- Gênero: Drama, Romance
- Direção: Vinicius Eliziário
- Roteiro: Vinicius Eliziário
- Elenco: Paulilo, Vittor Adel, Heraldo de Deus, Fernando Alves, Marrom Paulilo
- Duração: 35 minutos
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Quando na pesquisa para uma futura obra, você a partir de testes de elenco concebe algo como Procura-se Bichas Pretas, algo está acontecendo na sua filmografia; uma ebulição feroz que se prepara de maneira menos óbvia, com a precisão de quem já encontrou o próprio caminho. Vinicius Eliziário é mais um nome do futuro do cinema brasileiro que já começou a ser escrito, e Tigrezza é um singelo grito de liberdade que não precisa repetir fórmulas ou discursos. Tudo já foi dito, mostrado e filmado? Não é bem assim que as coisas são, e a realidade LGBTQIAPN+ mostra, infelizmente, que todos os dias temos novas formas de agressão sendo construídas, na vida e na arte. Podemos então encontrar sim novas formas de afeto que já esteja borbulhando por aí, apenas esperando a sensibilidade exata para torná-la acessível de debate.
Existe uma quantidade infinita de filmes, longas e curtas, cujo descobrimento sexual de jovens personagens são o mote narrativo. Eles são produzidos quase desde a criação do cinema, não parando de ser produzidos ininterruptamente, inclusive tantos outros filmes sobre o tema eu acompanhei dentro da mesma edição do Panorama. O que é visto de diferente em Tigrezza? A começar pelo fato de que a juventude desabrochada aqui não é exatamente a primeira idade, ou a segunda, ou mesmo uma descoberta inédita a respeito dos próprios sentimentos e sensações. O que se descobre aqui é uma porta nova dentro de um campo onde elas são inúmeras, e podem continuar sendo abertas continuamente, onde os desdobramentos não são apenas da ordem da sexualidade per se.
No universo ‘queer’, a quantidade de negações e repressões que sofremos desde o primeiro rasgo de delicadeza vai minando nossas descobertas até um futuro que muitas vezes não chega. Quantos de nós perdeu a faísca do desejo no momento e que qualquer lampejo de ameaça se fez? Tigrezza não é um filme onde alguém com mais de 40 anos descobre uma realidade recôndita, mas Danrley persegue uma reconfiguração de rota, como um chamado que ainda não tinha sido atendido. O que perceber quando nossa chama vibra em uma sintonia ainda mais aguda do que percebíamos, e nossa inspiração é mais do que uma grande amizade. Nada é pra já por aqui, mas quase tudo ainda pode ser vivido e tornado realidade.
O que chama mais a atenção em Tigrezza, narrativamente falando, é a quantidade de vezes onde o horror se posiciona à espreita, tanto no roteiro quanto na direção, mas Eliziário não está disposto a realizar esse filme. O filme aqui é sobre essa dose de pressentimento diária que nos faz travar diante da beleza do amanhã, e que muitas vezes se mostra rarefeita. Apenas uma cortina de fumaça que nos impede de encontrar mais rapidamente a auto aceitação e o amor, em todas as suas formas. Buscar na dúvida e no desconhecido as saídas que se mostram tão evidentes na nossa frente, e que nos trava de enfrentar alguns momentos que poderiam ser de pesadelo – o pesadelo cotidiano construindo também falsos horrores ao nosso redor, que nos impede da felicidade.
Com 35 minutos de duração, Eliziário ainda se permite olhar para uma questão contemporânea a respeito da nossa relação com a solitude e alguma carência oriunda da fluidez dos tratamentos hoje, que nos fazem reféns de artifícios que nos carregam mais fundo na dependência emocional. Indo de uma maneira leve nessa observação até alcançar a melancolia mais dolorida, Tigrezza não exime a culpa de ninguém nessas curvas de aplicativos, e deixa claro que seu ritmo invejável (na montagem de Rafael Fernando Oliveira) é fruto de uma conexão rara entre duas histórias desenvolvidas em paralelo.
Sem floreio estético, mas cheio de uma vivacidade que o cinema brasileiro exibe em seus melhores momentos, Eliziário exibe Tigrezza com muita graça e senso de urgência emocional. Seus protagonistas (Paulilo e Vittor Adel) têm química evidente e conseguem ainda elevar o material a um lugar de comunicação em muitos tempos. Tanto estamos diante de uma conversa obrigatória no hoje onde as pessoas se afastam e tornam-se ilhas de si mesmos, como as homenagens ao melodrama do passado encerrado dentro de uma amizade aparente, com ícones ‘queer’ carregando o bastão, fazem da sessão de Tigrezza uma celebração coletiva.
Um grande momento
Danrley em frente ao pai