas. Pois é.


Alice no País das Maravilhas

A famosíssima história de Lewis Carrol já esteve pelo cinema com a animação Disney, mas voltou com essa nova adaptação de Tim Burton. Misturando elementos do primeiro livro de Carroll e do segundo, Alice Através do Espelho, o filme subverte a característica mais importante do clássico: Alice não é mais uma criança.


As Viagens de Gulliver
Que Gulliver estava fazendo uma viagem de navio, naufragou e foi parar numa ilha de pessoas bem pequenininhas, Liliput, a gente já sabia. Mas que ele era um covarde entregador de correspondência de um jornal em Nova York há dez anos anos, não. O mais impressionante é a mudança radical de personalidade.


Os Três Mosqueteiros
Athos, Porthos e Aramis são três mosqueteiros do rei e amigos inseparáveis. É a eles que o jovem D’Artagnans se une para lutar contra o malvado cardeal Richelieu e sua aliada a Milady de Winter. A história é até parecida, não fossem as manobras ninjas, as acrobacias deslizantes, os mecanismos elaborados e os navios voadores.


A Máquina do Tempo
A ficção científica em H. G. Wells conquistou e conquista até hoje o público, um dos principais exemplos é o livro, A Máquina do Tempo, que conta a história de um homem que, graças a seus conhecimentos matemáticos cria uma máquina capaz de viajar no tempo e que o leva ao ano de 802.701, onde conhece as raças inimigas Elói e Morlock. No filme, dirigido por seu bisneto, ainda existe essa viagem, mas há também um amor trágico e várias viagens no tempo que provam que não é possível alterar o passado.

Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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