- Gênero: Comédia romântica
- Direção: Vanessa Jopp
- Roteiro: Jane Ainscough
- Elenco: Naomi Krauss, Goran Bogdan, Adnan Maral, Bahar Balci, Artjom Gilz, Davor Tomic
- Duração: 105 minutos
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É uma prova de consciência de mercado que a Netflix tenha decidido lançar hoje, no Dia Internacional da Mulher, esse delicado Em uma Ilha Bem Distante, produção que mistura Turquia, Croácia, Alemanha (e um tanto de diálogos em inglês) para contar uma história de renascimento. E não apenas, já que todos os dias histórias assim são filmadas e contadas e repetidas, mas uma história dessas cheia de compreensão e afeto, bonita de se ver, com carisma borbulhante, e que não deixa de empoderar mulheres que nunca tiveram poder. Olhar para donas de casas e imaginar que delas também podem nascer sonhos adormecidos, desejos reprimidos, pensar em uma mãe de família com desejos sexuais, e que isso ainda precisa ser gritado, é sinal de que o tanto de mudanças conseguidas não foram tantas assim.
Sim, há mais de 30 anos, Shirley Valentine e Bagdad Café falaram isso, com propriedade a ponto de serem ouvidos, conquistaram prêmios e atenção, mas que tenha sido reproduzido outras vezes desde então, é sintomático que essa narrativa ainda provoque emoção e suscita novas revoluções. Em 1990 a palavra feminicídio ainda não tinha virado uma triste rotina em páginas policiais, o que talvez faça com que hoje algo como Em uma Ilha Bem Distante seja ainda mais libertador. Pensando que qualquer arte, do filme da Marvel aos indicados à Palma de Ouro, são sempre peças políticas, a voz de uma mulher que não se vê por inteira no espelho no início do filme é um respiro de força, além de uma diversão absolutamente desmedida, mostrando que essa união não pode ser considerada intocada.
A produção é toda feminina. Dirigida por Vanessa Jopp e escrita por Jane Ainscough, o filme conta essa história batida sim sobre uma mulher sufocada em um casamento, em uma casa, em uma família. Há lugar para todos, menos para ela, que não tem espaço, profissão ou escolha; tudo que vem de si é para os outros – sua imagem não se reflete no espelho e sua voz não é ouvida no microfone. É revelado depois da morte de sua mãe que ela herdou uma casa no cume de uma montanha na Croácia, em um litoral daqueles que só o cinema seria capaz de mostrar. É tudo reconhecível, todos os elementos já foram dispostos anteriormente, mas dessa reunião atual entram elementos de combinações igualmente felizes. A questão não é (nunca é) necessariamente a renovação dos temas, mas sua relevância, seu lugar de disposição em seu tempo.
Tudo é pautado pelos detalhes, desde o lugar onde uma mulher pode alcançar, até as mudanças que também elas fazem ao chegar no ambiente e decidir tudo a seu respeito. É uma discussão até relativamente recente e que reflete muita na nova geração representada pela filha da protagonista, que não apenas é de outra geração como também é fruto dessa liberdade que a mãe nunca conseguiu trazer pra si. Mesmo não tendo uma boa relação, ambas estão em momentos diferentes mas procurando a mesma liberdade, refazer sua representação social e reintegrar sua postura em um mundo arcaico que precisa respirar. A representação sintomática disso é a própria casa do alto da montanha, que é o antigo clamando pela chegada de algo que a recupere.
Em uma Ilha Bem Distante recupera esse clima de matinê dos anos 1990 para os dias de hoje, nesse cenário paradisíaco que é aproveitado em seu máximo possível. O resultado não é apenas uma rejuvenescida em uma proposta de filmes que já foi mais utilizada, mas que hoje precisa ser revitalizada porque as pautas onde se incluem o feminino se normalizaram na violência que sucede a ausência de lugar de fala. Que essa mulher, domesticada e invisibilizada, retome seu lugar de origem no mundo que está no limiar entre o paradisíaco e o selvagem, se essa mulher merece o direito de ser feliz sendo disputada por um sexteto de homens (que cena simbólica!), e o filme não apenas informe como demonstre isso, temos que celebrar sim.
A atriz Naomi Krauss consegue nos transmitir tudo que a personagem passa, desde o tomo inicial, onde Zeynep ainda é submissa à uma realidade caótica, até sua descoberta pela nova mulher que cabe dentro de si, ra culminar na figura poderosa que alavanca a própria existência, já metamorfoseada. Sua química com Goran Bogdan é um dos pontos altos de Em uma Ilha Bem Distante, e o personagem também é um acerto; um homem destruído por uma relação desgastada, e recuperado pela lembrança do cinema e sua relação com a obra-prima de Albert Lamorisse, O Balão Vermelho. São pequenezas dessas que se sobressaem ao que o filme tem de óbvio, para fazer seu pacote ser especial, apesar de requentado.
Um grande momento
Mãe e filha se reencontram
Excelente crítica
. Mas por ser um filme extremamente feminino só levou 3 estrelas em.uma classificação na web. Parabéns