Crítica | Outras metragens

TV a Cabo (ou Uma Noite na Vida)

Micro-revoluções por minuto

(Cable Box, CAN, 2020)
Nota  
  • Gênero: Experimental
  • Direção: Rob Feulner
  • Roteiro: Rob Feulner
  • Duração: 17 minutos

A princípio uma brincadeira, um jogo, uma banalidade que todos nós já cometemos arremessada há mais de 30 anos no tempo, TV a Cabo (ou Uma Noite na Vida) vai dando aos poucos pistas de que está se comunicando com o espectador muito além da experimentação simples de filmar o zapear por uma televisão americana sintonizada em inúmeros canais a cabo nos idos dos anos 1990. De cara, a identificação dentro daquele universo de prática tão reconhecível, mas lentamente observamos o vazio da prática ser arbitrariamente corrompido.

Exibido pelo Festival Ecrã, o filme dirigido por Rob Feulner reencontra ao longo de sua duração vários personagens por mais de uma vez, como o apresentador de um documentário sobre guerra às drogas, mas a primeira vez que essa repetição fica mais evidente é no encontro com a atleta de patinação artística, que surge em tons de rosa berrante quase deformada pela estática da tv e hipnotiza o espectador a observar outros sentidos que não apenas os mais frugais — mergulhar no sonho possível proporcionado por um aparelho televisor.

TV a Cabo (ou Uma na Vida)
Cortesia Festival Ecrã

A alternativa ao sonho é uma realidade americana de quase 40 anos atrás, com Bill Clinton presidente e posse de armas ainda mais desenfreado, que possibilitaram (entre muitas outras tragédias) as muitas chacinas escolares no país. O concreto da TV não comporta o surreal, ainda que pareça com tal diante de reprises de Cheers e Law & Order. E em meio ao choque de realidade compartilhada através dos tempos em episódios sobre crise econômica e violência policial, eis que o sonho vem mais uma vez salvar.

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Em meio a essa dualidade egressa do aparelho eletrodoméstico mais utilizado no mundo, o que Feulner sugere narrativamente é a salvação da rotina pela fantasia, uma válvula de escape gradativa que nem a música e nem o cinema conseguiram suprir. O olhar opositor para o núcleo da situação é o que, como diz a tradição narrativa, resgata a renovação para o que estava estacionado; a partir da chegada do estrangeiro a interferir no status quo, a sociedade pode enfim acordar do torpor que, vejam só, é produzido pela tv.

TV a Cabo (ou Uma na Vida)
Cortesia Festival Ecrã

A mesma máquina acusada ao longo dos tempos por alienar a população, também será a responsável por arregimentar a revolução, ou algo que o valha. TV a Cabo (ou Uma Noite na Vida) tem tão ampla capacidade de discussão para sua diminuta duração que acaba sendo prejudicial à sua forma que seu conteúdo se pressione para concluir rápido suas muitas análises. Não é a melhor saída para apresentar uma reflexão de pegada refinada a respeito do quarto poder e sua capacidade infindável de promover deterioração ou conhecimento — basta escolher o recorte analítico.

Um grande momento
Patinação artística

[5º Festival Ecrã]

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Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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