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O Último Vagão

Quando o trilho acaba

(El Último Vagón, MEX, 2023)
Nota  
  • Gênero: Drama
  • Direção: Ernesto Contreras
  • Roteiro: Javier Peñalosa
  • Elenco: Adriana Barraza, Guillermo Villegas, Jero Medina, Fátima Molina, Blanca Guerra, Kaarlo Isaac, Ikal Paredes, Diego Montessoro, Frida Sofía Cruz
  • Duração: 90 minutos

Ikal, Valéria, Tuerto e Chico são quatro crianças mexicanas que moram em empobrecida zona rural do país, uma comunidade explorada pela construção de uma linha férrea que anuncia progresso, mas que a própria condição do título (e do significado do mesmo) coloca em perspectiva. O Último Vagão, produção do México que acaba de chegar à Netflix e merece ser descoberta, é um filme que se desenha de diversas formas, até se encaixar em lugar distinto. Podia ser um desses ‘coming of age’ infanto-juvenis, poderia ser um daqueles ‘o mundo visto pelos olhos de uma criança’, poderia ser um paternalista drama familiar e social… no fundo, tem um pouco disso tudo, o que acaba fazendo com que ele não seja nenhuma dessas coisas em particular. 

O título em inglês (‘quando o trilho acaba’) é daqueles raros momentos onde percebe-se que a poesia subliminar de uma obra acabou sendo capturada por todos que com ela interagiram. Sem apelar para uma sensibilidade rasgada, o que o filme costura são diferentes pontos de vista para a mesma desgraçada situação do ensino através dos tempos, da exploração da classe trabalhadora, da abnegação de quem luta pelos que não conseguem lutar sozinhos. Nenhuma dessas questões é usada de maneira proselitista ou com intenções outras que não mover a narrativa, sem provocar uma onda de denúncia vazia, que só estabeleceria uma questão extra-fílmica forçada. O Último Vagão é hábil em contar essa história tão múltipla de observação, e isso é o que lhe transforma para além de um folhetim ralo.

O Último Vagão
Alejandro López Pineda/Netflix

Poderíamos estar diante de uma atração rasa, uma ‘sessão da tarde’ supérflua, mas o diretor Ernesto Contreras sabe muito bem o que quer, e o que não quer em seu filme. A emoção, quando acontece, ela é natural pelo envolvimento do espectador em uma realidade nada bucólica em torno de um ambiente que poderia vender espetáculo imagético em larga escala; não espere uma catarse irrefreável como em Milagre na Cela 7, por exemplo. O que vemos, no interior profundo do que é captado, é vazando pelas entrelinhas a dureza daquela geografia, a inocência em se observar aquela aridez como algo possível, mas sem nunca deixar claro o que escapa daquele espaço cênico. É a areia constante, no corpo, nos rostos, em todos os lugares, que não deixa O Último Vagão ser dominado por um viés de sonho, porque a realidade é muito presente, sem subterfúgios. 

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Essas quatro crianças, que tem em seu centro nervoso Ikal e sua família errante, irrompem da imagem sempre tentando dissuadir a narrativa de sua vocação para a derrota. Elas são a constatação de que o futuro evidentemente será melhor, mais esperançoso e vibrante, que além de tudo eleva a educação a um caminho evidente rumo a socialização e a realização, em todos os sentidos. Comedido na forma como filma essa ‘mensagem’, O Último Vagão não incorre em discursos políticos para que possamos mergulhar na saída possível, e no futuro concreto; está em cena também o resultado dos esforços, e não apenas o desejo por eles. É uma maneira clichê de corroborar a própria mensagem, mas sem deturpar o roteiro com ranhuras edificantes. 

O Último Vagão
Alejandro López Pineda/Netflix

Paralelo ao ‘lúdico pé no chão’ que Contreras abarca, O Último Vagão não esquece os adultos, posicionados como os pais de Ikal, a professora Georgina e o jovem Hugo (esse, literalmente aparte). Esses elementos mais velhos são nosso elo de ligação com uma distância para com a poesia dos 10 anos, quando nossos problemas eram o primeiro amor, a feitura de novos amigos e um amadurecimento à vista. São personagens que estão lidando com outro tempo, narrativo, etário ou ambos, e se estabacam com uma realidade sem filtros, submersos em desemprego, desamparo e desânimo social. É do equilíbrio entre essas duas vertentes que as qualidades do filme se sobressaem tão facilmente, da maneira mais humana possível dentro de um contexto cinematográfico. 

São desses pontos que nascem toda a ternura de O Último Vagão, que não deixa o filme se mostrar fantasioso apesar de tudo. O refúgio para o bem querer na estrutura não esconde a ideia de tragédia em se viver insalubre, de um nomadismo que não foi buscado pelos tipos, da quantidade de sonhos que os personagens entendem que não serão realizados. E está tudo bem, porque também é difundido aqui que temos que ir ao alcance do que nos faz mudar para melhor, sem que para isso mudemos por completo. Quando a emoção enfim chega, ela é compreensiva de que o melhor sempre pode aparecer, de maneira genuína.

Um grande momento

A salamandra

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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4 Comentários
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Profflex
Profflex
10/07/2023 21:31

São desses pontos que NASCE toda a ternura… É toda a ternura que nasce, e não os pontos. Se corrigir o erro de concordância a análise ficará ótima.

Luninhaaww
Luninhaaww
31/05/2023 17:56

gente eu to tentando achar o nome real do chico alguem me ajudaaaa

Cristina Garbelini
Cristina Garbelini
28/05/2023 10:23

Esse filme é lindooooo, como professora me identifiquei bastante..chorei até…

MARCOS ELENILDO FERREIRA
MARCOS ELENILDO FERREIRA
27/05/2023 17:33

SHARON STONE??! AGORA ESTÁ NO ASILO

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