- Gênero: Terror
- Direção: David Blue Garcia
- Roteiro: Chris Thomas Devlin, Fede Alvarez, Rodo Sayagues
- Elenco: Sarah Yarkin, Elsie Fisher, Mark Burnham, Jacob Latimore, Moe Dunford, Olwen Fouéré
- Duração: 84 minutos
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Como qualquer instituição forte da indústria cultural, Hollywood constrói sua solidez justamente no fato de ser tão maleável. Desde a era dos filmes mudos, passando pelo surgimento dos primeiros talkies (ou filmes falados), pela Era de Ouro (entre os anos 30 e 50), atravessando a Nova Hollywood — que nos apresentou nomes como Scorsese, Coppola e De Palma (que não seriam possíveis sem figuras como Cassavetes, Peckinpah ou Mulligan) — até a chegada da era dos blockbusters, inaugurada em meados dos anos 70, o mantra nas colinas californianas sempre foi: qual é a próxima coisa!?
Mas já não é de hoje que se fala em crise e falta de criatividade no cinema norte americano, que se tornou famoso por sugar a inventividade e a fama de seus grandes nomes até a última gota. Recentemente isso se intensificou. Pra mim, indo além dos filmes da Marvel, um grande marco (quase uma confissão) da crise hollywoodiana foi a estreia do novo Pânico, que escancarou a fase atual do cinema comercial estadunidense: a era da paranoia. Filmes que se apoiam no metacomentário e na autoconsciência excessiva para sustentar sua existência. Mas autoconsciência excessiva, como sabemos, é paranoia.
Devo dizer, contraditoriamente, que fiquei feliz com o novo O Massacre da Serra Elétrica: O Retorno de Leatherface, estreia da Netflix dirigida por David Blue Garcia. O filme bebe apenas o suficiente do material original para se fazer reconhecível, mas não se prende paranoicamente a ele. Afinal de contas, é um filme de slasher. Sangue jorrando. Ninguém quer saber de autorreferência: vamos ao quebra-pau. E poucos materiais oferecem um nível de libertinagem na violência como a saga Massacre da Serra Elétrica.
De todos os bichões de filmes de terror slasher, Leatherface sempre foi meu preferido. O mais complexo em sua loucura e crueldade, profundas demais para qualquer psicólogo forense. Quem é que veste máscaras feitas de pele humana, maquiagem, e dança com uma serra elétrica ligada banhada em sangue? Sem falar no canibalismo. O bicho mete medo. E é assim, indo bem direto ao ponto, que o novo filme da franquia começa.
Um grupo de jovens (sempre eles) tem a brilhante ideia de comprar uma cidade fantasma e fundar uma comuna no meio do deserto texano, uma espécie de utopia millennial, livre dos horrores do mundo real. Mal sabiam, evidentemente, o que os esperava. A premissa do filme, à primeira vista completamente absurda, não me parece tão improvável. Além de saber tirar sarro do egoísmo gentrificador da minha geração, avessa ao passado na mesma medida em que é obcecada por ele, o filme não poupa na violência. É bruto de verdade.
Poucos gêneros cinematográficos revelam tanto de uma cultura como o horror. Conhece-se uma sociedade muito bem a partir de uma análise daquilo (ou daqueles) que ela tem medo. O time de roteiristas, dentre os quais está o uruguaio Fede Alvarez (A Morte do Demônio, O Homem nas Trevas), soube trabalhar bem a história de Leatherface em meio a uma América em transformação, e constrói o retrato de mais um massacre em um país que os conhece tão bem. Há alusões à guerra civil americana, à manutenção da cultura racista confederada, violência policial e atentados em escolas (terrivelmente usuais) que, em conjunto com o cenário de cidade de faroeste abandonada, ajudam a montar essa ideia de um país decadente e banhado em violência. Um país de onde os jovens querem fugir.
E para onde vai uma nação assim? Está fadada ao pior do que já foi, e apenas. Nada tão diferente do nosso próprio Brasil. Por outro lado, há piadas e comentários que soam forçados. E faz falta (na verdade, em todas as sequências de O Massacre da Serra Elétrica) a crueza com que o primeiro filme foi filmado. Algo que era assustador por si só. Aquilo metia um tipo diferente de medo, que vai além do choque ou do gore. Terror em sua forma mais pura.
Um grande momento
A sequência do ônibus.