Crítica | CinemaDestaque

O Sobrevivente

Mais um filme...

(The Running Man, EUA, 2025)
Nota  
  • Gênero: Aventura
  • Direção: Edgar Wright
  • Roteiro: Edgar Wright, Michael Bacall
  • Elenco: Glen Powell, Josh Brolin, Colman Domingo, Lee Pace, Michael Cera, Katy O'Brian, William H. Macy
  • Duração: 130 minutos

Edgar Wright sempre foi um cineasta com o qual o cinéfilo esperava com certa ansiedade seus novos projetos. Ele conseguiu amealhar respeitabilidade na crítica e na cinefilia, em um universo onde é complexo unir esses dois mundos. No entanto, anos de produções bem sucedidas o colocou nessa situação incomum, algo bem próximo a unanimidade, ao menos em relação à boa vontade coletiva. Seu novo filme, a adaptação de um romance de Stephen King, O Sobrevivente, não o tira desse lugar, mas nos fornece pela primeira vez uma abordagem genérica do cinema de gênero, como se estivéssemos assistindo a uma produção rodada por qualquer burocrata dentro da máquina hollywoodiana de processar talentos. Ainda que a diversão esteja garantida, sua abordagem não guarda alguma particularidade dentro do que a mesmice fornece continuamente. 

Em 1987, a primeira versão tinha como função ajudar a massificar a imagem de um jovem Arnold Schwarzenegger como astro global do cinema; a nova produção tem a mesma função a realizar-se com Glen Powell, que desde Todos Menos Você tenta alcançar um lugar cada vez maior no firmamento de Hollywood. Talento e carisma ele já mostrou inúmeras vezes, incluindo em Assassino por Acaso que Richard Linklater deu a ele de presente. Em O Sobrevivente a tarefa é ainda mais fácil em contexto dramático, vide que o filme é bem mais frenético e descerebrado que sua encarnação anterior. O teste aqui é para suas habilidades enquanto profissional de primeira grandeza, capaz de fazer a diferença nos holofotes e letreiros. 

Nesse sentido, Powell consegue sua graduação com louvor. Próximo a metade do filme, O Sobrevivente tem uma cena de perseguição dentro de um hotel, que termina de maneira desconcertante, e seu protagonista consegue elevar o material dali com sua presença. Além do personagem central, o elenco da produção tem muita química com seu protagonista, com nomes como os de William H. Macy (indicado ao Oscar por Fargo), Josh Brolin (indicado ao Oscar por Milk) e Colman Domingo (indicado ao Oscar por Rustin), em performances pontuais que carregam de energia o filme. Através de suas aparições, e da maneira como todos parecem se divertir em cena, entregam ao espectador um material cuja qualidade não está no nível do que seus intérpretes representam, mas que não deixa de entreter. 

O grande problema de O Sobrevivente é justamente ter um cartão de visitas que nos permita conjecturar uma produção muito acima da média, como é comum entre as produções dirigidas por Wright. O assustador resultado, que sequer ousa ir além do básico em sua composição e ideias, é no mínimo frustrante; não há em cena uma tentativa de mostrar evolução frente ao que é produzido em linha de fábrica pelos grandes estúdios. Estamos diante de um filme corriqueiro e sem brilho, no que contrasta exatamente com o elenco que aceitou representar essa história. Não há um olhar que pareça diferenciado, ou um argumento que não soe repetitivo não apenas no que conta, mas principalmente na forma como conta. 

Após os últimos Baby Driver e Noite Passada no Soho, a popularidade de Wright teria chegado ao que parecia ser o auge; prestigiado e reconhecido pela cinefilia, ele podia embarcar em muitos projetos. Ao aceitar essa nova adaptação, ficou claro que ele teria algo a acrescentar ao material original. Isso não somente não ocorre, como também soa anacrônico que sua realização não ofereça qualquer elemento mais instigante ao que o longa dirigido por um burocrata como Paul Michael Glaser já oferecia. O que existia no original era uma espécie de inocência no que víamos, ainda que o teor da produção buscasse o trágico; aqui, essa também é a ideia, de tratar o horror como algo corriqueiro para o futuro, mas o resultado é um filme que não suscita qualquer preocupação ou reflexão. 

Um filme pode simplesmente ser um passatempo descerebrado, alguns ótimos filmes o são inclusive. O que acaba afundando O Sobrevivente é a sensação de falta de cuidado, de pouco esmero, de irrelevância. Do ponto de partida até a virada final, o filme nem tem fôlego para sustentar sua tentativa de adrenalina, e nem tem assunto suficiente para permitir que suas camadas acabem por demonstrar um vigor narrativo para o que vemos. A partir de determinada sequência, o filme nos perde e temos a certeza de que nada mais será acessado, nos deixando à deriva de um projeto cansado. 

Um grande momento
Pendurado no letreiro 

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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