(Huit Rue de l'Humanite, FRA, 2021)
“Pandemia nos deixe viver os sonhos
Antes de ficarmos trancados”
A estrofe central da canção chatinha que a vizinha grávida canta em Mais que Amigos: Vizinhos poderia facilmente ser substituída pela igualmente chata “Vida, devolva minhas fantasias, meus sonhos de viver a vida, devolva meu ar…”, hino pop do KLB. É uma questão de gosto, assim como também é apreciar ou não as comédias francesas realizadas por Dany Boon. E em parceria com a Netflix ele realizou um filme pandêmico inspirado nos amigos Sara e Rafael – citados nos créditos finais -, com a esposa e corroteirista Laurence Arné. A inspiração em fazer o filme seria na frase, escrita por Sara: “Para todos os que sofreram/Para a humanidade em solidariedade”
Mais que amigos: Vizinhos (ou no original 8 Rue de l’Humanité) se passa durante os três meses de lockdown ocorridos em 2020 na cidade de Paris e em outras capitais ao redor do mundo. Boon é um ilustrador científico casado com Arné, que vive uma advogada criminalista e ambos, junto com a filha Louna, vivem às turras tentando conciliar o home office com o excesso de zelo dele em relação ao isolamento social. Passando da família “histeriocondriaca”, a comédia de erros vai se sustentando nos outros personagens que vivem na vizinhança, no prédio de poucos apartamentos tipicamente parisiense.
No térreo está o zelador Diego (inspiração para Rafael), que espera a esposa, Paola, hospitalizada com covid, voltar pra casa; a divertida Lola (Liliane Rouvère), dona de um bistrô que fechou. No primeiro andar, um casal jovem formado pelas grávida já citada que descobriu dotes como cantora ao violão e o marido Personal Trainer; em cima deles, Boon e Arné. E ao lado, o insuportável belga – vivido por Francois Damiens – sua filha adolescente e o doce caçula Basile.
Essa dinâmica do confinamento é cansativa até mais da metade das duas horas de duração do filme, já que os clichês para nós, que estamos há dois anos vivendo numa era pandêmica, doam demasiado repetitivos e enfadonhos. Tem também um cientista maluco que quer descobrir a vacina por meios poucos ortodoxos (papel de Yvan Attal), que talvez seja o personagem que mais enfraqueça Mais que Amigos: Vizinhos já que muito carregado nas tintas, perseguindo os animais da vizinhança para usar como cobaias e até atestando falsamente o contágio por coronavírus em dois moradores para poder prosseguir com os testes.
Igualdade – fraternidade – inimizade
Personagens construídos em cima de novos estereótipos de tempos pandêmicos como o vizinho que toda hora compra coisas online para não ter que lidar com os filhos adolescentes, o Personal Trainer negacionista que, insatisfeito com o sucesso repentino da esposa nas redes sociais, passa a engordar no confinamento, ou mesmo Lola, que nunca aplaude os profissionais da saúde vão dando os tons interessantes, ainda que não seja muito para construir uma narrativa.
Oscilando demais no ritmo, Mais que Amigos: Vizinhos só passa a acertar mesmo no tom e dar mais humanidade e veracidade aos personagens perto do desfecho e do fim do lockdown. A vizinha médica que é denunciada se torna parte vital da trama, assim como os pássaros de Paola. E a singeleza da relação de Lola com as crianças, do amor pueril de Louna e Basile (menino e o cachorrinho) é o que torna o filme mais ou menos atrativo.
“Tenho medo! Não quero ir para o hospital! Não quero morrer de Covid!”
Afinal como não temer que um acidente doméstico tenha consequências piores? Como
não se relacionar com a perda de um ente querido? Se preocupar e perder o sono perante a incerteza do que virá?
Um grande momento
O primeiro PCR