(Operation Christmas Drop, EUA, 2020)
Já é uma tradição de Natal: todo ano, a partir de novembro, a Netflix abre seu streaming para a chegada de inúmeras produções natalinas televisivas, a grande maioria sem qualquer relevância, mas que eventualmente fazem imenso sucesso entre o seu público cativo, provavelmente sedentos atrás de histórias cheias de bons sentimentos, intenções e coração. A certeza dessa rentabilidade é tanta que eles não apenas “importam” produções alheias pra rechear seu catálogo como também produzem as suas próprias, e atualmente o grande sucesso é Missão Presente de Natal, que com leveza e responsabilidade acerta no pano de fundo verídico para montar uma narrativa das mais clichês e previsíveis, cujo sucesso deixa claro como a exigência do público médio que as consome é muito pouca.
A tal operação que o filme mostra é verdadeira e desde 1952 ajuda ilhéus moradores de mais de 50 ilhas dos arredores da Micronésia, fazendo da base da força aérea americana instalada por lá sinônimo de perseverança e acolhimento. A história real não poderia ser mais emocionante e encorajadora, para que possamos sair dos nossos lugares de conforto para pensar no próximo. Mas o filme de Martin Wood em si não provoca nada disso, e sim o conhecimento quanto a veracidade de seus fatos; é a cena-clímax e a ideia a respeito do que aquilo representa no mundo real que nos comove, sem responsabilidade da produção, que raramente consegue transportar o espectador para seu discurso. Ele existe e abriga o filme, só não convence quando é montado cinematograficamente.
O filme é protagonizado por um casal muito bonito formado por Kat Graham (de The Vampire Diaries) e Alexander Ludwig (de Vikings e Jogos Vorazes), que não deixam a peteca cair e convencem o público a permanecer no programa, além de não terem necessariamente culpa pela burocracia instaurada. Com carisma, eles carregam a história com segurança, e tem a ajuda da experiente Virgínia Madsen (indicada ao Oscar por Sideways) em participação pequena mas muito efetiva em sua última cena, ao trazer para a produção uma tarimbação quanto à humanidade envolvida no projeto. A atriz em poucas cenas nos convence dos lados conflitantes de sua personalidade e assim marcar o contraponto à narrativa.
O filme tinha armas para não perder sua leveza e ainda assim promover um debate pertinente sobre gastos de verba pública versus a funcionalidade desses mesmos; pra onde cai o dinheiro do contribuinte quando não controlado? Mas essa reflexão nunca passa de um contexto raso e pouco explorado para exalar boas vibrações para o público que exige pouco do passatempo oferecido. Enquanto material audiovisual, Missão Presente de Natal é quase desprovido de qualquer intenção que o eleve, completamente tranquilo da ausência de ambição que não o escapismo, que o filme até cumpre – com bom ritmo, não percebemos que rapidamente o programa se encerra, sem aborrecer, ainda que saibamos até a ordem dos acontecimentos em tela.
O grande mérito do filme, no entanto, está na falta de preocupação em determinar o destino futuro de seus personagens, e isso fica evidente quando o filme leva de maneira tão retraída a relação entre os protagonistas, que provoca uma óbvia torcida justamente pela tranquilidade com que concatena os acontecimentos. No desfecho do filme essa característica se eleva, quando o roteiro simplesmente apresenta seus elementos, não julga nenhum deles e sabiamente se retira, deixando para fora de si essa ideia tradicional de sinalizar um encaminhamento futuro, mesmo que ele fique fora de quadro, o que confere segurança ao resultado.
Ainda que seu desfecho seja um acerto, com o filme apresentando um resquício de autoralidade ainda que longínquo, Missão Presente de Natal só vai agradar sem contraindicações ao público que não espere dele mais do que ele pretende a oferecer, que não é muito. Ainda que os eventos reais que o inspira sejam profundos em seu caráter humanista, o filme que deriva dessa história não passa de um esquecível produto natalino da Netflix, sem qualquer desejo superior.
Um grande momento
O abraço do entendimento