Crítica | Outras metragens

Whose Woods Are These

No fio da memória

(Whose Woods Are These, EUA, 2024)
Nota  
  • Gênero: Experimental
  • Direção: Kate Nartker
  • Roteiro: Kate Nartker
  • Duração: 6 minutos

Há filmes que parecem nascer na forma etérea de um pensamento. Aqui, um lugar entre a lembrança e o sonho se materializa em fibra e trama. Em Whose Woods Are These, Kate Nartker transforma o tear em câmera e a linha em elemento de composição de imagem. Não há a familiaridade dos traços a mão, da modelagem em massinha ou das criações em computação. Há uma paciência para lá de artesanal, onde os fios se entrelaçam para construir cada fragmento de um bosque que se dissolve e reaparece, como se fosse a lembrança de uma paisagem.

O curta não conta uma história no sentido clássico. Ele se move como um pensamento fragmentado, que alterna luz e sombra, perda e presença. Cada tecido é ao mesmo tempo superfície e vestígio. A textura, ao mesmo tempo terrena e onírica, remete àquilo que existiu, mesmo que por um instante. A escolha de animar quadro a quadro sobre mais de 150 metros de tecido é um gesto que dá corpo ao tempo, costurando-o literalmente, conferindo ao curta uma densidade, imagética e sensorial.

Visualmente, há uma força hipnótica. A irregularidade do tecido cria vibrações sutis, como se o bosque tremesse sob o vento ou sob a memória de quem o revisita. Não existe transparência total entre figura e fundo. Tudo se mistura, se confunde, se infiltra e se apaga. O som acompanha com a mesma organicidade, funcionando como um eco distante que atravessa a matéria visual. A incerteza daquilo que se acompanha é o que torna a experiência viva.

Whose Woods Are These traz o pensamento para a tela e, entre memória e sonho, torna o imaginário é tecido. Como todo tecido, ele é frágil, falho e poroso, mas capaz de guardar calor. Quem assiste ao filme fica com a sensação de ter caminhado por um bosque que existe mais no tato do que na vista, e, por isso, a sua beleza permanece.

Um grande momento
Sentada sozinha

Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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