- Gênero: Drama
- Direção: Gianni Di Gregorio
- Roteiro: Gianni Di Gregorio, Marco Pettenello
- Elenco: Ennio Fantastichini, Giorgio Colangeli, Gianni Di Gregorio, Daphne Scoccia, Roberto Herlitzka, Galatea Ranzi, Iris Peynado, Salih Saadin Khalid, Francesca Ventura
- Duração: 92 minutos
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A crise econômica não afetou apenas os EUA e o Brasil, e a recessão ainda não foi completamente detalhada em países da Europa como no cinema americano contemporâneo, que vê o seu cinema indie tratar do assunto com muita frequência. Ainda que na zona da comédia, Cidadãos do Mundo é uma comédia italiana que não foge do tema, e até se embrenha nele com muito interesse. Como passeia pelo lugar da comicidade, acaba parecendo que sua discussão não tenta divagar com justiça por ali, mas na verdade essa é uma temática que esta na ordem do dia do filme, que acaba minimizando seu principal problema – que na verdade é uma questão muito subjetiva e pessoal.
Ao assistir a um filme onde a moral da história seja alguma variação do manjado “dinheiro não traz felicidade”, com desfechos onde pessoas muito encrencadas monetariamente acabam abrindo mão de uma grana boa pra mostrar como o altruísmo é o melhor negócio, me pego pensando se quem organiza esses roteiros e produções são pessoas que já passaram por alguma necessidade real na vida. Porque sinto realmente que só pessoas bem nascidas, que nunca tiveram que contar moeda pra pagar uma conta, nunca tiveram seu nome ameaçado pelo SPC/SERASA, nunca deixaram de comprar algo que queriam muito por dificuldades financeiras, creem realmente que dinheiro é um bem que pode ser abdicado com “muito bom humor e alto astral, e ah… as coisas se resolvem”; não é bem assim não.
O diretor Gianni di Gregorio (de Almoço em Agosto) pode ter as melhores intenções ao focar sua lente para o lado da crise, mas acaba resvalando sua moral a uma tendência do cinema em diminuir a importância do dinheiro em detrimento do bem estar emocional, como se uma coisa não fosse motivadora da outra, intrinsecamente. Ao usar o humor para elucidar um descontentamento da terceira idade frente a uma falta de perspectiva trazida pelo tempo, o diretor faz muito bem em enlevar essa situação pela ótica da leveza, mas ao fazê-lo, resvala em uma contradição para com as inúmeras pessoas que de fato perdem muito ao não ter dinheiro, ou seja, parece um olhar da classe média mais estabelecida, com vontade de “fazer o bem”.
O filme tem uma estrutura que se assemelha às tradicionais que envolvem personagens da terceira idade recentes, que forjam uma situação-chave – aqui, a percepção da falta de recursos imediatos e futuros diante da recessão, e a possibilidade de encontrar um novo lugar/país onde suas economias garantam uma vida sem sobressaltos – ou seja, nada que o cinema britânico não faça há três décadas e o americano tenha passado a investir nos últimos tempos. Aqui, a parcela italiana garante uma certa placidez diante de cada novo bloco de ação, que contemple mais a atmosfera, seus personagens e a própria essência da narrativa, que corra em círculos com sua carga europeia muito bem vinda.
Não se trata de uma produção refém de uma Itália idílica ou romantizada, no entanto. Embora explore um conceito espacial em sua base (afinal, de alguma forma é uma produção sobre busca territorial), Cidadãos do Mundo tem apreço mais pelos seres que pelos cenários, uma contradição interessante ao que deveria ser seu mote. Professor, Giorgetto e Attilio são mais do que figuras centrais, eles absorvem essa condição que poderia surgir em torno dos lugares por onde passam, do próprio espaço físico que ocupam, porque suas personalidades tão ricas e complementares acabam por preencher o campo de interesse do espectador, sem esquecer a tônica de grande parte da produção europeia hoje, a imigração.
Daqueles programas agradáveis de se assistir, que não mudará a vida de ninguém porém trará aquela paz necessária por uma hora e meia, com direito a inteligentes diálogos do roteirista/diretor/protagonista (premiado com o David di Donatello pelo seu material escrito), Cidadãos do Mundo é um daqueles longas que agradam em cheio o público tradicional do cinema de arte no Brasil, sem incomodar com questões intrincadas, sendo bem humorado com charme e certa inteligência, um trio de protagonistas carregados de carisma e talento, e um sentimento de que o dinheiro não importa muito quando se tem grandes amigos – ou quando se tem muito dinheiro. Já entre nós, pobres mortais…
Um grande momento
O primeiro encontro do trio