Crítica | CinemaDestaque

Terrifier 3

Rasgando o próprio espaço

(Terrifier 3, EUA, 2024)
Nota  
  • Gênero: Terror
  • Direção: Damien Leone
  • Roteiro: Damien Leone
  • Elenco: David Howard Thornton, Lauren LaVera, Antonella Rose, Elliott Fullam, Samantha Scaffidi, Margaret Anne Florence, Bryce Johnson, Mason Mecartea, Alexa Blair Robertson
  • Duração: 122 minutos

A essa altura, o palhaço Art já criou sua iconicidade particular. Até alguns anos atrás, Terrifier era um exemplar do cinema trash recebido por mapeadores do gênero, que tinha chamado atenção por conta dessa aura imprevisível de seu protagonista, e de seu modus operandi na ação. Oito anos se passaram, desde então, e Terrifier 3 estreia com uma alcunha inesperada: o filme que deu uma surra nas bilheterias estadunidenses em Coringa: Delírio a Dois. Com um custo de 2 milhões de dólares de produção, já se encaminha para os 60, em arrecadação até agora. E o que importa, em particular, também começa a ser mitigado, com a evolução qualitativa da obra, saindo de um cenário quase amador para uma homenagem (ou seria galhofa?) a títulos oitentistas de muitas vertentes. 

O diretor Damien Leone, que agora entendemos pelo batismo do novo título onde seu nome vem à frente na apresentação do mesmo, ser um rapaz cujo ego parece monumental, conseguiu polir suas ideias. Não exatamente temos em Terrifier 3 um verniz para o bom gosto, até porque justamente esse é o propulsor da franquia; o caráter tosco do gênero é que amealhou os fãs adquiridos. O que é feito aqui tira seu diretor de um lugar pouco profissional na forma como lida com os aspectos narrativos de sua obra, que funcionavam anteriormente quase em esquema de esquetes independentes, onde somente a vontade de chocar parecia um propósito. 

Ainda assim, não estamos diante de uma revolução. Terrifier 3 agora conta com alguma dignidade estética, com cenários verdadeiramente bons e não arremedos e restos, e acima de tudo, reside um propósito no que vemos. Isso é necessário para a sustentação de uma ideia de saga, que dessa vez fica escancarada enquanto proposta. Se nos filmes anteriores não conseguimos nos aproximar do que era apresentado pelo amadorismo coletivo de produção, mas principalmente por falta de ritmo, ou um encadeamento dos eventos, aqui o projeto se desenvolve para além da vontade de causar estranhamento e provocar repugnância. Porque, enfim, as ideias têm estofo para conseguir unir personagens e ações, de uma maneira onde a credibilidade narrativa esteja presente. 

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Contudo, existe um aspecto presente nos três longas da cinessérie que continua afiado. O trabalho de David Howard Thornton, que sempre esteve acima do nível da produção, parece aqui encontrar um momento especial para realizar as estripulias de seu protagonista. Art, como já sabemos, é um palhaço assassino que faz as vezes de mímico; sua comunicação é toda não-verbal, onde Thornton aproveita o máximo do próprio rosto e de um trabalho elaborado corporal não apenas para se comunicar, mas exatamente especificar o que precisa realizar, em determinado momento. O resultado não é fácil de realizar, e exige comprometimento do ator e do espectador, pelo fascínio que é empregado na proposta. 

Nesse sentido, assim como acontece facilmente em outras franquias do horror, é o trabalho de Leone em criar Art, e Thornton em aprimorar e personificar tal relevo, que produz toda a superfície de Terrifier 3, assim como nos anteriores. No entanto, a autonomia para que agora ele esteja em contato com o futuro da marca é algo a destacar. Foram oito anos de construção de uma mitificação que é posta à prova, e acaba por estabelecer uma expectativa para o futuro, porque existe algo para onde se olhar, agora. O desfecho em particular encaminha a obra para um lugar onde ele não tinha estado até agora, e que raramente é atendido de maneira eficaz. Estamos diante da possibilidade real de um universo que pode ser expandido com fúria e eficácia, que parecia inexistente até o capítulo anterior. 

Agora, com a certeza de que uma parte 4 virá, nos resta perceber essa evolução narrativa, independente do melhor lugar ainda não ter sido alcançado. Mas esse tal de campo do bom gosto, ele estará mesmo a serviço de uma produção que, nesse exato momento, encontrou um espaço de comunicação raro para essa subdivisão de gênero? Terrifier 3 é um evento, para onde quer que olhemos. Falta a Leone compreender sua colocação de autor, um não muito brilhante, e tentar um passo além. Para quem busca um caso único de invasão nos cinemas de um cinema muito mau comportado, onde as vísceras voltam a ocupar espaço de destaque, e que essa incorreção forneça material de estudo sobre uma caretice que assola o cinema de todos os gêneros, essa pode não ser a melhor resposta, mas já é uma. 

Um grande momento
O encontro com Papai Noel no bar 

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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