Crítica | Cinema

A Era de Ouro

Disfarçando defeitos com cafonice

(Spinning Gold, EUA, 123)
Nota  
  • Gênero: Drama
  • Direção: Timothy Scott Bogart
  • Roteiro: Timothy Scott Bogart
  • Elenco: Jeremy Jordan, Michelle Monaghan, Lyndsy Fonseca, Jason Isaacs, Tayla Parx, Jason Derulo, Jay Pharoah, Casey Likes, Sam Harris, Alex Gaskarth, Michael Ian Black, Wiz Khalifa, Vincent Pastore, Sebastian Maniscalco, Ledisi, Chris Redd
  • Duração: 137 minutos

A indústria fonográfica sempre foi marcada pelos grandes selos e por aqueles que, de alguma forma, conseguiram quebrar a sua lógica. Em meados dos anos 1970, uma gravadora chamou a atenção pela incoerência de sua cartela, que ia da banda de rock performática KISS a uma das vozes mais marcantes da disco music, Donna Summer. A Casablanca Records se tornou um selo bem importante da disco, aliás, e ficou conhecida pelas apostas que fazia na diferença e no inusitado. Um dos nomes por trás da marca era Neil Bogart, um malandro muito criativo, com alguma sensibilidade musical e que adorava uma festa.

A Era de Ouro resgata a figura desse homem, falecido em 1982 quando ainda tinha 39 anos, desde sua infância, mas não consegue controlar nem a empolgação e muito menos a afetação. O fato de ser dirigido e escrito por um dos filhos do empresário, Timothy Scott Bogart, explica toda a fantasia e exagero do longa. Aqui não há apenas um fã querendo homenagar seu ídolo, há uma admiração infantil que vai muito além e atrapalha a composição do personagem principal em suas contradições.

Bogart, o pai, era um cara simpático e legal, e isso fica evidente nas entrevistas que estão nos créditos do filme, mas os pontos negativos de alguém que se afundou em dívidas e nas drogas – e todo mundo sabe o quanto isso transforma uma pessoa e suas relações – são minimizados. Não ajudam em nada as opções estéticas do diretor, querendo dar um ar de solenidade a evento banais, ou até escolhas pretensiosas na intenção de replicar um estilo que não existe. Embora esteja falando de alguém que sempre estivesse no limite do brega com seus roqueiros maquiados, músicas gemidas, naves espaciais no palco ou uma boy band fantasiada, A Era do Ouro não consegue se encontrar e é só cafona.

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Não há no filme um sentimento de algo novo e interessante, que contraria os princípios tanto da Casablanca quanto de Bogart. Pelo contrário, é como se tudo fosse velho ou mais do que se precisa. E a coisa se complica quando o longa parte para aqueles que deveriam ser os seus pontos mais familiares, digamos assim; para quando vemos o protagonista longe de suas criações e em interações cotidianas. A não ser os atores, nada em tela indica que aquele longa seja uma produção atual e não um telefilme qualquer dos anos 1990, ou quiça 80.

Por outro lado, ali estão as músicas e, deixando para lá o exagero visual e pensando no sentido de clipes setentistas, há algo para se divertir em A Era de Ouro. Canções como “Ain’t No Sunshine”, “Midnight Train to Georgia”, “Give Up the Funk”, “Bad Girls” e “Rock and Roll All Night” funcionam na voz da lista de convidados para viver os músicos da gravadora: Pink Sweat$, Ledisi, Wiz Khalifa, Tayla Parx e Sam Nelson Harris, respectivamente. Não que isso sustente as mais de duas horas de filme, mas pelo menos são alguns momentos de respiro.

Ao final, é possível compreender porque Justin Timberlake deixou o projeto. Ele viveria Bogart, função assumida pelo ator Jeremy Jordan, reconhecido por sua carreira em musicais da Broadway. Também salvo pelas músicas, Jordan é dedicado e até se sai bem, apesar do material estranho que tem nas mãos, que o digam o terrível diálogo no ônibus com Paul Stanley, a pretensiosa reconstituição da conversa sobre traição com a primeira esposa Beth, vivida por Michelle Monaghan; ou o surto de raiva com o pai, Al Bogatz, por um visivelmente desconfortável Jason Isaacs.

A Era do Ouro é um filme que tenta, mas não dá certo. Ficção chapa-branca cafona fica devendo no conflito e se perde numa pretensa criatividade. Uma pena, porque história tinha pra contar.

Um grande momento
Nada tanto assim

Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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