- Gênero: Documentário
- Direção: Ian Derry
- Roteiro: Johanna Nordblad, Elina Manninen
- Duração: 40 minutos
-
Veja online:
A Netflix é muito boa em conseguir promover seus curtas metragens documentais. Ano passado, por exemplo, ainda que tenha perdido a estatueta da categoria, conseguiu fazer três deles serem indicados, dois deles já tinham sido lançados há muito tempo na plataforma. É o caso desse Sem Respirar, que está estreando hoje, nove meses antes do anúncio das próximas indicações. Como se trata de um documentário esportivo, e os americanos adoram esse tipo de narrativa onde a superação já vem imbuída no contexto geral, provavelmente ainda ouviremos falar muito desse título. No corpo dessa estrutura, acaba-se por abraçar toda uma contemporaneidade fornecida pela pandemia; nada disso atrapalha as pretensões do seu caminho.
O diretor Ian Derry segue sua protagonista, a mergulhadora Johanna Nordblad, pela segunda vez, após o curta Johanna, onde já foi inserida anteriormente. Aqui, Derry demonstra não apenas carinho pela personagem e pelos seus feitos, mas uma exploração plástica diante de uma mulher adjetivada como artista. A câmera que filma o corpo da atleta em nenhum momento tenta valorizar mais sua presença que o espaço físico, ou vice-versa. É um processo de consonância explícita promovida pelo cineasta; a partir de determinado momento, Johanna, neve, lago congelado, atmosfera em graus negativos, tudo isso se torna uma coisa única. O filme ganha muitos pontos quando a imagem se sobrepõe à palavra, que elenca situações que povoam o filme sem importar muito.
O que importa em Sem Respirar é sua tentativa de bater o próprio recorde e alguns outros além, tornando-se o ser humano a ficar por maior distância submersa em águas geladas. Tudo isso ocorre na já congelante Finlândia, da qual só temos vislumbre de seus rios no inverno, abaixo de zero. A relação entre Johanna e sua irmã Elina é a mola propulsora da vida do ritmo narrativo, e é uma figura-chave na vida dessa mulher. Incentivando-a, Elina parece não ter tido muito tempo para uma vida privada, e o filme perde a oportunidade de explorar um possível conflito. Todo o respeito a quem decidiu que o melhor era ter foco, mas não creio que se desenvolveria como algo avulso; o que Johanna pode ter provocado à vida da irmã ao ter permitido essa relação de simbiose tão complexa?
O filme não está disposto a abalar as convicções da protagonista, colocando-a como uma heroína talvez acima dessas discussões; Johanna também tem um filho, que declara que prefere ter essa mãe a uma “mãe normal”. Mas é tudo tão cristalino de proteção de todos em relação a ela, que nos perguntamos se esse brilho da atleta nunca está do avesso, em suas relações. Quando a COVID-19 aparece na narrativa, esse debate parece insustentável, mas o filme expõe mal as contradições que surgiram durante o ano onde precisou se afastar de tudo. A questão é tratada de maneira muito simplória, abolindo a exploração de uma ranhura que explodiu a tal ponto de mudar suas prioridades na vida, como declara no desfecho. O espectador, no entanto, não é apresentado a isso de maneira não mais que tímida.
Ainda assim, há extrema beleza plástica em Sem Respirar, a um ponto dessa observação ser feita, antes do término. De fato o corpo esguio de Johanna nadando por águas perigosas conjuga ao mesmo tempo liberdade, paz e agonia, de maneira indissociável. Derry já a conhece e por isso consegue capturar essa força indomável por trás de uma postura perseverante diante dos desafios. O espaço congelado que é o cenário único do filme não fica atrás no quesito beleza traiçoeira, como uma ameaça que devemos respeitar. A produção acaba então ficando no meio do caminho: se verbalizasse mais sobre os conflitos da protagonista, ganharia relevância dramática mas perderia em adequação narrativa, no entanto ao focar no esporte e no triunfo (apenas), o filme parece deslocado até na própria duração. Tinha muito mais história pra contar ali.
Um grande momento
“Eu sempre fotografei a minha irmã”