- Gênero: Documentário
- Direção: José Carlos Arandiba 'Zebrinha'
- Roteiro: José Carlos Arandiba 'Zebrinha'', Susan Kalik
- Duração: 88 minutos
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Em meio a um certo volume de produções que tentam desorientar o documentário, tirando o gênero de seu lugar de hábito para investigar novos olhares, novas propostas e novos formas de realizar, ainda existe uma jogada bem mais ampla que deixa a produção em larga escala refém de seu padrão. Ijó Dudu: Memórias da Dança Negra na Bahia é tão confiante no que tem a dizer (e sim, o que ele diz é muito poderoso), que simplesmente não há uma intenção de ir além do que há de mais convencional dentro da área. O filme acredita em seu tema, vai com ele até as últimas consequências, e coloca toda sua disposição na direção do que importa, que são os integrantes de tal onda que transformou a Bahia em um polo essencial para a dança contemporânea negra no país.
O filme é a estreia na direção de cinema de José Carlos Arandiba, que todos conhecem como ‘Zebrinha’, e é um dos nomes mais relevantes vindos desse lugar. Ainda que artista, com o mesmo grau de sensibilidade demonstrado nas dança que venha a se enquadrar em outras áreas, o que sua primeira experiência revela é sua vontade de comunicar a voz dessas pessoas. Não há uma preocupação que tire Ijó Dudu: Memórias da Dança Negra na Bahia da formalidade estrutural, e o filme permanece inserido em um contexto de repetição do que já vemos em outras tentativas. Se as inserções de cada um daqueles personagens valem a tentativa de ampliar nossa percepção imagética sobre o que elas fazem, isso não é sequer tentado pelo filme.
A falta de experiência de ‘Zebrinha’ em sua nova função é óbvia, e suas capacidades emocionais não podem ser descartadas. Os relatos a respeito do racismo que assolou e ainda assola toda uma área de reconhecimento, que não deveria sequer existir, tendo em vista como o racismo é declaradamente um crime, além de estarmos falando de um dos estados de maior predominância negra do país, impactam mesmo o espectador que já esperaria por tal. Mas Ijó Dudu: Memórias da Dança Negra na Bahia não consegue ir além de mostrar tais relatos, registrá-los e difundir suas consequências; cinematograficamente, o que é feito não é relevante. Sua razão imperativa de existir é por exatamente que um registro acerca da importância histórica dessas pessoas acabar por se eternizar, através da imagem.
Algo, no entanto, é grave na realização de Ijó Dudu: Memórias da Dança Negra na Bahia. Como um projeto de cinema, ainda que concebido por um estreante, mas que esse integrante seja exatamente da profissão original de foco do projeto, abre mão de ter seu objeto filmado? Resumo da ópera, há muito pouca dança em cena, e quando há, ela não é completa, dando ao espectador sempre a impressão de estar acompanhando algo pela metade. Sabemos da qualidade de cada relato apresentado, e muitos verdadeiramente emocionam, mas será que não era tão importante para o filme ouvir seus componentes, mas também acompanhar sua prática? Ou seja, no fim das contas, ainda estamos diante de um produto incompleto.
É de se relevar, nesse contexto, o quanto a qualidade das imagens captadas é desigual. Não há uma coesão entre tudo que vemos, e sim um aparente mosaico de imagens, não se importando muito que um trabalho mais vibrante seja conseguido, também devido a esse percurso acidentado. Mas isso importa bem menos, por exemplo, do que as apresentações de cada membro no filme, que discorrem sobre tudo que foram, fazem, são. Em uma sociedade mais justa, o orgulho não deveria ser algo que precisássemos construir diariamente na nossa direção, nos nossos rostos e corpos. Diante de grupo tão cheio de historicidade em cada depoimento, as apresentações de cada credenciais são dos momentos mais repletos de vida a sair de Ijó Dudu: Memórias da Dança Negra na Bahia, é desse lugar, do brilho dos olhos de cada um, que vemos ainda uma fagulha enorme sendo apresentada na direção do espectador.
Outra observação importante a ser feita a respeito de Ijó Dudu: Memórias da Dança Negra na Bahia é a contradição que existe entre o amor que é cultivado pelo lugar, e a consciência que se têm a respeito do tanto de racismo que existe inclusive entre pessoas negras. É o filme apresentando as constradições com as quais todo indivíduo aprende a lidar, que validam por um lado uma experiência de vida, enquanto com outra se defenestra. Esse é mais um ponto que nos conecta ao filme, e ao seu discurso.
Um grande momento
A discussão com a professora