Problemas usuais, como a retenção na alfândega, somaram-se a outros bem mais graves, como a recorrente falta de informação da equipe de monitores, uma programação desequilibrada e a catastrófica falta de parâmetros para a projeção digital.
Formato da maioria dos títulos selecionados, o digital se perdeu em compressões e formatos e alterações de cores, faltas de luz e alguns soluços na projeção atrapalharam a experiência do público. Apesar de não ser um problemas exclusivo, foi na Mostra que a situação chegou ao seu ponto mais caótico, mas acabou tendo resultados positivos. Por causa da bagunça, a Associação Brasileira de Cinematografia – ABC – resolveu criar um grupo para preparar e divulgar as Recomendações Técnicas para a Imagem e o Som nas Mídias Audiovisuais Digitais. O que já deveria ter sido feito há muito tempo.
Os muitos ajuste de última hora nas sessões e atrasos incomodaram muito mais do que o usual. Qualquer público de mostra ou festival sabe que reformulações na programação podem acontecer, mas num mesmo dia cinco ou mais sessões serem canceladas foi demais até para os mais pacientes. Enquanto cartazes em papel sulfite eram pregados na bilheteria com anotações a mão com os dizeres: “talvez não tenha” a busca por informações era frustrante. Sem poder fazer nada e depois de ouvir muito, monitores mal preparados para lidar com o público causavam mais problemas ao invés de tentar resolver alguma coisa. O resultado é que alguns filmes só puderam ser conferidos mesmo na repescagem e muita gente perdeu a viagem ao cinema, já que só descobria o cancelamento ao chegar lá.
Se alguns problemas tiveram a participação da organização, outros foram completamente independentes dela. O momento econômico parece ter afetado fortemente a produção cinematográfica e a opção pela não repetição dos títulos exibidos no Festival do Rio deixou isso ainda mais claro. A qualidade de títulos com distribuição garantida no país pode enganar numa primeira vista, mas uma visita rápida por obras ainda não compradas pelas distribuidoras nacionais, em ambos festivais, demonstra que algo ruim está acontecendo.
Um pouco mais afastado do público, mas ainda assim um problema considerável, o diálogo difícil com a assessoria de imprensa fez com que a cobertura ficasse prejudicada, principalmente por veículos menores e de publicação eletrônica, que parece ainda ser disconsiderada por alguns assessores. Contraditoriamente, por mais que os releases e avisos de cabine sejam enviados diariamente, vários e-mails de informações são ignorados, assim como o pedido de credenciamento, que este ano não se dignou nem a um “desculpe, seu veículo não é interessante para nós”, numa postura que envergonha os muitos anos do evento. Mas nem o público, nem a Mostra mereciam o revide mais adequado e quem é mesmo apaixonado por cinema dá o seu jeito.
Se de um lado sobram problemas, de outro as qualidade são inegáveis. Presenças ilustres e um juri presidido por Atos Egoyan, por exemplo, contam sempre muitos pontos a favor. As retrospectivas do ano também foram deliciosas. Quem não gostaria de ver Uma Rua Chamada Pecado ou Sindicato dos Ladrões na telona? Sem falar no deleite de ver Pradjanov com todas as suas cores e imagens (ainda que algumas projeções não tenham sido traduzidas adequadamente) ou, paralelamente, aproveitar os bate-papos sobre cinema com cineastas daqui e ver os olhos do público brilhando na sessão de O Mágico no vão-livre do MASP.
Como alguém que vai reaprender a andar sem aquele que sempre a guiou, a Mostra precisava passar por um momento de “encontro do equilíbrio” mesmo e, dentro do esperado, mostrou que tem força para superar os obstáculos, mas precisa se organizar um pouco mais no futuro. Que os erros dessa última edição fortaleçam e aprimorem ainda mais este que é um dos mais importantes eventos cinematográficos do país.