O Tubérculo

De vez em quando, a Mostra Tiradentes parece servir ao espectador exatamente aquilo que o espectador presente espera encontrar, para o bem e para o mal. É o caso de O Tubérculo, obra que parece ter sido moldada para encontrar aqui seu espaço para nascer. Encerrada a sessão, a clara impressão de que todos os códigos que constroem um típico exemplar da fauna ‘tiradentiana’ foi visto fica óbvia. Há de se aplaudir a coragem de nem ao menos tentar disfarçar, ou deixar um pouco mais disfarçada as suas intenções. Ficou para outro título, aqui temos um caso de apropriação absoluta do que se acha que o evento pede aos realizadores. O lado decepcionante é perceber que a curadoria foi lá e assinou embaixo da vontade de seus realizadores. 

Lucas Camargo de Barros e Nicolas Thomé Zetune tinham sido mais felizes em sua estreia em longas, O Pequeno Mal, filme que conseguiu ser absorvido pelo Festival de Brasília e pela Semana dos Realizadores. Tratava-se de um longa de gênero cujo incômodo surgia do desconforto, muito mais do que as tradicionais convenções. Agora em O Tubérculo eles partem para algo que poderia ser definida como uma… história de amor? Talvez. Ou algo parecido com isso, onde seu protagonista acaba descobrindo algo muito maior do que veio buscar na volta para casa. Essa é uma premissa bem básica do gênero, e os jovens diretores decidem montar esse quadro de maneira fora do comum imageticamente, mas que rende em uma subversão vazia. 

Rodado em Super 8, e com uma busca incessante pela construção imagética de algo que represente a estranheza e o bizarro, O Tubérculo não realiza seus intentos na totalidade porque eles se mostram sempre muito óbvios. Essa é uma característica das produções da mostra em 2023 – frequentemente assistimos aos diretores colocarem verbalização excessiva em cena, o que torna tudo muito didático. Como falo sempre, essa é uma prova da falta de confiança no espectador e na capacidade de comunicação de sua obra. Talvez falte isso aqui, não para que a narrativa seja solucionada, mas para que possamos saber em que lugar se pretendia chegar aqui, além de aportar em Tiradentes e mostrar que basta querer para conseguir. 

Nesse sentido, Barros e Zetune saem de um espaço de experimentação cheio de camadas para uma tentativa de chamar atenção para um gatilho de produção. A utilização das filmagens de Super 8 não agregam propósito ao projeto, nem representam uma equalização do que vemos. Mais parece um charme agregado do que necessariamente realizar algum sentido conexo à história que está sendo contada. Um filme não pode ter um gracejo jocoso como uma provocação qualquer de seu realizador? Lógico que pode. Se ela soar vazia e sem agregar valor ou razão aparente, no entanto, essa questão precisa ser levantada. O Tubérculo nos remete a isso na maior parte do tempo, provocações que não se ampliam para além do chiste particular. 

Na verdade, a curta duração do longa e os gatilhos que ele mostra explicitamente deixam claro que trata-se de um curta metragem sob a qual foi colocada muita pressão, e seu resultado mostra que a escolha se deu errada. Lembro de A Nova Melancolia, belo curta de Álvaro Andrade e Marcus Curvelo, ou mesmo Copacabana Madureira, uma das pérolas de Leonardo Martinelli, que eram experimentações ininterruptas de filmagem, colagem, muito agudas e arriscadas, e com toda certeza tem a duração que precisavam ter. Ao esticar as possibilidades de O Tubérculo para além do que ele teria como motivar, seus diretores retiraram da produção o tanto de força que tal proposta alcançaria em provocações pontuais.

Com todas essas pontuações, O Tubérculo não deixa de apresentar bons momentos, como quando conecta várias implicações fálicas às suas imagens, para relacionar a história de amor que o filme vislumbra. A presença de ‘Meu Primeiro Amor’ na trilha sonora reforça o caráter lúdico que o filme consegue abarcar aqui e ali, e quando ouvimos Junior entoar “eu preciso ter você… uma paixão quando vem não dá pra segurar…” (‘Aprender a Amar’), o filme confirma sua vocação pop. Pena que se tratem de momentos fortuitos dentro de uma produção que não consegue nem agregar a doença fictícia que eles apresentam de maneira orgânica à narrativa. 

Um grande momento

O parque aquático