Crítica | CinemaDestaque

Entre Nós – Uma Dose Extra de Amor

Ausência de malícia

(The Threesome , EUA, 2025)
Nota  
  • Gênero: Comédia romântica
  • Direção: Chad Hartigan
  • Roteiro: Ethan Ogilby
  • Elenco: Zoey Deutch, Jonah Hauer-King, Ruby Cruz, Jaboukie Young-White, Tommy Do, Robert Longstreet, Arden Myrin, Julia Sweeney
  • Duração: 110 minutos

Os primeiros momentos de Entre Nós – Uma Dose Extra de Amor enganam, porque sugerem uma experiência absolutamente diferente do que acaba se formatando. Em tempos onde sinopses e trailers contam tudo, abrir mão desses artifícios nos faz, vez por outra, encontrar um produto de tessitura completamente diferente do que está em jogo. Então, uma narrativa que aposta em um conceito de relação de bases menos exploradas pela ficção, acaba dando vez a uma comédia romântica mais tradicional, repleta dos mesmos jogos de erros que ocupam esse universo. O que então parecia uma aposta ousada para os padrões estadunidenses na hora de contar histórias, faz uma curva e encontra o espectador em meio algo mais tradicional e sossegado. 

Chad Hartigan surgiu premiado em Sundance, com Morris from America, e continua realizando os mesmos filmes indies estadunidenses que vemos invadir as salas de cinema todos os anos. Dessa vez, no entanto, Entre Nós soa acovardado no que tange uma espécie de novidade tácita que acompanham esses títulos de caráter mais naturalistas das comédias independentes. O título original sugere que o tal trisal seria uma espécie de desenvolvimento natural do roteiro, já que a química entre os atores e personagens é evidente desde que eles se encontram em cena. No entanto, a tal relação a três acaba se resumindo a uma bastante tradicional comédia de erros, com direito a tradicional cena do encontro entre os personagens em um único cenário, onde o protagonista precisa fingir/mentir em dois núcleos distintos. 

Dirigido e escrito por dois homens, Entre Nós aos poucos não consegue sustentar sua própria natureza, e começa a exibir sinais indefectíveis de machismo. Apesar de tentar bradar uma espécie de empoderamento a todo custo, o filme não esconde o que tenta fazer com seu protagonista, Connor. Seu sofrimento é mais explorado e sua dor é considerada mais aguda pelas imagens, mostrando duas mulheres em seus piores momentos, de desconforto a procedimentos invasivos, como agentes desse sofrimento. Estamo falando de personagens adultos em situações adultas que pedem soluções adultas, mas a Connor (muito bem interpretado pelo jovem Jonah Hauer-King, de Casa de Dinamite) é dedicado todo um momento de reflexão que a elas não é explicitado; mulheres agem e homens, frágeis, sofrem. 

Partindo do concreto da realização, é difícil (ou quase impossível) não imaginar que os olhos por trás de Entre Nós decidiram por uma condução muito diferente do que seria feito por uma mulher. E ainda que uma acusação tácita de machismo não seja exatamente propícia, o desenvolvimento da narrativa e da imagem não privilegia um lugar que atropele as convenções. O que se apresenta é um molde inverso, em que uma apresentação promissora acaba cedendo espaço para uma conversa mais simples, tanto para a exemplificação das relações quanto para o trabalho final. Seria esse lugar ainda mais adequado tendo em análise que o cineasta em questão apresenta tradicionalmente arranjos estético-narrativos que trepidam o esquema; não aqui. 

Ainda assim, o filme é como uma gravidez entre o cinema indie afetuoso de 15 anos atrás, e as comédias românticas doces do início dos anos 90; um casamento entre Juno e Nove Meses. Com as temáticas devidas, o filme soa como essa obra híbrida que talvez não encontre exatamente o seu público, porque soa estranha essa combinação. No entanto, somos convencidos a embarcar na jogada proposta pela sinceridade de todos os envolvidos, talvez até mesmo dessa antiquada guerra dos sexos amorosa. Não é exatamente o ambiente que se espera do filme, mas o roteiro e a direção acabam colocando opiniões masculinas e femininas em pólos antagônicos. Isso se dá também, e essencialmente, a um grupo de atores que promove sinceridade explícita. 

Infelizmente Ruby Cruz (de Bottoms) não é tão aproveitada pelo roteiro, porque a personagem é verdadeiramente muito boa, e a atriz idem. Mas Zoey Deutch (de Nouvelle Vague) e Jonah Hauer-King são igualmente atores excelentes e adaptados às possibilidades do roteiro. Dentro do que é apresentado pela produção, ambos desfilam muito carisma e química, que é aproveitado pelo filme por completo. São eles que contribuem para introduzir nosso interesse ininterrupto por Entre Nós, que não se dilui quando o filme se mostra menos hábil na construção de seu discurso. Aos poucos, o filme se mostra bem equilibrado entre o que funciona e o que não, o que não deixa de ser uma pena mediante o potencial que é deixado de lado por uma visão simplesmente do amor a três. 

Um grande momento
O flerte no sofá 

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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