(This Must Be Place, ITA/FRA/IRL, 2011)
Drama
Direção: Paolo Sorrentino
Elenco: Sean Penn, Frances McDormand, Judd Hirsch, Eve Hewson, David Byrne, Kerry Condon, Harry Dean Stanton, Olwen Fouere, Joyce Van Patten, Liron Levo, Heinz Lieven
Roteiro: Paolo Sorrentino, Umberto Contarello
Duração: 118 min.
Nota: 8
“Tem algo errado aqui. Não sei bem o quê. Mas há algo.” Esta é uma expressão repetida algumas vezes ao longo de Aqui é o Meu Lugar. Mas nem precisaria ser dita, esta sensação de estranheza já é percebida logo na primeira cena do novo filme do diretor italiano Paolo Sorrentino (Il Divo). Um homem de meia-idade traja-se como faz há mais de vinte anos: esmalte, maquiagem, brincos e spray de cabelo.
Este é Cheyenne (Sean Penn), uma estrela do rock aposentada dos palcos, entediado que passa os dias na sua pacata vida na Irlanda. Divide-se entre atividades triviais com sua esposa Jane (Frances McDormand), compras de ações na bolsa e a amizade com Mary, uma jovem triste (Eve Hewson, filha do cantor Bono Vox). Sua rotina muda completamente quando seu pai judeu, com quem não tinha contato, morre. Ao retornar a Nova York descobre que o pai tramava vingar-se de uma humilhação sofrida durante o Holocausto. O cantor então, parte em buscar de Aloise Lange (Heinz Lieven), o autor da afronta, para honrar o pai.
A princípio tudo pode soar estranho e confuso, mas o brilhantismo desta produção consiste exatamente no desenvolvimento do roteiro e no elenco que o executa. A história consegue ser ao mesmo tempo leve e profunda. Recheada de referências. E somos levados a descobrir a cada cena o que há por trás de toda aquela maquiagem.
Propositalmente, o diretor Paolo Sorrentino desenvolveu o visual de Cheyenne inspirando-se no vocalista do The Cure, Robert Smith, que há anos conserva a mesma aparência. O nome Cheyenne também é uma referência. Faz alusão ao da vocalista Siouxsie Sioux, pois tanto cheyenne quanto sioux são nomes de tribos indígenas. Junta-se à composição do personagem uma fala pausada, entrecortada, bem parecida ao jeito de se expressar de outra figura ímpar do rock: Ozzy Osbourne.
O que a principio parece ser uma caricatura de rock star aposentado, na verdade é uma metáfora sobre a sensação de deslocamento, de não pertencer a um determinado lugar ou “tribo”. Cheyenne, apesar dos seus 50 anos, ainda é uma criança. Não amadureceu. Quase morreu pelo uso de drogas, mas não fuma, pois o fumo aqui significa passar para a vida adulta. Tem uma piscina enorme em casa, mas até hoje não sabe por que nunca a encheu e a vida, assim como uma piscina, não tem utilidade se não a preenchermos de forma adequada. Carrega marcas das consequências causadas por letras de música de cunho depressivo que escreveu, quando na verdade nem sabe se era este o sentimento que levou a redigi-las.
Como o amadurecimento não surge do dia para a noite, em Aqui é o Meu Lugar a viagem de Cheyenne em busca do algoz do seu pai é o mote utilizado por Sorrentino para nos apresentar o crescimento do personagem. Nesta road trip que se inicia um pouco antes da metade do filme, o cantor tem diversos encontros. A começar pelo amigo David Byrne, que interpreta a si próprio, numa cena de catarse, onde finalmente Cheyenne começa a se “despir”.
É durante estes encontros que o filme começa a crescer, os aspectos técnicos da produção ficam mais evidentes, a fotografia começa a ganhar destaque e a trilha sonora passa a ser companhia constante. Desde The Passenger, executada por Iggy Pop, até as diversas variações de This Must be The Place, do Talking Heads, música que dá o título original do filme.
É extensa a variação de tipos que Cheyenne encontra durante sua viagem. Um investigador obcecado por nazistas (Judd Hirsch), uma garçonete mãe solteira (Kerry Condon), a mulher do nazista (Joyce Van Patten), o criador da mala com rodinhas (Harry Dean Stanton), dentre outros tipos tão peculiares, estranhos e densos quanto o protagonista. Os minutos de interação com eles são sensacionais. Diálogos que transitam entre o drama e a comédia dão o tom das conversas. A cada momento que fica mais próximo o encontro com Aloise Lange, mais perto de outras descobertas ele fica.
O que faz falta no filme e deixa o espectador com a sensação de doce tirado da boca de criança é falta de cenas entre Sean Penn e Frances McDormand. O início da projeção onde os dois convivem é delicioso. Jane é o contrapeso da vida de Cheyenne. Mas a relação entre eles fica restrita ao começo do filme, assim como a história da menina triste que não é retomada. Apenas uma mínima referência é feita.
O desfecho da trama dá margem a diversas conclusões. Vingar-se ou perdoar Lange é o aspecto moral da história. Desbravar o próprio universo e a partir disto descobrir o nosso conforto interior é a mensagem de Paolo Sorrentino tão bem transmitida através da interpretação de Sean Penn.
Um Grande Momento
A catarse com David Byrne.
Links
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