- Gênero: Comédia romântica
- Direção: Joanna Lombardi
- Roteiro: Maria José Osorio
- Elenco: Gisela Ponce de León, Karina Jordán, Jely Reátegui, Norma Martinez, Salvador Del Solar, Jason Day, Andrés Salas, Ana María Orozco
- Duração: 100 minutos
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A Netflix criou essa tendência que praticamente inexistia antes dela, que é o de criar franquias de comédias românticas. Talvez isso tenha vindo da literatura, onde essa ideia de continuar histórias menos fabulares, onde inclusive vários direitos de livros foram comprados nessa intenção. A bola da vez é esse Como Superar um Coração em Pedaços, continuação de Como Superar um Fora, que para os padrões do streaming demorou a ser feito – 5 anos. Só descobri que se tratava de uma continuação após o play, e mesmo temeroso em perder algum fio de meada, deixo aqui a dica de que, obviamente assistir ao original antes deve ser bom, mas nada se perde ao cair de pára-quedas aqui. Além de encontrar mais um título acima da média para os padrões apresentados.
O filme é dirigido pela mesma Joanna Lombardi do primeiro, o que significa que o material está nas mãos de quem já o conhece. Aparentemente estamos diante de um triângulo de amigas, mas o protagonismo real está nas mãos de María Fe, uma aspirante a escritora – quer dizer, ela já publicou um livro, mas ainda não está necessariamente convencida de suas aptidões. O filme fala sobre uma fatia da sociedade que só cresce hoje em dia: o “influenciador” que lançou um “livro” a partir das suas experiências, descritas em blog. Ou seja, é uma nova modalidade de… profissional oriundo da mídia? Não importa muito o julgamento que se faça ao “ganha pão” da protagonista, porque estamos diante de um título que se importa com seus personagens, e essa intenção por si só já elevaria o material.
Como Superar um Coração em Pedaços é muito consciente de suas próprias qualidades, e brinca de maneira inteligente com o gênero, com um relevo existente de pessoas e relações cotidianas, e tem uma leveza muito bem urdida pelo roteiro escrito por Maria José Osorio. Além disso, existe uma surpresa em relação ao conceito que o título em português do filme está querendo aludir. Uma comédia romântica com esse enunciado, não poderíamos esperar outra coisa que não uma decepção amorosa em curso; ledo engano. O que se passa com María Fe é de outra ordem, e uma perda irreparável acaba acionando gatilhos para suas dúvidas profissionais e, aí sim, amorosas – quer dizer, não há muito espaço para uma construção romântica mais tradicional aqui. Os motivos se excedem, e o filme é muito sensível em cada tomo que se pretende comentar, seja na desilusão amorosa da protagonista ou na ausência que se forma a partir de determinado momento.
Não é exatamente inovador, ou com um roteiro que trafegue por escalas diferentes do que o próprio gênero já não tenha caminhado. Mas essa é justamente uma das suas ferramentas, já que Como Superar um Coração em Pedaços se vale de uma homenagem não assumida, serpenteando por códigos, expondo-os na tela, e reproduzindo o que é enfatizado. São ideias que não primam pela originalidade, mas que ao serem expostas de maneira frontal, transformam-se em graça assumida. Como quando os personagens declaram sua ojeriza ao gênero, e o filme começa a assumir as reclamações em cena aplicando tais situações na produção, é uma forma de retorcer as questões, criticar seu formato e reintroduzir tal olhar em cena de maneira fresca.
E acompanhar um gênero com interesse é também observar seus clichês, atentar para sua aplicação em cena mais uma vez, e entender qual a função de tal utilização, além de perceber o grau de charme ali depositado. Além de contar com uma inspirada Gisela Ponce de Léon protagonizando o título, o filme não sublinha o que acontece de mais óbvio em cena, que é a sua aproximação de dois personagens masculinos diferentes, e entender qual a função que cada um terá na história. É a atriz que emprega uma fina mistura entre acidez, ingenuidade e romantismo desacreditado, que eleva o emprego em cena e concede mais uma camada a Como Superar um Coração em Pedaços que ele não desestimula.
Se tem algo que o filme não consegue suplantar é uma característica meio do melodrama televisivo, que talvez aproxime Brasil e Argentina. Com uma duração acertada, o avanço de Como Superar um Coração em Pedaços revela que muita coisa ainda falta em seu desenvolvimento, e o filme começa a adiantar seus finais, se parecendo com o último capítulo de novela, onde a correria desenfreada atrapalha a dramaturgia. Em um filme, como aqui, isso se torna ainda mais esdrúxulo, porque gostaríamos de ficar a par das dramaturgias de maneira mais próxima. O desfecho romântico de María Fe, por exemplo, é restrito a uma cena rápida, de menos de um minuto. Isso reorganiza, mais uma vez, os critérios da comédia romântica tradicional, mas os personagens são tão bem construídos que nos faz falta que eles não se aproximem com mais tempo. É um revés da modernidade pretendida.
Um grande momento
María Fe conversa sobre as regras do gênero