A Fera

Acordando a besta

O novo thriller de ação italiano da Netflix, A Fera, é mais um título do streaming com o padrão de qualidade (leia-se aí com ênfase na palavra padrão) do canal, que provavelmente é uma compra mediante os problemas gerados pela COVID-19, tendo em vista que a Warner Bros. aparece com vinheta na abertura e tudo. Ainda que sua realização seja sempre competente, tensa e envolvente, o filme não apresenta elementos que o diferenciem de outros já existentes inclusive dentro da própria Netflix, em igual qualidade e em igual padrão. Mas quem disse que um produto descartável não pode envolver e entreter?

O filme acompanha Leonida Riva, o personagem-título, um veterano de inúmeras guerras que hoje se encontra destruído psicologicamente, a um ponto de ter abandonado a própria família para não envolvê-los em sua espiral de paranoia. Preferiu assim, ser odiado pela esposa e pelo filho adolescente e viver marginalizado, mas mantê-los sãos. Quando sua filha pequena é sequestrada, toda a fúria represada em anos precisará ser liberada em uma caçada pessoal que Riva empreenderá, onde nem sua própria vida será protegida; o importante é salvar quem ele ama, e nada mais.

Ainda que os clichês sejam a base da narrativa, com as tradicionais buscas por boates suspeitas, perseguições de motos e galpões abandonados que se transformam em palcos de chacinas, o filme se preocupa em apontar também sequências não tão óbvias assim, como a primeira sequência de perseguição (que temos certeza que não dará em nada por acontecer muito cedo, mas que tem um molho especial por quase colocar o mocinho em rota de desbaratar a trama, de cara) e uma tensa sequência onde Riva persegue uma plataforma em movimento, pilotada por uma das sequestradoras.

A Fera de Ludovico Di Martino

Quando olhamos pra trás, vemos que mesmo filmes já caídos no esquecimento hoje (ainda que injusto) como o remake Uma Saída de Mestre ou Ronin de John Frankenheimer. ainda assim contavam com memoráveis sequências de ação, elaboradas e repletas de novas formas de serem filmadas, observadas ou com perspectiva ampliada; mesmo a franquia ‘Velozes e Furiosos’ já gerou momentos impressionantes. Aqui, no entanto, esses momentos são raros, sem qualquer intenção de provocar uma marca duradoura no espectador, apenas servindo para contar aquela história naquele momento.

Com a agilidade que um filme do gênero pede, A Fera tem ritmo non stop e a seu favor uma duração enxuta que entrega rapidamente o recado que quer ser dado. Com pitadas de referências que vão de ecos ao Rambo original até chegar a Desejo de Matar, o filme aventa a possibilidade de discutir o resultado que conflitos armados legam à sociedade, mas ao fim e ao cabo, o passado de Riva não importa muito para a trama que está sendo contada exatamente pelo filme; durante muito tempo fica no ar a possibilidade de inimigos do passado do protagonista serem os responsáveis pelos eventos, mas isso acaba servindo como pano de fundo apenas.

Ou seja, o filme perde a oportunidade de ampliar uma discussão que muitos filmes já fizeram com sucesso (Sniper Americano), ou ao menos ter alguma discussão, que seja. Mas sua intenção final é exclusivamente passar o tempo do espectador que estiver a procura de um programa rápido que faça sentir emoções baratas e volúveis. Se essa é sua pedida pra hoje, A Fera não deixa nada a dever às melhores produções americanas em larga escala.

Um grande momento
Mil armas apontadas

Ver “A Fera” na Netflix

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