- Gênero: Guerra
- Direção: Edward Berger
- Roteiro: Edward Berger, Lesley Paterson, Ian Stokell
- Elenco: Felix Kammerer, Albrecht Schuch, Daniel Bhrüel, Sebastian Hülk, Anton von Lucke, Devid Striesow, Edin Hasanovic, Michael Winterborn
- Duração: 144 minutos
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Difícil é precisar qual cena de Nada de Novo no Front ficará mais evidente na memória, sendo que o filme é construído dentro de um arsenal delas. Quando cito essas passagens que nascem inesquecíveis, isso se dá por um acréscimo interessante a uma narrativa que poderia ter aberto mão disso: as cenas ficarão porque seus personagens existem, é com eles que seguimos pela narrativa, e é deles nossa entrega. É graças ao quanto o filme nos conecta com seus elementos, emocionais ou físicos, que o sucesso desse imenso acerto da Netflix não parecem vão. Trata-se de uma nova versão para o livro do veterano alemão Erich Maria Remarque, finalmente chegando a uma versão alemã para esse sucesso literário.
Da primeira versão, o clássico absoluto Sem Novidades no Front, vencedor do Oscar dirigido por Lewis Milestone, o filme guarda quase apenas os talentos de seus respectivos diretores, porque tratam-se de tragédias pessoais como um trampolim narrativo. As relações que são estabelecidas entre soldados bastante jovens durante a Primeira Guerra Mundial são a base de suas obras, que costuram aqui esse quadro de relacionamentos com as cenas de batalha e uma terceira ocupação, com as intrigas de estado e as suas tentativas de reverter um quadro absurdo. As escolhas livres que são feitas aqui se livram, com isso, de uma lupa que pudesse colocar o título em lugar de acusações, buscando uma comunicação que pode ser polêmica.
Aqui, no entanto, há uma comunicação clara e inevitável a ser feita com o recentíssimo (e igualmente premiado, e excelente) 1917, do qual o filme não tenta fugir, mas que parece vez por outra tentar criar uma personalidade contrastante. Nada de Novo no Front cria uma série de comunicações e discrepâncias com o filme de 1930 que passeiam como um título curioso dentro de uma produção impecável. Situar o filme em paralelo único com a produção de Sam Mendes é desmerecer um trabalho de sofisticação exemplar, tanto narrativa quanto imageticamente. Até porque conceitualmente são filmes quase opostos um do outro, que sempre criou uma camada de curiosidade e comparação, que vai sendo superada quando entendemos que eles podem desaparecer, e que o façam.
Enquanto 1917 carrega consigo uma questão quase exclusivamente física do horror dessa mesma guerra, uma ‘gameficação’ da jornada do herói, absolutamente moderna e que é referendada pela juventude adepta do vulgarismo, Nada de Novo no Front se encontra com o público ao acessar seu emocional. Muitas acusações foram feitas ao épico de Mendes a respeito justamente disso, seu descolamento da narrativa, o diretor Edward Berger, sem qualquer grau de pieguice, nos revela o interior do soldado, e não apenas seu maquinário corporal. Também está paralelo a isso o desfecho da guerra, decidido longe das fronteiras, e a situação política da guerra, tão dantesco quanto o palco principal; é um conjunto de tramas que se intercalam de maneira primordial.
Concatenando todo o espetáculo, está o trabalho irretocável de misè-en-scene, que Berger apresenta com a segurança de um diretor acima de qualquer suspeita. Com 30 anos de experiência, chegou ao seu maior momento como realizador, onde está a favor de uma história de tintas épicas, onde cabem uma fotografia de rigor avassalador de James Friend e a trilha sonora de Volker Bertelsmann. Ambas contribuem para o resultado final de Nada de Novo no Front com talentos em seus graus mais apurados; o primeiro iluminando o set de maneira embasbacante, registrando momentos verdadeiramente primorosos, e o segundo com uma trilha que parece um rasgo na narrativa, cortando a ação para sons que incomodam pelo emprego de suas notas desconcertantes. Profissionais que definem o tom da produção, com um olhar de excelência para a realização dos seus trabalhos.
No fim das contas, o que faz a diferença em Nada de Novo no Front, apesar da imediata concordância sobre o que é relevante, é a narrativa, seus personagens e sua qualidade de relevo. É quando a união faz um filme irretocável em sua criação de imagens, mas principalmente na construção de um universo crível ao olhar de cada sujeito em cena. Sejam eles soldados no meio do horror e da chacina, assim como os grandes líderes dessas ofensivas, a participação de todos é crucial para o volume de narrativa, e para a emoção provocada. Isso tudo é conseguido porque o filme planta essa intenção na imagem; o que acabamos por ver são sempre as mãos, o toque, os abraços e olhares, é tudo parte integrante – e nesse caso, crucial para o sucesso – da acertada engrenagem que faz Nada de Novo no Front um produto que extrapola predicados, alcançando o humano.
Um grande momento
Alemanha e França se engalfinham na lama – e o filme vira outra coisa
Daniel, Produtor do All Quiet. Quem bom que você gostou do filme. Viva o cinema!