Crítica | Festival

Girl Picture

O futuro é mulher

(Tytöt Tytöt Tytöt, FIN, 2022)
Nota  
  • Gênero: Drama, Romance
  • Direção: Alli Haapasalo
  • Roteiro: Ilona Ahti, Daniela Hakulinen
  • Elenco: Aamu Milonoff, Eleonoora Kauhanen, Linnea Leino, Sonya Lindfors, Cécile Orblin, Oona Airola, Mikko Kauppila, Amos Brotherus, Bruno Baer, Nicky Laaguid, Oksana Lommi
  • Duração: 95 minutos

Fui assistir Girl Picture tendo consciência dos elogios recebidos, da vaga para o Oscar de filme internacional pretendida pela Finlândia e tendo visto seu poster. Sei que pareço repetitivo, já declarei isso em outros textos, mas como é bom adentrar em uma produção tendo apenas isso de informações. Todo o resto era inédito, e minha satisfação na sessão crescia exponencialmente, conhecia o que a diretora Alli Haapasalo nos entrega. Ainda que suas ideias não sejam das mais originais empregadas, mais uma vez o que fica na superfície é como essas ideias são apresentadas para o público. Com que qualidade, com que humanidade, com que textura, com que verdade… e no fim das contas, tem a ver com o que é apresentado, mas muito também tem a ver com o envolvimento coletivo, e com a representação da sensibilidade. 

São três meninas, e demoramos a perceber para que lado vai a história, onde cada personagem se conecta, o que é a natureza daquelas relações, qual a importância de suas histórias para a narrativa principal. A resposta: todas, e tudo. O protagonismo é dividido entre essas três jovens mulheres, que já não estão mais em idade escolar, mas ainda estão em processo de descoberta. Sua sexualidade (ou ausência de) permeia o encontro entre as três, e suas permissões conjuntas em adentrar esse assunto, que é tratado com delicadeza e naturalidade, até com responsabilidade, e sem julgamentos morais. Há uma investigação em curso na direção de como tudo aquilo é válido nos dias de hoje, em como nossa relação com nosso corpo e os outros precisam ser reavaliadas, reconstruídas, para que possamos evoluir como seres pensantes. 

Girl Picture
Cortesia Festival Mix Brasil

Haapasalo está em seu terceiro longa como diretora, e sua experiência fica clara em Girl Picture, que tem momentos de construção imagética muito demarcados como tal. O filme tem uma busca pela cromatização de seus planos de maneira integral, sem deixar espaço para que novas cores possíveis sejam introduzidas a cada novo bloco. É uma ideia de utilizar um quadro em branco, lavado, sem a utilização de pigmentação, e com a apresentação dos sentimentos envolvidos pelos personagens, montar uma paleta possível a cada momento. Nada muito fora do comum, mas que chama atenção em um título que aparentava buscar um naturalismo e acaba utilizando esses códigos do autorismo muito claros, que criam um ruído particularmente positivo. 

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A cada avanço de seu roteiro, Girl Picture tenta se descolar cada vez mais de uma análise pregressa e de uma ideia pré-concebida a respeito de um olhar para tais personagens. Elas se transmutam justamente para nunca perder sua relevância e clareza, sempre remetendo ao que tem de mais universal em seus sentimentos. Mimmi parece alguém muito decidido, com uma visão clara sobre si mesmas e os outros, mas esconde um universo de rejeição; Rönkkö é o oposto, muito insegura, não consegue compreender quem é, e não vê muita saída para o que não consegue encontrar; já Emma foi criada para ser uma vencedora em todos os quesitos, mas só fez obedecer a vida inteira, e acha que chegou o momento de expandir seus horizontes. Ela é o equilíbrio entre o que as duas amigas não conseguem ser, e adentra essa relação mostrando a ambas como o mundo precisa ser diferente do que elas se acostumaram a lidar. 

Girl Picture
Cortesia Festival Mix Brasil

São fortes as proposições que um filme como esse consegue acessar, mas Haapasalo não está confortável em uma forma única de entregar cinema. Girl Picture, nesse sentido, encampa discussões que se relacionam com seus aspectos narrativos, mas nunca deixa de apontar as ideias estéticas como sendo fundamentais de sua busca como realização. Há uma dose predominante de investigação pela história desse trio, que têm a mesma idade mas conduções bem diversas de suas personalidades, expectativas igualmente diferentes em relação a como lidam com suas vidas. É uma maneira bem diversa de debater a juventude, bem atual e altamente compreensiva com as dores e dilemas do que é uma jovem mulher cosmopolita, suas escolhas e em como elas reverberam no outro. 

Um grande momento
“dois gins tônicas, por favor”

[30º Festival MixBrasil de Cultura da Diversidade]

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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