- Gênero: Drama
- Direção: William Friedkin
- Roteiro: William Friedkin
- Elenco: Kiefer Sutherland, Jason Clarke, Lance Reddick, Monica Raymond, Jake Lacy, Lewis Pullman, Jay Duplass, Tom Riley, Elizabeth Anweis, Gabe Kessler
- Duração: 105 minutos
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Consigo contar pelo menos quatro adaptações para The Caine Mutiny Court-Martial anteriores a essa nova versão, que viria a ser o último filme das carreiras tanto de seu diretor William Friedkin quanto de um dos protagonistas, Lance Reddick. Recém estreado na Netflix e tendo estreado no Festival de Veneza do ano passado, o filme é adaptação para uma peça de teatro de Herman Wouk, cuja primeira montagem data de 1951. A primeira versão seria dirigida por Franklin J. Schaffner (Oscar por Patton), tendo rendido depois algumas outras, incluindo uma de 1988, dirigida simplesmente por Robert Altman. Aqui, o diretor de O Exorcista não tenta fugir da experiência que é filmar com a claustrofobia que exige uma narrativa passada exclusivamente durante um julgamento, entre as paredes da corte. Ou seja, uma peça de câmara com todas as características do teatro.
O que é concebido para a obra é sua tensão permanente, que cresce a cada testemunha chamada. Isso está no texto igualmente adaptado por Friedkin, mas é de sua contribuição como realizador que o filme materializa seu dinamismo. Não se trata de uma narrativa corrida, há um debruçamento no tempo construído ali, mas suas curvas não estão à disposição unicamente do elenco e do texto. Ainda que primordiais, é o trabalho de direção que transforma a experiência de The Caine Mutiny Court-Martial em algo superior. Sem saber que seria seu canto do cisne, o diretor nos entrega uma versão vibrante para um texto escrito há mais de 60 anos, cuja relevância é mostrada a cada embate sutil. É um trabalho de artesão que exista em cena um campo de especificidade entre o que vemos (e a direção explicita) e o que ouvimos, em ordens até complementares, mas que exista uma preocupação de criar fricção entre os sentidos.
Há uma sensação de claustrofobia The Caine Mutiny Court-Martial, ainda que o cenário seja amplificado pelo que está sendo dito, e que vai oprimindo os participantes do novelo, ainda que vários não tenham qualquer implicação criminal ao longo do percurso. Isso é sentido porque está em discussão uma implicação narrativa que tenta contrabalançar algumas molas mestras dentro dos círculos de poder estadunidenses como um todo. A começar pelas forças armadas, mais especificamente a Marinha norte-americana, que é colocada em cheque pela produção, e que pode responder pelos desvios de um militar de carreira. A proteção a ele só se estica até o momento onde o próprio oficial começa a cavar sua cova, sozinho, mesmo depois de toda a ajuda possível.
Friedkin acaba nos encapsulando em uma célula sem qualquer proteção prévia, e isso acontece de maneira natural, com a edição acumulando pontos por nos manter conectados a um campo narrativo muito arriscado. Isso advém de uma produção que quase chega a 2 horas, e nesse tempo o que acompanhamos especificamente é um julgamento militar a portas fechadas. Aos poucos, as falas vão se expondo e o espectador passa a entender o manuseio do jogo de cena, onde estarão na linha de fogo as tantas personalidades que iremos conhecer entre seus personagens. Está aí outra grande qualidade do seu texto, construir um grupo de tipos tão únicos em suas idiossincrasias; Friedkin aproveita isso na condução de cada sequência, onde ele constantemente explora o ritmo através da energia de cada um.
Como se trata desse drama de tribunal fechado, que Questão de Honra tentou emular no início dos 90 mas que tinha a liberdade de ação mais intacta, seu diretor entrega-se a essa brincadeira de moldar sua temperatura a cada nova entrada, em consonância do que cada personagem carrega. Com um elenco formidável, onde Kiefer Sutherland tem o brilho máximo, mas também conta com uma performance muito boa de Jason Clarke, de Lance Reddick e um momento especial de Gabe Kessler, The Caine Mutiny Court-Martial não chega para provar mais nada em relação a Friedkin. Ele já não precisava mais se pavonear para que sua assinatura fosse elaborada por quem quer que fosse, mas despedir-se do cinema de maneira tão delicada e forte ao mesmo tempo mostra o teor de toda sua carreira.
Um grande momento
O depoimento de Urban