Crítica | Outras metragens

Home Safe

A história de todas

(Home Safe, GBR, 2024)
Nota  
  • Gênero: Ficção
  • Direção: Alison Winter
  • Roteiro: Alison Winter
  • Elenco: Sarah Kameela Impey
  • Duração: 9 minutos

Quando uma mulher está andando sozinha à noite e percebe que alguém a está seguindo, ela reza para que seja o capeta ao invés de um homem.

Dentre os grandes medos de qualquer mulher, um dos maiores deles é andar sozinha de noite. O corpo entra automaticamente em estado de alerta, todos os sons chamam a atenção e qualquer movimento passa a ser suspeito. A sensação de insegurança é apavorante e o único desejo é chegar logo em algum lugar que traga confiaça novamente. Culpa de uma sociedade que não respeita o corpo da mulher como dela, que foi moldada em anos e anos de violência de gênero, que naturalizou a agressão. Home Safe representa bem o sentimento, recriando a angústia de um retorno para casa depois de uma saída com amigos. “Manda mensagem quando chegar”. Quando, como, se…

A diretora Alison Winter manipula bem uma angústia, que começa logo na despedida, quando Kerry inicia sua jornada solitária. Os encontros desconfortáveis já se dão no ônibus, porque é usual que mulheres sejam abordadas por estranhos pelo simples fato de estarem sozinhas. O incômodo e medo, facilmente perceptíveis na postura e expressões da personagem, demonstram o quanto ela queria estar em qualquer lugar, menos ali. É na música que aquela mulher se refugia e nos leva junto com ela, cortando qualquer possibilidade de vínculo com aqueles que tentam uma interação forçada.

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Mas se o alívio vem justamente após um momento de solidão, num lampejo de paz, isso se transforma em poucos minutos. Qualquer presença é uma ameaça e isso vai num crescente. Junto com a protagonista, quem assiste ao filme vai esperando movimentos que vão se confirmando e aumentando a tensão. O ambiente, deserto, deixa tudo ainda pior. Winter alcança mais do que a identificação, que toda e qualquer mulher sentirá vendo o filme, mas universaliza o sentimento com sua condução, traduzindo o sentimento a qualquer gênero.

Da interpretação de Sarah Kameela Impey, tão próxima (ou mesmo idêntica) ao real, a pequenos detalhes, como o enfiar as chaves entre os dedos e o passar a bolsa pelo pescoço antecipando a fuga, nada ali é diferente do cotidiano. Todo o caminho é longo e terrível até que se chegue à mensagem final, aquela que tantas ou todas mandam quando se veem na mesma situação de Kerry quando a porta se fecha. Fica a anormalidade de existir em um mundo onde esse tipo de ação seja um padrão esperado e tenha se tornado habitual, onde a segurança do título nunca seja realmente segura.

Home Safe fala sobre algo corriqueiro, e não é a primeira vez que essa trama está nas telas. Versão londrina de um medo de mulheres do mundo inteiro, o curta é potente na sua reconstrução e concretização de eventos e sentimentos. Mais importante, no modo como vai além da representação, fazendo com que a ansiedade seja de todas e de todos, deixando o medo perdurar até depois que sua personagem sai de cena.

Um grande momento
Correndo

Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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