Crítica | CinemaDestaque

The Alto Knights: Máfia e Poder

Quando pouco é o bastante

(The Alto Knights , EUA, 2025)
Nota  
  • Gênero: Drama, Policial
  • Direção: Barry Levinson
  • Roteiro: Nicholas Pileggi
  • Elenco: Robert DeNiro, Debra Messing, Kathrine Narducci, Cosmo Jarvis, Michael Rispoli, Robert Uricola, Frank Piccirillo, Brian Scolaro
  • Duração: 120 minutos

Até onde me lembro, O Irlandês teria sido o último filme (ao menos de maior repercussão) ao abordar o universo mafioso, tão caro a Francis Ford Coppola ou Martin Scorsese. Em 1992, Barry Levinson entregou um filme que gostaria muito de ampliar essa mitificação cinematográfica; Bugsy era o grande candidato ao Oscar do ano, teve o maior número de indicações, venceu o Globo de Ouro de melhor filme. Era o favorito… que perdeu praticamente tudo – figurino e direção de arte quando você é indicado a 10 é pouco, né? – para um sopro de originalidade da Academia, O Silêncio dos Inocentes. Mais de 30 anos depois, Levinson dirige The Alto Knights: Máfia e Poder, mais um retrato sobre esses homens, suas lealdades e traições, seus romances e conflitos, seu sangue acima de tudo. Como disse na frase anterior, mais um. 

Escrito por Nicholas Pileggi aos 90 anos (!!!!), também é dele os roteiros de Os Bons Companheiros e Cassino, ou seja, esse é um especialista. Mas a união desses poderes não torna Alto Knights: Máfia e Poder em algo além do que se vê. Não é que faltem necessariamente bons temas ou uma boa direção aqui; o que falta é necessidade mesmo. É delicioso mais uma vez retornar a um submundo que o mundo do cinema nos fez tão próximo, porque só mesmo a arte faria um espectador leigo ter contato próximo a cartéis de criminosos que dominaram os EUA durante a Lei Seca, espalhando seu poderio de maneira mais tradicional até uns 40 anos atrás, quando seus “negócios” passaram a diversificar-se tanto que os traficantes normais acabaram por tomar sua importância.

Sem as imensas complexidades que os personagens de O Irlandês apresentavam ou mesmo sem a capacidade técnica que um autor como Scorsese apresenta a cada nova obra, Levinson não tem muito o que construir em Alto Knights. Seria fácil, por exemplo, dizer que se existem sempre comédias, dramas, policiais, suspenses parecidos uns com  os outros, os filmes de máfia não precisam ter a responsabilidade de desaparecer, se tudo já foi feito. Mas tais filmes têm códigos próprios que parecem já terem sido gastos, se um autor não tem o cabedal de mestre ao seu lado. Levinson, um homem que ganhou um inexplicável Oscar pelo dramaticamente constrangedor Rain Man, nunca foi um exímio enfileirador de recursos, embora tenha sim uma carreira sólida. Seu novo filme não apresenta nada que já não tenhamos visto antes. 

Dito isso, alguns pontos precisam ser ressaltados, como a decisão de colocar Robert DeNiro para representar os dois protagonistas da narrativa. Não são gêmeos e sequer são aparentados; amigos de infância, Frank Costello e Vito Genovese formaram uma dupla de mafiosos sui generis, mas mesmo os temperamentos opostos de protagonistas bandidos já foram apresentados no cinema. Costello era mais reservado, comandava através dos bastidores sem grandes extravagâncias, enquanto Genovese era o típico esperado: violento, estourado e inconsequente. Alto Knights é basicamente a leitura sobre esses dois personagens, sua amizade do passado e seu distanciamento de um presente ocorrido na metade do século passado. Mas fica a dúvida no ar: porque DeNiro interpreta os dois personagens? Porque sim e acabou? Pois essa parece ser a resposta mais direta a ser dada. 

Quanto ao próprio DeNiro… bom, estamos falando de um ator imenso, cheio de recursos, que nem precisa ser desafiado para imprimir uma marca particular. Ainda que tenha passado por um período de entressafra (que já se esgotou faz algum tempo), seu talento permanece intacto e imune a ataques. Em Alto Knights, a empreitada era inédita, e não estamos falando de personagens que se conectem pelo sangue, mas por algo cósmico, que os fez siameses sem nem mesmo serem irmãos. Quando o corte é finalmente feito, a produção começa e não temos acesso ao que o ator poderia acrescentar na dualidade de uma relação prestes a partir. Esse deve ser o principal problema de um filme que criou o desafio para um ator, mas que não deu a ele a totalidade do material para intensificar o que poderia. Dentro do quadro apresentado, o ator corresponde com a amplitude possível, nos chegando a fazer compreender que ele é tão capaz de ser a si mesmo, quanto de ser Joe Pesci. Ao menos uma outra participação do elenco precisa ser comentada, que é o nosso reencontro com Debra Messing, que merecia menções no futuro pela concisão que consegue aqui. 

Sem colocar seu filme em risco, Levinson monta em The Alto Knights: Máfia e Poder uma parábola sobre a insignificância, talvez. Tendo em vista que tais produções estreladas por octogenários geralmente tendem a falar sobre vida, morte, finitude e possíveis recomeços, e que ele também já ultrapassou essa linha, podemos estar diante de uma tentativa de observar o quanto, em determinado momento, tudo pode ser ressignificado, e colocado em sob perspectivas menos agudas. É verdadeira a alegria de saber que ele tem três novos projetos para sair do forno, e que podemos então ver o melhor de suas capacidades. E que ele pôde, enfim, investigar uma linha do passado para perceber o presente como algo pouco glorificante; o futuro não é muito diferente, para bons ou maus, estrelas ou ilustres desconhecidos. 

Um grande momento
Costello na corte 

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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