- Gênero: Suspense
- Direção: Timur Bekmambetov
- Roteiro: Britt Poulton, Timur Bekmambetov, Olga Kharina
- Elenco: Valene Kane, Shazad Latif, Morgan Watkins, Christine Adams, Amir Rahimzadeh, Emma Cater, Eloise Thomas
- Duração: 106 minutos
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De repente, todo mundo quer ter um desktop movie pra chamar de seu. Febre nos últimos anos, esse subgênero surgiu em 2006 em The Collingswood Story, com poucas variações do que é feito até hoje: encampar uma narrativa através das lentes de notebooks, celulares, computadores e afins. Geralmente atrelado ao suspense, foi com o sucesso de Amizade Desfeita que a discussão sobre o formato explodiu entre o público médio, e desde então inúmeros filmes, incluindo alguns sucessos, têm mobilizado o cinema de gênero. Foi imaginado que a pandemia do covid-19 deflagraria um interesse maior pelos títulos desse campo, mas a verdade é que Host foi o único filme que nasceu dentro do contexto. Com quatro anos de atraso, Perfil finalmente estreia no Telecine, e é mais uma surpresa desse grupo de filmes.
O russo Timur Bekmambetov, que produziu tanto Amizade Desfeita quanto Buscando…, finalmente estreia na direção de um desses longas, e tem aqui seu melhor filme desde O Procurado, em um lugar completamente diferente do que sua filmografia atenta. Dentro dos títulos que já dirigiu, a grande maioria dos títulos tende para a ação desenvolvida dentro da ficção científica, e aqui uma dose de realismo ainda não visto sai de sua cadeira de diretor. Inspirados em eventos reais, como é costume do subgênero é desenvolvido em escopo muito diminuto; especificamente a tela de computador de uma jornalista que tenta transformar uma ideia de matéria em realidade. Nesse sentido, Perfil também promove um respiro a seu grupo de produções, ao propor mergulhar em páginas de jornais policiais para desenvolver sua ideia.
Essa mudança é crucial para que os títulos ganhem importância que os valide para fora do cinema de gênero, que ainda é marginalizado. Mas essa validação é importante para quem? Um drama de tintas biográficas costuma ser algo menor no terreno cinematográfico, então o acerto de Bekmambetov é de muitas ordens, e uma verdadeira rasteira coletiva. Não é bem o desktop movie que precisava de Perfil, mas todos os outros gêneros que ele representa, mais precisamente a biografia, afundada na mesmice. Uma forma absolutamente inovadora de mostrar essa história em específico, que já foi detalhada de maneiras convencionais anteriormente, não adicionando nada ao remanufaturado de fábrica. Dessa forma, o que vemos é uma subversão de conceitos que se provam ainda mais arcaicos enquanto o longa se revela.
A carreira do próprio diretor, que estava estagnada em lugares que ele já não tinha nada a acrescentar, sai da respiração por aparelhos para divulgar novas possibilidades narrativas. Aqui, Bekmambetov oxigena um gênero padronizado para além do campo que o mesmo costuma apresentar. Perfil já teve diversas encarnações em suas outras maneiras de representar essa discussão sobre terrorismo, nas mãos de cineastas como Ridley Scott, que sempre entregaram o melhor possível dentro de uma caixinha moldada pela tradição. Aqui, cineasta e obra acabam por representar uma virada dentro de um lugar que não precisa estar nessa representação formulaica; já vimos esse roteiro repleto de perseguição e tiroteios – a tensão aqui existe, porém raramente sai desse cenário único.
O roteiro do filme ainda propicia uma deliciosa picardia para a estrutura que o filme passado em telas de computador apresentou, até aqui. Pelo seu caráter imediato, o desktop movie geralmente encampa uma ideia de narrativa em tempo real, desenvolvida no tempo exato da duração. Em Perfil, Bekmambetov e suas co-roteiristas Britt Poulton e Olga Kharina permitem à produção que o sistema de arquivos da protagonista Amy sejam separados pelos diferentes dias de encontro entre ela e o recrutador islâmico que conheceu. Essa estrutura ajuda a ambiguidade da relação que nasce entre Amy e Bilel, o sedutor personagem que ela encontra em sua pesquisa, elemento mantenedor do suspense crescente da produção.
Aliás, Perfil apresenta um caso onde a beleza estética era necessária para que a história fosse contada da melhor maneira possível. Vivido por um ator extremamente charmoso como Shazad Latif, Bilel se vale de sua plástica para conseguir desempenhar sua função no longa – trata-se de um fundamentalista islâmico recrutador de mulheres para a linha de frente da guerra. Com a estrutura elíptica muito bem conduzida e o carisma de Latif na frente da câmera (literalmente’), o filme se desenha como uma experiência de imersão parecida com a que a própria protagonista experimenta, mais uma característica do subgênero que o diretor absorve e subverte, ao reconfigurar as armas do suspense dentro de um arsenal narrativo do drama tradicional.
Um grande momento
Amy em Amsterdam