- Gênero: Ação
- Direção: David Ayer
- Roteiro: Kurt Wimmer
- Elenco: Jason Statham, Emmy Raver-Lampman, Bobby Naderi, Jeremy Irons, Josh Hucherson, Jemma Redgrave, David Witts, Taylor James, Phylicia Rashad
- Duração: 100 minutos
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A partir da metade do caminho, o espectador passa a entender que tem sim propósitos por trás do festival de cretinice chamado Beekeeper – Rede de Vingança, estreia desta semana nos cinemas. Eles não são necessariamente louváveis, mas englobam muito mais contribuição artística do que é apresentado em seu terço inicial. Não tem como cobrar muito diante do que é apresentado por David Ayer, mas quando percebemos que algo parecido com um ‘fundo de poço’ foi atingido, não há outra forma de continuar se não olhando para cima e aproveitando o que é oferecido em matéria de diversão descerebrada. E aí é que se percebe que entramos em uma máquina do tempo que nos carrega até uma mistura dos anos 1980 com os anos 1990, e de lá não há como escapar sem antes mergulhar nos prazeres culpados que o longa oferece.
Somente Ayer conseguiria lidar com algo tão infame quanto o roteiro cheio de buracos de Kurt Wimmer, que deve ser um dos piores em atividade atualmente no mercado, vide seus créditos. Do festival de mesmices apresentados, o cineasta de Bright e do subestimado Corações de Ferro extrai uma espécie de homenagem não assumida ao cinema brucutu de quarenta anos atrás, aquele que pariu Arnold Schwarzenegger, Sylvester Stallone, Chuck Norris e daí pra baixo. Olhando em retrospecto, fica claro como em Beekeeper – Rede de Vingança nada deveria ter sido levado a sério desde o início, a contar pela péssima Emmy Raver-Lampman como co-protagonista de Jason Statham, e ajudando o projeto a se mostrar enquanto paródia de ação (ou um thriller cômico).
Em cena, as coisas vão fazendo cada vez menos sentido, e quando você percebe que não deve mais procurar algo do tipo, é que está na hora de virar a chave e notar que a canoa não é tão furada assim. A cada vez que parece ter encontrado o fim da linha, o filme abre uma nova e mais estapafúrdia porta para diante, como se fosse uma boneca russa do mal. A julgar pela empresa dentro da empresa dentro da empresa, Beekeeper – Rede de Vingança não tem qualquer autonomia sobre sua narrativa. A partir de determinada ideia, o filme parece que passa a olhar para o espectador dando uma piscadinha, para mostrar que pode sim acontecer algo ainda mais absurdo, ser encarado com uma normalidade surreal e isso não representar nada além do que liberdade ampla e irrestrita para ‘despirocar’.
É bom deixar claro para o leitor que você não está de frente para um episódio da franquia John Wick, quer dizer, não há nada sofisticado em cena. Nada é muito elaborado ou dotado de algo especial esteticamente, e isso alimenta a tal nostalgia oitentista que o filme carrega. Exatamente por isso que toda a bagunça parece efetivamente mais simbólica do quanto o cinema não precisa de muita elucubração para fazer sentido, ou alcançar nossos desejos mais primitivos. Trata-se apenas de um homem que consegue ludibriar meio mundo e destruir exércitos sendo apenas o Jason Statham, e se você entrar na brincadeira, muito rapidamente você também passa a acreditar no inacreditável: como Beekeeper – Rede de Vingança, mesmo composto de tanto escárnio cinematográfico, possa funcionar tanto.
Além de Statham, a produção é repleta de grandes atores cuja zoeira é nítida. Temos um Jeremy Irons acreditando muito em cada coisa que faz, temos um Josh Hutcherson se entregando sem piedade ao exagero, temos um David Witts cuja vontade de socar é recorrente. Mas ninguém faz por Beekeeper – Rede de Vingança o que Bobby Naderi faz. O ator fez figuração em Argo, cresceu em Sob a Sombra e chega aqui com um personagem surreal de tão inexplicável. Ele é o parceiro da protagonista no FBI, e é tudo hilário em cada centímetro da composição; do trabalho corporal em relaxamento excessivo ao tom de voz cada vez menos preocupado com o que lhe rodeia, Naderi é um colosso. Nos dividimos entre ficar estatelados esperando qual será sua próxima linha sarcástica e não se aguentar de tanta graça que sua postura provoca.
Agora, se Beekeeper – Rede de Vingança não é uma espécie de tesouro escondido, nem algo cuja elaboração visual salte aos olhos, será que estamos diante de um projeto que será ressuscitado daqui a alguns anos? Não há como ter uma resposta nesse momento, mas eu chutaria que o filme não consegue ser lembrado. O que não se pode negar é a capacidade de Ayer de montar, a partir de menos de um fiapo, uma produção que só nos envergonha porque procura por isso, deliberadamente. Como uma montanha russa velha de parque do interior, a diversão é tão garantida quanto os enjoos. Com Ayer, qualquer uma das duas coisas pode ser esperada, e muitas vezes juntas.
Um grande momento
O encontro na ponte suspensa