O que leva uma mãe a deixar a filha para trás na Venezuela e atravessar por perigos para chegar em São Paulo?
O desespero. Ele é latente no semblante de Marta. Em cada gesto ou olhar acabrunhado, desconfiado e carregado de dor dela – que a câmera captara em planos médios – ele transparece. A mulher está dando leite, o que para um casal de aparentes jovens ingênuos, vem muito a calhar.
Escrito e dirigido por Gustavo Milan, Seiva Bruta é impecável tanto na técnica quanto na construção narrativa e nos acertos silenciosos do roteiro – que versa sobre abandono, patriarcado, opressão, machismo, miséria, ganância, medo e esperança. O bebê de nome Roraima é simbolicamente o elemento elíptico da história, aquele que toda a hora nos coloca mais dentro da trama sofrida de Marta e também de Alice, a mãe mas que não tem a capacidade de alimentar a filha.
Um grande ponto de virada se arma e se completa, ainda apontando para um extrato social e a paisagem marcante da Amazônia, onde as estradas enlameadas, as cidadezinhas brotadas no meio da floresta e a imensidão do rio completam as emoções dos personagens. As cenas foram rodadas em Manaus e arredores.
A capital amazonense, que hoje tanto sofre as consequências drásticas das más gestões estadual e municipal, que está todo o dia no noticiário com mais e mais mortes provocadas pela segunda cepa do corona virus e pela falta de oxigênio nas unidades de saúde, é cenário e também lugar de uma cena audiovisual pulsante – só lembrar do premiado O Barco e o Rio, de Bernardo Ale Abinader, também presente nessa edição da mostra.
[24ª Mostra de Cinema de Tiradentes]