Chloé Zhao e elenco falam sobre transformação em Hamnet

“Eu estava realmente me perguntando por que ainda queria contar histórias”. Foi assim que Chloé Zhao iniciou a coletiva de Hamnet: A Vida Antes de Hamlet, sensação desde sua estreia em Telluride. A diretora contou que o livro de Maggie O’Farrell a encontrou num momento de inquietação. “O romance fala de amor, morte, transformação, e me lembrou que a arte pode ser um jeito de atravessar tudo isso. Foi uma espécie de chamado.” Ela explicou que não estava interessada em uma adaptação literal, mas em traduzir a experiência emocional do livro. “Queria preservar essa sensação de algo íntimo e, ao mesmo tempo, vasto. Como um sopro que atravessa os séculos.”

Jessie Buckley, que interpreta Agnes, disse que foi guiada mais pela intuição do que por qualquer racionalidade. “Eu senti o livro antes de entendê-lo”, contou. “Chloé me dizia para confiar na minha própria estranheza. ‘Não tenta fechar a personagem, deixa que ela te encontre’, ela repetia. E isso abriu um caminho muito bonito. Agnes é uma mulher que lê o mundo por outros canais, e eu precisava acessar isso sem medo.” Zhao completou: “A Jessie trouxe um tipo de coragem silenciosa que mudou o filme inteiro. Ela me ensinou sobre o trabalho com sonhos, com imagens internas, e isso virou parte da linguagem do set.”

“As emoções de Agnes são como água. Elas correm, mudam de temperatura, derretem, congelam”, explicou o compositor Max Richter. Ele disse que mergulhou no projeto como se estivesse compondo para um corpo vivo. “Eu queria que a música tivesse essa fluidez. Ela precisava carregar alegria, maternidade, perda profunda, raiva, esperança. Às vezes, tudo ao mesmo tempo.” Ele contou que usou instrumentos imperfeitos, texturas quase quebradas, porque “a beleza do filme está nos pontos em que a vida dói”. Zhao lembrou que o trabalho de Richter influenciou até a decupagem: “O som dele fazia o set respirar. A música dele está na raiz do filme.”

Os irmãos Noah e Jacobi Jupe têm no filme dois dos papéis mais emocionalmente delicados. Noah, que interpreta Hamlet, confessou que trabalhar com Shakespeare foi assustador. “Eu não sabia nada. E aí Chloé me pediu para começar pelo discurso de ‘ser ou não ser’. Eu estava tremendo, e acho que ela queria justamente isso. O nervosismo virou parte da cena.” Jacobi, que vive Hamnet, falou sobre encontrar a dor sem se perder nela. “É estranho interpretar alguém que existe principalmente pela ausência. Mas o set era tão seguro que eu consegui ir até lugares que normalmente evitaria”.

A cena da morte foi lembrada por Buckley como um dos momentos mais intensos da carreira. “Gravamos em ordem cronológica, então quando chegamos ali éramos uma família. Eu não queria ‘atuar’ aquela dor. Queria permitir que ela passasse por mim. Chloé criou um espaço quase ritualístico. Ela nos levou até aquele ponto e depois nos segurou. Acho que todos sentimos aquilo juntos.” Zhao confirmou: “Não era sobre performance, era sobre presença. Sobre estar ali como seres humanos.”

A diretora também falou sobre a escolha estética de trabalhar com o diretor de fotografia Łukasz Żal em planos mais contidos. “Eu sempre persegui horizontes, grandes paisagens. Aqui quis reduzir o mundo a um quadro, como se fosse um palco. Descobrir se era possível conter uma vida inteira nesse recorte.” Ela contou que a decisão surgiu no primeiro dia, durante o parto. “Percebemos que não precisávamos correr. A beleza já estava ali.”

Perguntada sobre a força universal da história, Jessie respondeu de forma simples e devastadora: “Hamnet é sobre amar até o limite da vida. Sobre segurar alguém e, ao mesmo tempo, saber que vai precisar soltar. Esse equilíbrio impossível é o que nos torna humanos.” Zhao sorriu, emocionada, antes de dizer apenas: “É exatamente isso.”

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