- Gênero: Aventura
- Direção: Jonás Cuarón
- Roteiro: Sean Kennedy Moore, Joe Barnathan, Marcus Rinehart, Brendan Bellomo
- Elenco: Demián Bichir, Christian Slater, Evan Whitten, Ashley Ciarra, Nickolas Verdugo, Adriana Paz, Michael Kostroff
- Duração: 90 minutos
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Pro bem ou pro mal, podemos dizer que Chris Columbus é uma lenda. Seus créditos incluem os dois primeiros Esqueceram de Mim, Uma Babá Quase Perfeita, os dois primeiros Harry Potter, Lado a Lado, os roteiros dos dois Gremlins, Os Goonies, a produção de Um Herói de Brinquedo e, pasmem, de A Bruxa e O Farol – sim, os filmes do Robert Eggers. Com esse currículo, não há mais nada que ele precise provar ou angariar; é uma vida dedicada ao melhor do cinema infanto-juvenil nos anos 80 e 90, que adentrou o novo milênio ainda relevante e promovendo a diferença. Seu nome está nos créditos desse novo sucesso da Netflix Meu Amigo Lutcha, e o que aproxima esse esse título do que acabei de citar? Qualitativamente, nada.
Mas em defesa da produção modesta que o streaming lançou com alguma pompa (ainda que enquadrada), temos uma fórmula meio que consagrada na hora de colocar uma história na lata. Nada tem qualquer intenção maior que não o entretenimento, mas é uma produção que fala mais alto ao latino-americano, logo é um filme que também está falando sobre as lições que aprendemos em conhecer as nossas raízes. Para qualquer criança, na verdade, Meu Amigo Lutcha passa essa lição de dar valor ao que se é, reconhecer os méritos no lugar de origem, e compreender nossa origem para então poder ter orgulho e não temê-la. Tudo muito simples e bem explicadinho, mas que não incomoda muito tendo em vista que o filme fala mais alto à primeira infância, pré-adolescência mesmo.
Dirigido por Jonás Cuarón (o irmão de Alfonso), o jovem mexicano ainda não mostrou serviço chamativo em suas incursões cinematográficas solitárias, e agora ao menos tem um sucesso. Parece (e deve ser) um trabalho por encomenda, mas deve lhe dar algum crédito por vir a partir da visibilidade. O roteiro escrito a inacreditáveis oito mãos igualmente serve aos propósitos da Netflix em conseguir expandir seus domínios por outros mercados, através aqui de um personagem famoso por essas bandas há uns 30 anos atrás: o chupa-cabra. Tratado como uma alegoria fofinha, o filme não investiga o sanhaço que causou na eṕoca os ataques a animais que fizeram a fama da lenda, mas transforma o animal em um bichinho de estimação que precisa ser salvo dos olhos da ganância norte-americana.
Na tela, vemos um misto de tudo um pouco – é meio cachorro vira-lata, meio pombo, meio dragão, meio morcego, meio coala, meio bicho sujo do mato. Com um aspecto de boneco jogado no fundo de um estúdio de Jim Henson, o tal Chupa (que no Brasil virou Lutcha pela nossa incontornável e eterna síndrome de quinta série) é agradável aos olhos infantis, mas já não sei se as crianças criadas à base de GTA são domadas pelas inocência de algo como Meu Amigo Lutcha. O negócio é todo muito simples, com valores cruciais mas uma candura que não sei se ainda vende bem com a criançada de hoje. No meio de tanta crueza da vida real, talvez falte ao filme um momento onde o perigo pareça verdadeiramente iminente, e não apenas algo muito distante e descompromissado.
Além disso, com as tais oitos mãos mexendo no roteiro, Meu Amigo Lutcha incorre em falhas colossais de roteiro, que vão bem além de algo parecido com perdoável. O filme parece insistir em uma despretensão que faz mal ao projeto, tendo em vista que apresentou algumas situações que não quer dar continuidade, como a solidão de seu protagonista ou a senilidade do avô. Chega um momento onde a suspensão da descrença não precisa mais ser utilizada para que acreditemos ou não nas criaturas aladas do filme, mas na bacia de elementos que precisamos fingir que nunca foram abordadas e seguir adiante, fingindo que não notamos os elementos. Dada a baixa duração do filme e a forma como ele encerra sua narrativa rápido demais, tudo fica ainda mais incompreensível.
Como dito, Meu Amigo Lutcha, ao contrário de outras produções destinadas aos pequenos, só serve a eles mesmo, porque os adultos sentirão falta de tudo que o filme propõe e não cumpre. Mesmo as crianças mais ligadas não terão as respostas para muitas de suas indagações, simplesmente porque o filme não está muito afim de fornecer qualquer coisa além de entretenimento vazio e oco. Uma pena, porque não foi disso que Columbus construiu sua vitoriosa carreira.
Um grande momento
Avô e neto ‘lutcham’