- Gênero: Comédia
- Direção: Marcos Carnevale
- Roteiro: Sebastián Freund, Rodrigo Muñoz
- Elenco: Benjamin Vicuña, Jorge Zabaleta, Fernando Larraín, Rodrigo Muñoz, Laura Fernandez, Johanna Francella
- Duração: 99 minutos
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Bem antes da metade de Dois Pais para Lulú já estamos nos perguntando o que nos levou até tão desnecessária experiência, mais do que atentar a sua ausência de predicados. Que eles não foram alocados ao filme, essa é uma observação feita logo no início, quando percebemos que muita coisa está fora do lugar. Um exemplo são os ‘bastidores narrativos’ da produção, notadamente interessantes, mas que estão exclusivos em uma narração de abertura do filme. Não cabe perceber o que seria melhor de acompanhar, mas tenho uma percepção de que, se algo promissor foi colocado fora da produção, é porque já não havia muita ideia do que fazer com o que se tinha. E de fato, passamos toda a projeção acompanhando um quarteto de amigos com o qual não temos qualquer conexão; o filme não constrói isso, está no flashback narrado.
Não seria o caso de acompanhar uma duração maior, para encaixar todas as necessidades do roteiro em tela, mas esse erro inicial já depõe contra o filme; se não nos identificamos com os personagens e suas necessidades, o jogo já começa perdido. Isso também acontece porque Dois Pais para Lulú, sabe-se lá porque, resolve deixar não apenas esse ‘background’ de fora, como também muitos personagens que ajudariam na construção do carisma de cada um. O noivo do protagonista, a mãe de outro deles, além de detalhar os motivos pelo qual um outro não se relaciona com a filha: é porquê a menina é lésbica? Não pode ser, já que o melhor amigo dele é gay. São muitas pontas soltas e muitas ausências para deslanchar uma trama que já não é das melhores.
Esse grupo de amigos descobre que, o que está prestes a se casar (e ser o primeiro casamento gay do Chile, tema esse que nunca é explorado), tem uma filha na Argentina cuja mãe acaba de falecer. Decidem todos ir até lá para que Nicolás consiga a guarda da criança. Aí é aquela história de ‘road movie’ acidentado e cômico, com situações surreais envolvendo freiras fanáticas, religiosas arrogantes e homofóbicas, discos voadores, e um passeio por dois países latinos que não explora a paisagem de nenhum. Na verdade, a lembrança que fica mais indelével de Dois Pais para Lulú é o deserto onde os amigos ficam perdidos, e que nada acrescenta à narrativa, a não ser criar mais momentos bizarros a um roteiro que não precisava de tal para criar interesse.
Quando então lembramos que o diretor de Dois Pais para Lulú é o ‘pau para toda obra’ Marcos Carnevale, as coisas meio que se justificam, ainda que aqui ele claramente tenha ultrapassado seus próprios limites. Depois de criar uma franquia de remakes onde um homem alto é reduzido ao nanismo por computador (Coração de Leão), ele mesmo investir em uma releitura do sucesso francês Intocáveis, e ano passado ter investido em uma tempestade de proporções bíblicas em Granizo, que ele agora queira surfar em uma onda LGBTQIAP+, não é de se estranhar. Oportunista e sem qualquer ambição que não seja a popular, Carnevale é cada vez menos levado a sério como cineasta. Seu novo filme, acima de tudo, é uma produção mal acabada, esteticamente feia e sem qualquer graça.
Não há muito o que salvar mesmo em cena, e nenhuma de suas ideias se encaixam em qualquer outro lugar que não sejam ou no equívoco, ou na confusão narrativa. Lógico que Dois Pais para Lulú tem uma dupla de roteiristas (Sebastián Freund e Rodrigo Muñoz, o segundo sendo um dos protagonistas, que têm problemas maternos), e eles são ainda mais culpados por tudo que testemunhamos, e que não funciona quase nada. O elenco não têm muito o que fazer quando não há justificativa para ações e tudo parece um resumo infeliz, mas ainda assim Benjamin Vicuña e Jorge Zabaleta seguem tentando, em vão. Parecem os únicos interessados em salvar essa montanha do desastre, mas nenhum dos dois é capaz de consertar o que coletivamente só afunda a cada nova cena.
Se Dois Pais para Lulú se concentrasse em apenas uma demanda, já seria difícil de ser salvo, tendo em vista que Carnevale está especialmente desprovido de talento aqui. Mas com um roteiro que envolve tantos elementos e esquece de nos entregar o óbvio, que é justamente unir seus personagens e nos convencer do porquê aqueles homens estarem juntos e apartados da sociedade, a salvação estava no campo do impossível mesmo. Quando Nicolás chega na creche e vê a personagem-título, percebemos que tinha um caminho a seguir dentro da hecatombe, onde o afeto seria o alvo; parece um daqueles casos onde o tsunami foi visto se aproximando e ao invés de correr para tentar a salvação, o mergulhador apostou na morte certa como escolha.
Um grande momento
Nicolás e Raimundo conversam na frente da fogueira