- Gênero: Comédia
- Direção: Judd Apatow
- Roteiro: Judd Apatow, Pam Brady
- Elenco: Karen Gillan, David Duchovny, Leslie Mann, Pedro Pascal, Fred Armisen, Iris Apatow, Keegan-Michael Key, Kate Mackinnon, Maria Bakalova, Guz Khan, Harry Trevaldwyn, Samson Kayo, Vir Das, Rob Delaney, Danielle Vitalis, Nick Kocher, Chris Witaske, John Lithgow, John Cena, James McAvoy, Beck
- Duração: 126 minutos
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O diretor Judd Apatow até hoje pertenceu à comédia. Às vezes ele pende para uma espécie de melodrama em teoria, e isso muitas agrega charme a produção, acima de seus elementos particulares. O que ainda não tínhamos visto era o cineasta de Ligeiramente Grávidos se perder na comédia rasgada, na paródia desavergonhada. A estreia de A Bolha na Netflix corrige essa falta em sua filmografia, ao mesmo tempo em que exibe sua falta de propósito com material tão específico. Sem ter nada a provar e com uma carreira vitoriosa em todos os sentidos, Apatow comete aqui o grande escorregão de sua filmografia, praticamente sem perdão e absolutamente descaracterizada do resto de seus créditos.
Os dois filmes anteriores do diretor, tanto Descompensada quanto A Arte de ser Adulto, foram produções menores de sucesso incontestável, que renderam elogios para ele e para seu elenco, incluindo indicações a prêmios. Ele vai de um pólo a outro no novo filme, claramente um filme mais ambicioso esteticamente, que enche a tela com efeitos especiais até chamativos, e também seu making of – afinal, trata-se de “um filme dentro de um filme”. Pois a franquia de ação estapafúrdia Feras do Abismo pode até parecer uma produção que, de tão cretina, seja hilária, porém A Bolha, o filme que estamos de verdade assistindo, carece do principal de uma comédia: fazer rir. No lugar da graça, resta a irritação profunda.
O que adiantam os valores de produção até evidentes se a graça raramente acontece, e quando realmente provoca um mínimo sintoma de envolvimento, o filme parece querer se livrar tão rapidamente desse momento? Não é culpa de nada em particular, mas do todo no geral, até por não aparentar qualquer interesse de ninguém em produzir reações exaltadas do público. Uns espasmos esporádicos, como quando Keegan-Michael Key sai de cena virando cambalhota, não são suficientes para compreender humor. Uma produção antiga, um aproveitamento de esquetes do Saturday Night Live, sem qualquer resquício da sagacidade e da inteligência apresentadas no programa, apenas o modelo de apresentação aqui substituídos por uma ausência tão absurda de humor, que nos resta rir de nós mesmos, por estarmos nos colocando em situação de flagelo.
No lugar do que deveria aparecer, um constrangimento ininterrupto que segue as tentativas vãs de provocar um mínimo sorriso, e em outras tentativas de construir uma narrativa que não seja profundamente clichê, mesmo dentro do caos sem fim. Daqueles casos onde não conseguimos encarar a tela por muito tempo, pela extrema dificuldade em apresentar qualquer coisa que não seja um profundo embaraço. De duração extensa, A Bolha prova que o bom humor não precisa de ostentação, mas sim de um bom texto, um timing imbatível e um coletivo interessado em sair da zona de conforto. Nada disso parece existir aqui, ainda que Apatow e seu elenco já tenham provado suas capacidades em ocasiões anteriores – aqui, a impressão é um misto de estranhamento, entre o horror e a inércia.
Ainda que na reta final as coisas se tornem tão infames que o autor consiga nossa atenção, A Bolha, mesmo nessas passagens derradeiras, nunca se transforma em algo minimamente decente. Um arremedo de filme que pretendia ser muito referencial e engraçado em 1988 mas que se transformou em uma produção equivocada, com piadas grosseiras como as da última cerimônia do Oscar que provocam mais aborrecimento do que graça, não é muito compreensível que sequer exista. Temos a impressão de que Apatow pensou nesse filme obviamente durante a pandemia, mas provavelmente durante uma dor de barriga tremenda, sem perceber a diferença entre o que estava indo pro papel e o que descia pelo vaso sanitário depois da descarga.
Ao elenco, resta também para muitos a sensação de castigo pelo mal que provocaram a alguém em particular, e o castigo ser pago coletivamente. David Duchovny provavelmente foi uma pedra no sapato de Gillian Anderson por anos, Pedro Pascal é castigado pelo seu bigode, e Maria Bakalova (indicada ao Oscar por Borat Fita de Cinema Seguinte)… ok, não é possível que todos aqui merecem essa provação. Mas fica a surpresa de ver astros do porte de John Lithgow e James McAvoy perdidos em participar de algo tão despropositado. Nem mesmo Apatow deveria ter se colocado nesse lugar tão absurdo, mas já que o fez, nos resta ignorar o crime cometido ou torcer pelo Framboesa de Ouro ano que vem? Escolham seu lado.
Um grande momento
Castigo para a esposa do diretor / As duas mortes de Dieter