Crítica | Outras metragens

Malmousque

Frescor atemporal

(Malmousque, FRA, 2021)
  • Gênero: Comédia, Romance
  • Direção: Dorothée Sabbagh
  • Roteiro: Dorothée Sabbagh
  • Elenco: Sophie Cattani, Hélène Mohamed, Thierry de Peretti, Gérard Debouche, Maxence Tual, Lucas Tighilt, Yannis Ghelami
  • Duração: 25 minutos

Malmousque é uma zona litorânea da Marselha, que abriga turistas e locais com a mesma intensidade. Um lugar que parece desejar ser intocado pela tecnologia e que inspirou o filme de Dorothée Sebbagh, que entrega o delicioso Malmousque à nossa apreciação, no MyFrenchFilmFestival, uma espécie de respiro diante da velocidade. É como se tivéssemos pego um atalho e caído de pára-quedas em uma daquelas mais despretensiosas produções da ‘nouvelle vague’. O tempo narrativo é outro, compreendendo o espaço cênico como preponderante para definir aquelas relações, sua mecânica diferenciada e o lugar onde cada elemento consegue se expandir, em sua placidez. 

Em tese, nada de muito relevante está acontecendo, e por isso mesmo que na verdade estamos diante de tudo. A cada novo micro detalhe, uma parcela de mundo é desbravado; a cada personagem que se apresenta em sua extensão, um fio se desenrola rumo a um estado de espírito. Isso é definido por Malmousque por Sebbagh filma tudo com essa clara inspiração sessentista, em um senso de coletividade que não é tentado ultimamente. Diferente do que é mostrado nesse sentido, que geralmente impulsionam a elaborações dos corpos em movimento em larga escala, a representação do múltiplo aqui está a favor do espaço e da interação desses personagens com o mesmo. 

Já parte do título da produção, que remete de maneira simples ao que deveria ser ao escolher batizar uma obra como o lugar em questão. Recentemente vimos Amsterdam, que de Amsterdam não tínhamos nada; aqui, Malmousque não é apenas o espaço onde aqueles personagens estão encerrados. Suas ações e seus desejos, a forma como eles interagem com seu entorno, como a dinâmica local delimita a narrativa e a impulsiona adiante, é sempre de contribuição mútua. Os tipos se definem por estar ali, e essa fatia de litoral também está expressa em cada curva de suas motivações; é um jogo que redefine os dois lados. 

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Esses corpos se transformam em existências quando passam a dialogar sobre o nosso tempo. A tecnologia como vetor de ansiedade, ainda alguma repressão sexual, o julgamento que montamos quando não sabemos lidar com o que desconhecemos – relações humanas das mais prosaicas. Quando adentramos este universo, percebemos que Malmousque é organizado para um microcosmos rápido sobre questões pontuais do hoje, e como bom curta metragem que é, nada está esgarçado. Temos acesso ao que é essencial para movimentar aquela narrativa, e que saibamos traçar um paralelo entre o que vemos e o que conhecemos. 

O que sua autora cria é esse mosaico de historinhas curtas e ensolaradas, que transforma espaço e pessoas em um amálgama de duplo sentido. Estamos exatamente no nosso tempo (e o casal LGBTQIAPN+ dita isso) e em outro, nas referências claras a um cinema que Louis Malle e François Truffaut já fizeram. Malmousque funciona tão bem porque nos conecta a esse tempo passado de maneira tão efetiva no que concerne a realização, e que nunca deixa de conversar com o hoje. Uma homenagem que honra sua matriz, sem deixar de comunicar-se com a atualidade. 

Um grande momento
O primeiro passeio de caiaque

[13º MyFrenchFilmFestival]

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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