A afirmação mais rasa que poderia ser feita a F1 é de que sua narrativa foi concebida no decalque de Top Gun: Maverick, e isso seria errado porque não foi Joseph Kosinski o desenvolvedor inicial desse plot ‘mestre e pupilo’, para filmes de aventura. Os anos 80 foram infestados dessa base de roteiro, desde Karatê Kid, mas isso também não foi iniciado ali. Essa é uma trajetória remetente à literatura, que já apresentou anteriormente esse ponto de partida. O fato dos dois filmes em questão serem dirigidos pela mesma pessoa, prova mais um olhar preguiçoso em torno dessa ideia, cuja análise não pode fugir do lugar comum. Partindo dessa ideia que o cinema já gastou, resta pouco a ser apreciado e que não esteja ligado ao conceito de entretenimento inconsequente e sem maiores inovações.
Após Tom Cruise, Kosinski resolveu pegar o outro mega astro das últimas décadas e que, por muitas vezes, competiu com Cruise, Brad Pitt. Não faz diferença qual o ator aqui, porque o filme não poderia ser mais mecânico, nada tem muita personalidade nesse roteiro, que parece um apanhado de referências tratadas em inteligência artificial. Seus personagens são arquétipos trabalhando em cima de uma base que o Cinema não cansa de explorar, e que mais uma vez funciona, no sentido do entretenimento mais puro e sem maiores intenções que não a de entreter a plateia por duas horas e meia. Findado o tempo de projeção, a memória do espectador não está fixada em nenhum de seus atores, ainda que estejamos diante de Pitt e Javier Bardem, por exemplo.
O show, se é que há um, é inteiro das invenções de Kosinski. Por mais que exista alguma tentativa de olhar para as marcas do tempo de seu protagonista, isso não é uma discussão que nem o roteiro ou a imagem de Claudio Miranda quer se ater. F1 é um parque de diversões comandado por seu diretor, que se considera, a essa altura, com alguma autoralidade em cima do que faz; a prova é sua assinatura no roteiro. Talvez pela segurança que tenha adquirido em sua experiência anterior, o que temos aqui é um palco montado para que as experimentações de direção sejam colocadas à prova. Isso significa que as últimas tecnologias adquiridas pelo próprio esporte-título estejam espelhadas aqui, um longa de ficção.
Se o filme tende a impressionar regularmente um espectador que cresceu torcendo por Ayrton Senna nas manhãs de domingo, ao espectador comum esse impacto tende a ser ainda maior. Porque, literalmente, F1 acopla seu material rente aos baixíssimos carros e suas rodas que regulam a altura dos olhos dos pilotos. O resultado empolga de verdade, e existe a vontade de que o filme abandone sua narrativa quase obrigatória, para se dedicar exclusivamente à ação, que são os momentos onde o filme sai da linha esperada, para tentar um voo exótico. Os esforços de Miranda e a confiança de Kosinski produzem um resultado que bate quente na tela, mas quando chega nas relações humanas, tudo o que é alcançado pelas imagens, não corresponde em seu outro tomo.
Existe, dentro da produção, uma vontade de agradar a um grupo que parece meio vago dentro do público de cinema, hoje. Como se fosse o roteiro de F1 tivesse sido uma encomenda pedida ao chat GPT, o que se desfila enquanto construção de temas e personagens, é uma quantidade admirável de clichês que mostram como Hollywood não se importa mais com qualquer resultado. Desde diálogos (“se andar naquele carro for a última coisa que eu faça na vida, ainda assim eu estarei lá”) até criação de imagens, como mais de uma vez onde Pitt vem ao longe como um lobo solitário, tudo é bastante aleatório e repetitivo, como se estivéssemos a bordo de uma paródia igualmente dos anos 80.
Paralelo a esse texto e essas ideias gráficas também antiquadas, temos a gana de realizar um filme de ação dos mais empolgantes. Nessa hora, percebemos que Kosinski e todos que o cercam tentam representar da melhor maneira possível não apenas a fórmula 1, como o espírito de um gênero. Isso aliado às tentativas do personagem de Pitt controlar o incontrolável o tempo todo, no limite do insuportável e do crível, fazem de F1 uma experiência gangorra – a todo tempo, estamos com um olho no lado bom e ao mesmo tempo no lado ruim. O melhor é compreender o mais rápido possível que estamos diante de um passatempo inconsequente, que não tenta te convencer de alguma profundidade. Não tem, e tá tudo bem.
Um grande momento
O acidente (vocês não achavam que um filme de fórmula 1 não teria um, né?)


