Crítica | Streaming e VoD

Milagre na Cela 7

(Yedinci Kogustaki Mucize, TUR, 2019)
Nota  
  • Gênero: Drama
  • Direção: Mehmet Ada Öztekin
  • Roteiro: Özge Efendioglu, Kubilay Tat
  • Elenco: Aras Bulut Iynemli, Nisa Sofiya Aksongur, Deniz Baysal, Celile Toyon Uysal, Ilker Aksum, Mesut Akusta, Yurdaer Okur, Sarp Akkaya, Yildiray Sahinler, Deniz Celiloglu, Gulcin Kultur Sahin, Ferit Kaya, Cankat Aydos, Hayal Köseoglu, Dogukan Polat, Serhan Onat, Emre Yetim
  • Duração: 132 minutos

O cinema enquanto valor pessoal e intransferível de ordem subjetiva. Mesmo tendo consciência do teor dessa colocação, não é fácil se colocar em lugar de incoerência aparente. A observar: o que nos leva a em um momento questionar os ditos méritos de uma produção e em outro esses mesmos dados serem minimizados, e até realçados positivamente?

O melodrama é um subgênero que não tem sua origem necessariamente no cinema, e que a dramaturgia como um todo absorveu de diferentes maneiras e com resultados igualmente distintos. Douglas Sirk se notabilizou pelos seus na era de ouro, mas essa vertente sofreu mutação ao ser acessada por cineastas e culturas diferentes, como Pedro Almodóvar e Karim Aïnouz. O cinema turco vive uma fase de intensa popularidade, ao mesmo tempo em que se vê representado por Nuri Bilge Ceylan no circuito de festivais e de melhores da década, o cenário de cinema de viés popular do país corre por outra seara, com auxílio do serviço de streaming.

O Milagre na Cela 7 (2019)

Milagre na Cela 7 é um inesperado hit atual da Netflix cujos arroubos melodramáticos ajudam a justificar seu sucesso (por aqui e na Turquia), tendo em vista que a plataforma conta com um arsenal infindável de produções locais, muitas delas com tanto apelo aos canais lacrimais quanto aqui. Mas a fórmula “quarentena + história sentimental + produção bem cuidada + extremo talento do protagonista” talvez tenha dobrado seus potenciais. Que fique claro que o longa dirigido por Mehmet Ada Öztekin já estreou há cerca de um mês sem qualquer alarde, e nos últimos 10 dias explodiu em acessos, comprovando o erro estratégico da plataforma, tendo em vista o primeiro lugar alcançado em audiência.

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A estrutura do longa é herdada do original sul-coreano de 2013, um enorme sucesso local que rendeu inúmeras versões, sendo essa a quarta. Em todos eles temos o forte laço que une pai e filha, separados quando o primeiro é acusado de um crime que não cometeu. Toda a dramaturgia é ainda aditivada pelo fato de que o protagonista tem deficiência intelectual e vive sozinho com a menina e a avó, e precisa enfrentar o dia a dia ainda mais duro pela condenação de ter matado uma criança. Se as tintas utilizadas carregaram na emoção em todas as versões, o que se poderia dizer aqui é que não se justificaria a repetição da fórmula. Mas… Milagre na Cela 7 funciona.

Milagre na Cela 7 (2019)

Muito do mérito e da intensidade com que o público se envolve é graças a como Aras Bulut Iynemli dá vida ao personagem principal. Tal qual já fizeram anteriormente Dustin Hoffman, Sean Penn e Leonardo DiCaprio entre tantos, o desafio de Aras era convencer e envolver o espectador em um projeto de tanto risco quanto esse, e sua função é cumprida com galhardia. Memo é um poço de doçura, inocência e afeto, e a cada cena nos envolvemos e torcemos mais pelo protagonista – isso se deve à entrega do ator, que desaparece para fazer surgir uma figura de sólida delicadeza. Sua parceria com a pequena Nisa Sofiya Aksongur é um pilar de entrada nesse terreno de amor tão absoluto e irrestrito que convence cada um à sua volta.

É essa humanidade intrínseca, essa docilidade mesmo nas maiores adversidades, que acabam por fazer uma produção tão desavergonhadamente emotiva e piegas, cujos clichês não pedem licença para dar as caras e que aproximam tanto o material a um caráter exploratório das relações humanas, funcionar. Por não ter medo de nenhum desses conceitos e ser tão direto e despretensioso com suas intenções, Milagre na Cela 7 vai do início ao fim nos mantendo na gangorra, entre os sorrisos e as lágrimas.

Um Grande Momento:
LINGO LINGO!!!

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Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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