Valor Sentimental é um filme que se constrói a partir do que fica suspenso. Na coletiva de imprensa do filme, com a presença do diretor, do roteirista e do elenco principal, também pôde ser percebido com naturalidade. Ninguém tentou explicar demais o que está em jogo e as falas retornavam sempre aos mesmos pontos: família, tempo, memória e arte como tentativa de comunicação entre pessoas que nunca aprenderam a falar umas com as outras.
Joachim Trier e Eskil Vogt escrevem juntos desde jovens e não romantizam esse processo. “Somos igualmente nervosos toda vez que começamos”, disse Trier. Vogt completou: “Aceitamos cedo o quanto somos pouco profissionais. Somos amigos antes de tudo. A escrita nasce de passar tempo juntos, falar de vida, ouvir música. Depois de um tempo, algo aparece”. O filme carrega essa lógica de conversa contínua, sem fechamento claro.
Desde o início, o projeto foi pensado para Renate Reinsve. Trier explicou que queria voltar a trabalhar com ela, agora em outro registro. “Havia a vontade de tentar uma personagem mais madura, com outro peso emocional.” Para Reinsve, receber um roteiro escrito para ela foi ambíguo. “É uma honra enorme e também muito assustador. Quando começo a cavar uma personagem, surgem coisas em mim que eu não quero ver, mas que estão ali.”
Nora, sua personagem, encontra na arte um espaço possível para sentimentos que nunca conseguiram circular dentro da família. Reinsve falou disso de forma direta: “Ela tem uma saída artística para algo que nunca conseguiu processar ou comunicar. Para chegar ali, precisa se abrir para coisas que evita. Poderia ser qualquer profissão. O teatro é só o lugar onde isso acontece.”
A entrada de Elle Fanning adiciona outra camada a Valor Sentimental. Fanning contou que A Pior Pessoa do Mundo já era um filme importante para ela antes do convite. “Trabalhar com Joachim era um sonho. Quando li o roteiro, fiquei muito tocada.” Sua personagem, Rachel, poderia ser um tipo fácil, mas o filme evita isso. “Ela tem talento, mas não sente que tem controle sobre a própria carreira. Existe uma excitação em sentir a emoção surgir, mas isso é diferente de quando ela vem de um lugar realmente pessoal.” O gesto de se afastar do papel que deseja marcou, para Fanning, um momento de honestidade.
O pai, Gustav, vivido por Stellan Skarsgård, concentra muitas das tensões do filme. Skarsgård simplificou: “Ele poderia ser qualquer tipo de artista. O conflito é entre a incapacidade de lidar com a vida pessoal e a entrega total ao trabalho.” Para ele, atuar passa menos por ação e mais por escuta. “Quando você tem parceiros fortes em cena, basta reagir.”
Esse cuidado atravessa também o método de Trier. Ensaios não são leituras formais. “Chamamos de ensaio, mas é mais sobre convivência”, explicou. “Converso com cada ator, depois juntamos dois a dois. Filmamos, revemos, reescrevemos. Cortamos muito diálogo, muita explicação.” Vogt resumiu essa escolha: “É melhor dizer dois mais dois e deixar o público chegar ao quatro.”
A casa que estrutura Valor Sentimental surge de algo cotidiano. Enquanto escreviam, Trier lidava com a venda de uma antiga casa da família. Vogt contou que ali perceberam uma possibilidade dramática. “A casa dava perspectiva. Ela carrega memória, coisas que atravessam gerações.” Segundo ele, não funcionava como símbolo fechado, mas como presença constante.
Uma das sequências centrais nasceu também uma experiência pessoal de Trier com documentos do passado do avô. Ele descreveu o dia como silencioso e carregado. Inga Ibsdotter Lilleaas, que interpreta Agnes, lembrou do impacto: “Não planejamos nada. Eu comecei a ler e fui tomada por aquilo. Era sobre a personagem, mas também sobre pessoas reais. Saí daquele dia entendendo mais sobre ela e sobre o pai.”
Quando a conversa chegou à ideia de arte como cura, Trier evitou respostas fáceis. “Não acreditamos que dizer algo resolva tudo. O filme fala de pequenos passos de aceitação.” Ainda assim, ele reconheceu um efeito de sustentação. “Encontrar uma forma para algo pessoal e compartilhar isso cria sentido.”
Quando a conversa chegou à ideia de arte como cura, Trier evitou respostas fáceis. “Não acreditamos que dizer algo resolva tudo. Valor Sentimental fala de pequenos passos de aceitação.” Ainda assim, ele reconheceu um efeito de sustentação. “Encontrar uma forma para algo pessoal e compartilhar isso cria sentido.”
Reinsve completou sem tentar definir demais: “São coisas que vêm do inconsciente e que continuam voltando. O filme vira um espaço comum entre quem faz e quem assiste.”


