- Gênero: Ação
- Direção: Anthony Hayes
- Roteiro: Anthony Hayes, Polly Smyth
- Elenco: Zac Efron, Anthony Hayes, Susie Porter
- Duração: 97 minutos
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Me pego pensando se lembrar de ‘A Longa Caminhada’ enquanto assisto ‘Deserto do Ouro’ era de fato uma referência possível do diretor Anthony Hayes, respeitando sua distância ao clássico incontestável de Nicolas Roeg, ou se minha cabeça me pregou peças por conta do país em comum. A Austrália, pátria de ambos, já foi cenário de inúmeras produções ao longo dos anos, mas o que essa estreia do Telecine se assemelha ao título de 1971 é justamente por seu conceito que se debruça pela aridez, escolhas de ambos os casos. A premissa necessariamente não os une, mas a escolha pela solidão estética, pelos planos que apontam um outro registro de solidão que o calor do deserto representa, estariam nesses lugares uma certa similaridade, que faz com que o psicológico conecte dois tempos tão distantes de realização e proposta.
Hayes, no entanto, não é Roeg. O ator dirige seu primeiro longa em 14 anos e, pouco experiente, tem mais interesse em contar sua história, mesmo tendo consciência de que sua ambiência é crucial para delinear essa produção. Hayes, que também está no elenco de seu filme (em desempenho muito bom, diga-se), tinha uma premissa nada original nas mãos, mas instigante o suficiente para motivar a realização de um projeto que renderia ainda mais se um desenho de realização fosse mais complexo, como pedia o projeto. O que vemos é uma dedicação elevada ao trabalho do protagonista Zac Efron e nas camadas que ele poderia entregar, no que seu desempenho como ator tinha para angariar ao projeto, e não o contrário como visto aqui, em grande parte do tempo.
O comum é uma produção dispor de um artista para compor o material pensado, e fazer jus à entrega do ator, recheando o filme com texturas e predisposições fílmicas. As tentativas de elevar a mise-en-scene não se revelam condizentes à competência de Efron ou ao que de muito excitante teria em possibilidades estéticas, até bastante óbvias de imaginar ao se defrontar com suas possibilidades. O roteiro – de autoria do mesmo Hayes, e Polly Smyth – tem uma simplicidade que poderia ter sido muito bem aproveitada pela direção, para explorar as transformações físicas e psicológicas geradas pela ganância. ‘Deserto do Ouro’ é uma produção que corteja o grafismo para induzir o espectador à empatia, mas suas decisões são de ordem prática, e não artísticas.
Os três atores em cena, tanto Efron e Hayes quanto Susie Porter, compreendem seus trabalhos de maneira muito mais orgânica que a realização; o estranho é que um desses profissionais é justamente o capitão do navio. Mas se existe um aspecto que não podemos acusar no filme é a direção de atores, que não se esburaca pelos mesmos deslizes cometidos pela condução geral. Ainda que o mais exigido seja o protagonista de ‘Vizinhos’ e ‘High School Musical’ (e como esse rapaz amadureceu como ator, aqui sem depender nada de seus atributos estéticos), o trabalho de Porter, em especial, é de muita entrega sensorial. Seu personagem é uma clara armadilha para qualquer ator, e a moça se permite brincar e se divertir com algo muito arriscado, se saindo com a melhor impressão possível para o espectador.
Ainda que não disponha dos atributos necessários para elevar sua produção até um espaço possível de alcançar, Hayes ainda assim não promove indigência. Sua câmera é direta ao drenar cada espaço possível de invenção, mas ele aposta em um lugar de falta de firula que também dá a ‘Deserto do Ouro’ alguma independência dessa exploração extrema da imagem. É um filme que não tem muito interesse em exacerbar sua voz para filmar o extremo da descida ao inferno, mas que se interessa por olhar para o abismo. Podendo ser acusado de exploratório e até ligeiramente sádico com o que promove ao seu protagonista, não há muita alternativa à produção que não a de moer o personagem de Efron até o bagaço. A função dramática dessa decisão é condenar, quase que de maneira cristã, a cegueira provocada pela corrida do ouro, ainda que em algum lugar do futuro.
Quando o filme se encerra da maneira como se apresenta, muito de um possível sadismo é amenizado, e ‘Deserto do Ouro’ se assenta na memória como um filme que poderia ter sido ainda mais absoluto em integrar sensorialidade aos seus elementos. Com elipses que não fazem muito sentido, levando em consideração que é necessário acompanharmos o desdobramento de sua via crúcis para proteger a maior pepita de ouro já vista, Hayes perde a oportunidade de nos fazer adentrar o estado de decadência física e mental, para apenas contar uma história que prende a atenção, independente de que seu filme pedia uma mão para o visual.
Um grande momento
Porquinhos gananciosos