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Árvores da Paz

Entre quatro paredes

(Trees of Peace, EUA, 2021)
Nota  
  • Gênero: Drama
  • Direção: Alanna Brown
  • Roteiro: Alanna Brown
  • Elenco: Eliane Umuhire, Bola Koleosho, Charmaine Bingwa, Ella Cannon, Tongayi Chirisa, Evan Alex
  • Duração: 97 minutos

Após a surpresa positiva que foi encontrar ‘Silverton’ como um dos destaques da Netflix em abril, é chegada um novo filme sul-africano à plataforma tão impressionante quanto. ‘Árvores da Paz’ já é um merecido sucesso inspirado em eventos acontecidos durante um genocídio real, em Ruanda em 1994. A guerra civil entre os povos Hutu e Tutsi, que gerou mais de 1 milhão de mortos, é o cenário para a história mostrada aqui, que além do que é absolutamente chocante nos fatos, o filme é uma realização invejável pelo que representa enquanto acabamento narrativo e contribuição estética a uma premissa de desenvolvimento complexo. Por tudo o que o filme poderia facilmente ter sucumbido em ritmo, o resultado aqui alcançado deveria funcionar como aula de escaleta de roteiro. 

Escrito e dirigido por Alanna Brown, o filme ganhou todos os festivais em que concorreu, e isso não é um atestado apenas de sua carga dramática elevada. Apesar de ser sua estreia nas duas funções, Brown já passeia pelo cinema como atriz há algum tempo, mas seu encontro aqui é de profunda inspiração. A partir do momento em que compreendemos que todo o roteiro será desenvolvido entre literalmente quatro paredes, em enclausuramento, atire a primeira pedra quem não se arrepiou com as possibilidades de tudo desandar, ou tornar-se profundamente enfadonho. Ao contrário disso, o filme se desenvolve com muita expressão artística e um conhecimento de edição que banca essa premissa, mesmo com o máximo de contras em sua ideia inicial. Essa impressão negativa (se é que há alguma) é desfeita com poucos momentos da produção.

Árvores da Paz
Netflix

Gabriel Fleming (colaborador habitual de um burocrata como Peter Berg) e Kiran Pallegadda os responsáveis por uma montagem tão desconcertante por nos conectar facilmente a uma história inteiramente passada dentro de um cubículo/cela. Suas quatro personagens principais travarão conflitos inescapáveis que se transformarão em um jogo de nervos em camadas, cada qual com suas verdades e certezas. Trata-se de um exemplar preciso de como uma produção é refém do que é construído por um profissional competente em sua edição. Pronto para não se desenvolver, ‘Árvores da Paz’ deve ser o filme mais ágil a ser desenvolvido em espaço tão exíguo, explorando essa exata precisão técnica; qualquer outro título não conseguiria sequer a atenção do espectador. 

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Essa categoria técnica impressa na produção não se encerra na montagem, porque a fotografia de Michael Rizzi também desempenha caráter definidor em seus intentos, redefinir um espaço muito reduzido a um quinto personagem em cena. O porão para estoque de comida onde as protagonistas vivem durante três meses em fuga do massacre ele tinha que refletir esse encarceramento e ao mesmo tempo em que isso serviria para cercear as personagens, não poderia restringir o interesse do espectador. Ou seja, outra dinâmica complexa que o filme realiza com destreza, exibindo uma espécie de portfólio de seus profissionais, mas nunca parecendo desintegrado à narrativa. Para que cada uma dessas características sejam tão bem acabadas, acima delas vêm uma moldura que permite e incentiva esse apuro. 

Árvores da Paz
Netflix

Em um filme que anseia pela compra de sua narrativa pelo público de maneira emocional, era óbvio que esse quarteto deveria ter camadas de entendimento. A princípio arredio, posteriormente descambando para o conflito em suas muitas configurações, para enfim desaguar em encontro de sensibilidades e sororidade, as quatro atrizes estão em perfeita sintonia e execução. Eliane Umuhire, Bola Koleosho, Charmaine Bingwa e Ella Cannon brilham com humildade, entendendo que o espaço de todas é o que também faz cada uma se destacar individualmente. Vem delas não somente a emoção que encontra uma variação muito interessante de ser trabalhada, como muitas possibilidades de demonstrar suas forças interiores, onde cada uma corresponde em igual intensidade. 

‘Árvores da Paz’ é um daqueles casos onde a crítica mais acadêmica não encontrará muitos elementos de onde extrair reflexão, por ter uma proposta muito direta, quase podendo ser chamado de ‘cinema de gênero’, tamanha é a sua entrega pelo melodrama em determinados momentos. Mas quando esse tipo de motivação é acessado com tanta veemência, com tanto desvelo, o espaço para o cinema clássico-narrativo se mostra o caminho adequado para contar essa história. Sem qualquer vergonha, Brown assina uma história de acesso popular, e o realiza com uma urgência e uma assertividade raras em diretores em sua posição de estreante. 

Um grande momento
“A multa de hoje é a bola”

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Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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