Crítica | Streaming e VoD

Valente

(Brave, EUA, 2012)

Aventura/Animação
Direção: Mark Andrews, Brenda Chapman, Steve Purcell (co-diretor)
Elenco: Kelly Macdonald, Billy Connolly, Emma Thompson, Julie Walters, Robbie Coltrane, Kevin McKidd, Craig Ferguson
Roteiro: Mark Andrews, Steve Purcell, Brenda Chapman, Irene Mecchi
Duração: 100 min.
Nota: 6 ★★★★★★☆☆☆☆

Mérida é uma garota à frente de seu tempo. Princesa de um reino unido pela guerra e uma das poucas figuras femininas em terras dominadas por homens, vê muito mais sentido em treinar arco e flecha do que em aprender etiqueta ou arrumar os cabelos. E, claro, para desespero de sua fina e delicada mãe, não está nem um pouco interessada na prematura, mas obrigatória, escolha de um noivo.

A história já é diferente do que estamos acostumados a ver em tradicionais animações que envolvem princesas. Aqui não há um príncipe encantado que vai preencher, dar sentido, trazer felicidade para a vida de sua princesa e, assim, salvá-la de todo o mal que há na terra. Muito pelo contrário.

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Diferente de todo o modelo Disney de história de princesas, que há anos é repetido e serve de inspiração, toda a jornada de Mérida lembra muito mais as animações orientais, como A Viagem de Chihiro. Assim como na história de Hayao Miyazaki, a busca da protagonista é pelo auto-conhecimento, pela resolução de problemas interiores e tão comuns em relações humanas.

Apesar de ser seu ponto positivo, a abordagem talvez seja o maior estranhamento do público com Valente. Ao adotar o estilo dos desenhos animados orientais, a Pixar rompe com tudo que o público espera ver em um desenho com esse tipo de personagens.

Além disso, há um outro desafio. Hoje em dia a animação do lado de cá está invariavelmente dividida em duas grandes e engessadas vertentes: a visão feminina, ainda que machista, da Disney com suas adaptações de contos de fadas, quase sempre protagonizadas por mulheres (desde a estreia em 1937 de A Branca de Neve e os Sete Anões) e a nova animação, mais tecnológica, protagonizada quase sempre por personagens masculinos, sejam eles peixes, carros, super-heróis, ogros, brinquedos, treinadores de dragão, ou mesmo luminárias. Tendência lançada pela Pixar e seguida com afinco pelos outros novos estúdios do gênero.

Eis aí a importância do projeto. Era preciso que um estúdio que não costuma se intimidar assumisse o desafio de trazer às telas uma animação feminina moderna, como suas outras produções, e ao mesmo tempo mudasse o modo de contar história que faz sucesso há 75 anos. Quem assistiu ao belíssimo prólogo de Up – Altas Aventuras ou toda a silenciosa primeira parte de WALL-E sabia que isso era possível.

Acostumados a tentar, os “garotos” da Pixar foram atrás desse objetivo. Para começar, entregaram o projeto, pela primeira vez, a uma mulher, Brenda Chapman (O Príncipe do Egito), mas por alguma razão mudaram de ideia no meio do caminho e quem concluiu o filme foi Mark Andrews, desenhista do estúdio e diretor do curta One Man Band, o que fatalmente influenciou no resultado final da história.

Ainda que tenha alcançado alguns de seus objetivos, se aproximando do estilo Miyazaka e de uma protagonista feminina mais realista, o filme não consegue se acertar no ritmo, começa lento demais e é bem menos cativante do que deveria ser na apresentação de seus personagens.

O visual místico das terras britânicas é de tirar o fôlego, principalmente nas perfeitas cenas no meio da floresta, e há muitas outras qualidades, visuais, sonoras ou de texto, mas nada consegue desfazer completamente a estranha sensação de falta de tempero ou, pior, da impressão de estarmos diante de passagens desnecessariamente repetitivas, o que, por si só, contraria as expectativas.

Mas não é que, ainda assim e apesar de todos os defeitos, o filme consegue emocionar? Principalmente o público feminino que reconhece em Mérida sentimentos muito particulares, principalmente na relação com a mãe.

Uma bela história, com muito potencial, que talvez tenha sido prejudicada pela falta de experiência com histórias do universo feminino, mas que é tão ousada em sua tentativa que não pode passar despercebida.

Quem se permitir conhecer ainda vai se deparar com muitos momentos únicos que só a Pixar pode proporcionar. Não vai ser a melhor experiência com o estúdio, mas não deixa de ser uma grande experiência. E um interessante começo.

P.S.: A versão brasileira da trilha sonora mais atrapalha do que ajuda.

Um Grande Momento

Todo o visual é lindo, mas Mérida andando sem rumo no meio de tanto cinza é maravilhoso.

Logo-Oscar1Oscar 2013
Melhor Animação

Links

IMDb Site Oficial [youtube]http://www.youtube.com/watch?v=t7PZ143gCNI[/youtube]

Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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