Em 2006, a australiana Rhonda Byrne teve a ideia de lançar um documentário reunindo vários depoimentos de escritores, pesquisadores e filósofos sobre a Lei da Atração, segundo a alguém é capaz de conseguir tudo aquilo que desejar incondicionalmente. Em seguida, Byrne, uma das pessoas mais influentes do mundo, lançou um livro com o mesmo nome, O Segredo, e a mesma teoria, que virou um bestseller imediato, traduzido em 44 idiomas. Espécie de ícone maior desse universo de produtos ultravendáveis de autoajuda e programação neurolinguística, a teoria é famosa até hoje. Se você quer, deseje muito fortemente e tudo acontecerá.
O Segredo: Ouse Sonhar é uma ficção derivada da franquia de livros e filmes que traz inclusive o selinho que a identifica. O longa, dirigido por Andy Tennant, conhecido por romances como Para Sempre Cinderela, não vai muito além do básico, tudo é esquemático, bem tradicional e extremamente fácil, para que não haja perigo que o espectador se confunda. O pessimista e negativo é assim completamente e em tempo integral, não há uma fala em que ele se mostre diferente. O otimista é do mesmo jeito, só que ao contrário. Tudo é facilitado, não há uma preocupação de que esteja demonstrado no modo de pensar os planos, na trilha, nada, tudo está nos diálogos e nas atuações.
Não que elas precisem de muito esforço, mas são importantes para manter a postura de positividade e negatividade como pólos de demarcam o andamento da trama, conduzida por Katie Holmes (de A Justiceira) e Josh Lucas, que já trabalhara com Tennant em Doce Lar. Aliás, ambos fazem até muito mais do que podem com o pouco material que tem em mãos, o roteiro de Bekah Brunstetter (responsável pela adaptação), do próprio diretor e Rick Parks é bastante complicado. Além de investir em impasses e dilemas que não fazem nenhum sentido para a relação principal do filme apenas para ganhar tempo – aquele clássico encher linguiça -, tenta confundir o espectador.
Outras pequenas coisas também incomodam, como a não atualização. Ainda que tenha uma cara um pouco mais elaborada do que uma produção do Hallmark Channel é como se O Segredo: Ouse Sonhar carregasse uma espécie de marca sutil daqueles filmes famílias de lá. O sentimento é de algo deslocado no tempo, o que se acentua com alguns diálogos e afirmações como “é coisa de garoto”, “vive numa casa de meninas”, “uma mulher direita não deve se comportar assim”, “poucos homens estariam dispostos a assumir uma mulher como você” e coisas do tipo que já não fazem mais o menor sentido hoje em dia. Até mesmo alguns personagens parecem ter saído de uma máquina do tempo, como a Bobby de Celia Weston (de Um Senhor Estagiário), sogra da protagonista. Fica sempre uma coisa com cheiro muito forte de naftalina.
Outros incômodos vão além da questão fílmica, alcançam a própria teoria e talvez estejam muito mais associados à visão pessoal da crítica. Há sempre uma conotação muito apegada ao ter. O destaque aos bens materiais, as roupas, os carros estão sempre induzindo aquela lógica capitalista de que só existe felicidade se há a mansão dos sonhos, a caminhonete na garagem, o computador sobre a mesa e o pônei no estábulo. Há uma relação com a teoria também e o modo como ela é transmitida também assumem um caráter quase religioso, o que também ultrapassa uma linha confusa.
Mas, ainda assim, tendo por trás de si uma das mais influentes teorias da história, o filme vai encontrar o seu público, assim como fez o documentário e o primeiro livro. Mas, enquanto produto audiovisual, O Segredo: Ouse Sonhar é como um telefilme produzido em larga escala para a no final dos anos 1990, começo dos anos 2000, com movimentos padrão, cenários locados, falas quadradas e final redondinho. Ah, a pizza é melhor pedir mesmo, viu?
Um grande momento
Não tem
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