- Gênero: Terror
- Direção: Samuel Bodin
- Roteiro: Chris Thomas Devlin
- Elenco: Woody Norman, Lizzy Caplan, Antony Starr, Cleopatra Coleman, Luke Busey, Jay Rincon, Aleksandra Dragova
- Duração: 85 minutos
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‘Cobweb’ é o título original de Toc Toc Toc – Ecos do Além (mais um caso de batismo em português onde pouco ou nada faz sentido, a não ser em generalizar questões mais complexas), que na tradução seria uma estrutura criada pela aranha para apanhar outros insetos, uma armadilha em si. Ainda que mais poético, originalmente o filme de Samuel Bodin também teve lá fora algo pouco atrativo para atrair o público, onde o sentido também parece restrito. É uma pena então se o público não conseguir atender ao chamado do filme, porque não faltam surpresas na descoberta dessa produção modesta no escopo técnico e geográfico, mas muito ambiciosa no que está pretendendo dizer. Se a aparência não nos assegura nada do tipo, o resultado da sessão acaba sendo bem mais profundo do que estaria nos planos.
Bodin é um estreante em longas, e o roteirista Chris Thomas Devlin está apenas no segundo, e o primeiro foi detestado por quase todo mundo (O Massacre da Serra Elétrica: O Retorno de Leatherface). Portanto, não é fácil confiar em Toc Toc Toc – Ecos do Além, ou de que do resultado dessa mistura sairá algo aprazível. É exatamente nesse ponto que costumamos ser surpreendidos, que é o acontecido aqui. Ao invés de nos deparar com um filme assolado de clichês narrativos e imagéticos, percebemos que a superfície que é apresentada a história é apenas um ponto de partida que encontra motivações bem pouco prováveis. O que julgávamos ser algo corriqueiro e derivativo não é exatamente um poço de originalidade, mas trata-se de um caminho bem pouco usual, que vale muito mais de seus aspectos psicológicos, e de como as imagens produzidas significam algo mais simbólico do que explícito.
A começar pela concentração muito forte que tem na produção, são poucos personagens com quem se preocupar, eu diria que apenas quatro – Peter, seus pais e sua professora. Isso não apenas reduz a ação a poucos espaços, como essencialmente foca seus temas de maneira muito específica. E quando Toc Toc Toc – Ecos do Além ameaça apresentar uma premissa-base, logo fica claro de como estamos acompanhando uma cortina de fumaça que será revelada em breve. Não tem a ver exatamente com os traumas que Peter já apresenta, e sim nos vindouros, e que provavelmente se manterão junto com o menino, pois o filme acerta muito no que está tratando e na forma visual desse tratamento, induzindo o espectador a sentir junto com o personagem seus temores e seu horror, além de refletir sobre os propósitos de cada movimentação narrativa.
O diretor, apesar de iniciante, sabe de conceitos imagéticos porque cresceu impressionado com as mesmas imagens que todos nós dos clássicos do gênero. Com humildade, Bodin decide então criar sua iconografia particular, passeando por Toc Toc Toc: Ecos do Além a assertividade de quem entende do que produzir, e de como tornar tais planos e figuras como a mais pura representação do trauma. Nesse sentido, a história de Peter se confunde propositalmente com o que o cinema pode tornar marcante: se dentro da narrativa, são essas imagens do horror que amedrontarão a vida do menino, é desse mesmo material que, ao provocar os instintos primitivos do espectador, terá a seu favor uma construção de realização. São momentos conscientes de tal, mas que mesmo tendo a intenção dessa provocação, os resultados são obtidos.
Primeiro porque o que é estabelecido é verdadeiramente poderoso, e segundo porque o filme contorce essa ideia de paralelizar sua própria estrutura com a da mitificação por trás dos traumas de Peter. São as imagens que atormentam a criança que também são criadas para atormentar o espectador, e tentar criar em Toc Toc Toc – Ecos do Além um conceito que é bem arquitetado, a respeito dessa cosmologia do trauma. Se não foi o suficiente para fazer o filme ganhar um status na saída, que o futuro seja benéfico para um título que aposta em abóboras com as bocas costuradas e em ao menos uma cena que, pra mim, nasceu com ares icônicos: a mãe correndo na direção de Peter, e por um segundo, seu rosto transforma-se em outra coisa. É desse tipo de material, que é alheio ao que é narrativo, que nasce uma mitologia em torno de uma produção, ainda que humilde.
Toc Toc Toc – Ecos do Além tem, além do empenho de seus autores, um trunfo que deve ser o maior achado infantil recente, Woody Norman. Em cartaz com Drácula: A Última Viagem de Demeter e tendo recebido merecidos prêmios por Sempre em Frente, o pequeno não reproduz sempre um mini adulto, como poderíamos nos levar a acreditar pelo filme de Mike Mills. Aqui, ele interpreta uma criança absolutamente fragilizada pelos monstros que invadem a sua cabeça mas também pelos que circulam ao seu redor, muito vivos. É ele quem dá o tom para o filme, e que conduz muito bem a ideia da construção dos traumas que nasceram na infância, e como eles irão perdurar na nossa vida. Parece pouco para um filme modesto? Particularmente não acho. Mais um caso de diretor a se observar no futuro, e ator para se aprovar já no presente.
PS: Não creio ter sido uma lembrança da produção por ser um título que me impressiona em particular, embora seja esquecido, mas ver entrar uma trupe de malfeitores com máscaras de animais em cena, tal qual no telefilme A Fortaleza, de 1985, me deixou bastante incomodado, no melhor sentido.
Um grande momento
Correndo