Casa, o novo documentário de Letícia Simões traz às telas a história de três gerações. Com muita coragem, a diretora abre as portas de suas própria história e volta à casa da mãe para encontrar maternidades e vivências. O Cenas de Cinema fez 3 perguntas à diretora sobre o filme que estreou na última quinta-feira no cinema.
Cenas de Cinema: Letícia, o seu filme tem uma característica muito pessoal, muito focada na sua história com a sua mãe, mas ao mesmo tempo encontra uma universalidade ao expor traços que são comuns à relação de mãe e filha. Você se surpreedeu com essa identificação das pessoas? Achava que o filme seria tão universal assim?
Letícia Simões: Essa sempre foi uma preocupação, desde quando o filme ainda era um projeto. É uma preocupação particular minha, mas sempre quis que o filme partisse de um lugar íntimo, atravessasse questões sociais e chegasse ao outro lado, à história de cada pessoa. Obviamente, isso é impossível de controlar. Contudo, o pensamento sempre esteve: na decisão de contextualizar cada personagem, em trazer as cartas para a narração, em privilegiar determinados momentos de humor contrapostos a momentos mais tensos… Enfim, em construir uma narrativa mais universal, mesmo.
CdC: Ao mesmo tempo, sua mãe e sua avó são figuras muito únicas que, assim como você, estabelecem limites de exposição em cena. Você acha que há uma encenação como proteção ou até como realce em cena?
LS: Com certeza. Há situações e falas que só existiram, estou segura, porque havia uma câmera presente. O exercício de saber que há alguém escutando é poderosíssimo – digo isso pensando nas personagens de minha mãe e minha avó. Já em relação à minha presença, creio que se enquadra mais no lugar da proteção, mesmo. Da proteção, da dificuldade em perder o poder de realizadora…
CdC: Uma das coisas que eu percebo no filme é como ele estabelece um jogo de afetos geracionais onde o conflito de mães e filhas é acentuado com as relações com as netas (algo até bem feminino). Há uma cena em que sua mãe questiona justamente o modo como você enxerga a sua avó. Havia uma consciência prévia disso no roteiro?
LS: Esse ponto, o do conflito geracional, sempre esteve na premissa do roteiro. Talvez o que tenha se revelado com o filme foi a relação com a passagem do tempo sentida por essas três gerações. Algo que a Letícia de 27 anos não tinha como dar conta, mas a Letícia de 31 (quando o filme termina), começa a compreender: o peso que ser uma mulher de 92 anos, viúva, no Brasil, carrega, assim como o peso de ser uma mulher divorciada de 66 anos. Tanto carregam quanto o peso que carregaram: o corpo, o rosto, o peso da memória, das decisões… Talvez esse aspecto tenha sido o mais revelador na feitura do filme e não estava presente na escrita do roteiro.
Leia a crítica de Casa, de Cecilia Barroso