– E então? O que está achando do festival?
– Muito bom. Ontem foi o melhor dia. Vi o Reginaldo Faria, aquela menina que fez o papel da Maysa e o Oscar Magrini estava bem mais simpático.
– Ah… Mas e os filmes?
– Não entrei não. Não dá pra entrar todo dia. Só quem tem muito dinheiro ou é convidado.
– Mas nem nas reprises você foi?
– As reprises também são pagas. R$15,00 por dia.
– É. Aí fica difícil.
Assim começou o meu quarto dia na cidade de Gramado. Fiquei na dúvida sobre qual seria o principal objetivo do festival e cheguei à conclusão de que, por mais que eles digam que não, é no tapete vermelho.
Enquanto mini-celebridades, como diz uma diretora amiga, passeiam pelo hall do Palácio dos Festivais e homenagens a “importantes” nomes da sétima arte, como Xuxa Meneghel, acontecem, o cinema em si fica em segundo plano.
O festival fica limitado a convidados e imprensa, enquanto o grande público fica detrás das grades do tapete vermelho e as salas de projeção vazias. E não é sem motivo. Hoje em dia, não é todo mundo que consegue tirar do bolso quase R$ 100,00 (os preços variam) para ver uma sessão de cinema. Mesmo que um dos patronicinadores seja uma cervejaria e distribua a bebida entre os convidados, ou que chocolates deliciosos também sejam gratuitos.
O movimento é justamente o inverso dos festivais do resto do país. O Festival de Brasília, no ano passado cobrou R$6 a inteira de suas sessões e não eram só os estudantes que pagavam meia-entrada. Até mesmo salas caras como as da Reserva Cultural, em São Paulo, ou as da Academia de Tênis, em Brasília, abaixam seus preços para mostras e festivais. O objetivo de todas é levar o maior número de espectadores possível para a sala de projeção. Afinal de contas, a importância do festival, muito além dos prêmios recebidos, está no conhecimento do público.
A distribuição de filmes no país, embora tenha melhorado, ainda está muito aquém do necessário e muitos títulos vitoriosos em festivais ficam longe das telonas. No final das contas, participar de festivais sana esse problema e dá oportunidade a alguns, já que não pode dar a todos.
Atitudes gananciosas e voltadas unicamente ao lucro, acabam com essa possibilidade e, sem nenhuma dúvida, atrapalham a cultura.
Assim, Gramado continuará sendo um festival de aparências e glamour e ao público restará somente a oportunidade de ver passar pelo tapete vermelho aquele ator da nova das oito e, quem sabe, tirar uma foto com ele.
E conversas como a do meu café da manhã se repetirão todos os anos.
Eu não poderia falar melhor que a Fábia, não mesmo! Esse glamour tira o valor do que, para mim, é a principal função do filme: causar sensações e reações.
Sabe, que por isso, acabo gostando muito do formato do Festival de Brasília. Lá há um envolvimento em vários sentidos: a pessoa chega às 16h na fila para comprar ingresso (por R$ 6), as salas ficam lotadas e as pessoas se manifestam (às vezes, com pouca educação, é verdade) sobre o que o filme causou nelas. O ator torna-se um qualquer na praça de alimentação entre vários que estão ali discutindo. É possível, inclusive, conversar com o diretor do filme falando se gostou ou não.
Pra mim, festival tinha que ser assim: gerar crítica, discussão e reflexão. Tornar o cinema algo ao alcance de mais pessoas, até mesmo por essa ruptura figura da estrela. Carregar a mensagem e não o glamour.
E viva o Festival de Brasília (que obviamente tem defeitos, mas ainda assim tem um formato mais engajado).
Ciça, tá de parabéns a cobertura de Gramado.
Ouch… chega a ser meio deprimente. A que estado chegou hein?
Gramado cada vez mais tem se tornado um evento vazio e sem propósito. A cultura que dá o tom é a das celebridades. Discussões e debates sobre o cinema em si raramente tem o espaço merecido. Ótimo post!
Abraço
Não é desesperador pensar que, por causa de eventos e absurdos desse tipo, o cinema e outras linguagens culturais continuam sendo sacralizadas e colocadas num pedestal que não podia existir?
Por mim, era tudo banalizado. O glamour não reside no valor de um ingresso ou entre atores que vestem a pinta do tapete vermelho… Aquilo que comove, instiga, revolta e emociona num filme – no palco, num quadro, na música – sim, é glamour!
Tá tudo muito errado…
beijos
ps.: não esqueci do email!