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Milk – A Voz da Igualdade

(Milk, EUA, 2008)

Drama

Direção
: Gus Van Sant
Elenco: Sean Penn, Josh Brolin, James Franco, Emile Hirsch, Diego Luna, Alison Pill, Victor Garber, Lucas Grabeel, Dustin Lance Black
Roteiro: Dustin Lance Black
Duração: 128 min.
Minha nota: 7/10

Nunca tive tanta dificuldade para falar sobre um filme como aconteceu com Milk. Tudo porque as minhas impressões foram muito mais emocionais do que racionais, porque o lado humano do filme falou muito mais alto do que suas técnicas especificamente.

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Harvey Milk foi o primeiro homossexual assumido eleito para um cargo público nos Estados Unidos. Depois de superar suas barreiras pessoais, ele assumiu o cargo de ativista político pelo direto das minorias discriminadas e sempre violentamente rechaçadas e, com sua coragem, mudou a vida de muitas das pessoas.

Depois de quatro anos ouvindo nãos e não concordando com a visão que alguns diretores queriam assumir para a sua história, Dustin Lace Black achou em Gus Van Sant a pessoa perfeita para levar às telas sua mensagem.

Diferente dos trabalhos anteriores do diretor, Milk assume um tom documental e quase de homenagem e faz pensar. É duro saber que vivemos em um mundo que repudia e condena ainda hoje pessoas que não seguem o padrão “normal” e “aceitável” pela pequena sociedade dominante e formadora de opinião. Mais duro ainda é ter a plena consciência de que tudo isso já foi muito pior do que é hoje, quando não existia ninguém que falasse por essas minorias.

Muito mais do que um filme sobre homossexualidade, Milk trata da intolerância humana em suas mais diversas ocorrências, seja com pessoas de etnias, idades, sexo e classe social diferentes, ou com deficientes físicos, estrangeiros e com aqueles que têm crenças ou modos de vida diferentes.

Cenas como a do discurso quando, depois de uma ameaça de morte, vemos Harvey Milk e muitos outros com o triângulo rosa utilizado pelos nazistas para definir homossexuais e as frases absurdas Anita Bryant falam tão alto que no final do filme somos quase obrigados a refletir sobre tudo isso.

Deixando de lado toda a questão humana, o filme não é tão grande assim. Tem pontos altos e que merecem todo o destaque, como as interpretações impecáveis. Sean Penn consegue se desvencilhar de toda a sua personalidade para criar um Milk que em momento nenhum é exagerado, caricato ou linear. Pelo contrário, constrói perfeitamente uma figura que luta contra seu próprio preconceito e tem comportamentos independentes, como qualquer ser humano.

Junto com ele, James Franco, Josh Brolin, Emile Hirsch e Diego Luna, cada um a sua maneira, também surpreendem e não se deixam levar pelo óbvio. A opção pelo uso de imagens da época, com depoimentos reais e o uso do envelhecimento de imagens também acerta em cheio, assim como a maravilhosa trilha sonora de Danny Elfman.

Mas fora de sua seara natural, Van Sant parece um pouco perdido e peca por querer ressaltar o que não precisa de comparações, como quem não acredita no potencial dramático daquilo que tem nas mãos (Tosca).

Outra coisa que me incomodou um pouco foi a ausência de mulheres na trama. Tirando uma, a secretária de Milk, todas as outras são preconceituosas. Essa questão, inclusive, foi abordada pela Lola em seu blog.

No mais, é um filme comum que peca por sua parcialidade, por sua omissão e pela insegurança do diretor, mas tem tanta coisa a dizer que não pode deixar de ser visto e merece toda a atenção pois, assim como diz Milk, quanto mais se falar sobre as coisas, quanto mais elas forem explícitas, maior é a chance delas serem compreendidas e aceitas.

Um Grande Momento
Depois de ler o cartão.

Logo-Oscar1Oscar 2009
Melhor Ator (Sean Penn), Melhor Roteiro Original

Milk - A Voz da Igualdade


Prêmios e indicações
(as categorias premiadas estão em negrito)

Oscar: Filme, Direção, Roteiro, Ator (Sean Penn), Ator Coadjuvante (Josh Brolin), Figurino (Danny Glicker), Edição (Elliot Graham), Trilha Sonora (Danny Elfman)

BAFTA: Filme, Roteiro, Ator (Sean Penn), Maquiagem (Steven E. Anderson, Michael White)

Globo de Ouro: Ator (Sean Penn)

Links

Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.

Um Comentário

  1. Creio que a história seja tão grande, que supere detalhes individuais! O diretor optou por mostrar o que de mais importante teria: a contribuição política e humanitária de Harvey Milk.
    Quanto tudo começou realmente a acontecer eu tinha 12 anos! Hoje, aos 43, vejo que faz tão pouco tempo. E admiro a coragem e atitude que eles sequer sabem que tiveram… especialmente Milk.
    O filme não é maniqueísta, não opta por soluções clichês (talvez fosse questionável apenas a situação da inclusão de Tosca – se é que ela não estava em cartas quando da morte de Milk e se as locações – Prefeitura e Teatro não são vizinhas).
    O filme é um doc ficcional, opção do diretor talvez pela grandeza da história. Não é apenas para cinéfilos ou gays! É para as massas, para fazer pensar aqueles que se recusam a lidar com o assunto.
    Mas há momentos grandisos, como as imagens iniciais, da época, sobre as batidas nos bares gays, a vergonha que as pessoas tinham… quando Milk chama o garoto que tem a “calça de bom caimento” e fala sobre uma tomada de atitude… a entrada de uma mulher para diretora de campanha e a reação dos correligionários de Milk… ou a reunião na casa do diretor da Advocate, para discutir a campanha contra a nova emenda, em que Milk fala de visibilidade…
    Sim, tudo política… porque a despeito da individualidade de Milk e seus companheiros, sua contribuição definitiva – e creio que ele assim o queria – foi política. Minha geração, mesmo no Brasil, não seria a mesma sem Milk. E lembrem que tudo aconteceu depois do maio de 68, na França, dos beat neaks, do movimento hippie, da Revolução Sexual…
    Quanto a Tosca, vi alguns snobs falarem da versão pobre e em pedaços que foi apresentada. Quantos daqueles que vão ao cinema têm sequer um cd pirata com árias de óperas populares em casa???
    Grande momento do cinema. Viceral, parcial, porque sem paixão, sem parcialidade, não há movimento.

  2. Olá, pessoas!

    Demas – É bom mesmo trocar idéias assim. E, por pior do que possa parecer, tem muita gente ainda hoje que morre sem se assumir por medo da família e da sociedade.

    Dani – Sean Penn é mesmo maravilhoso.
    Pois é, o filme é bem diferente do que andaram falando por aí e, como trata da vida de um dos maiores ativistas do movimento homossexual, não tinha como não ser sobre isso.
    Acho que é um filme que merece ser visto, apesar dos problemas.

    Beijocas para vocês!

  3. Adorei a interpretação de Sean Penn.
    Não achei que o filme tenha falado SOMENTE sobre o homossexualismo, mas acho que o foco principal foi esse sim.
    Achei tudo muito bem elaborado, não achei tão “pornográfico” como disseram por aí, mas não é um filme que possa ter a classificação livre, assim como milhares outros que já vi.
    O filme aborda um tema muito falado hoje em dia e que (na minha opnião) devemos ser bem cautelosos à respeito, que é o preconceito. As pessoas preconceituosas não são tão boas quanto pensam que são e acho uma pena que ainda existam pessoas assim no mundo, mas graças à poucos como o Milk, que tiveram coragem de se expôr, o preconceito está diminuindo.
    Não achei o filme digno de um 10, por conta de alguns detalhes, mas achei ele realmente bom, interessante, e recomendo à quem não tiver problemas em ver filmes com temas e cenas homossexuais.

  4. Cecília,
    estou adorando essa troca de idéias e pontos de vista, rsrsrs.
    Concordo que ninguém sai do armário de uma hora para outra, mas 40 anos de “clandestinidade” a sufocar tantos sentimentos e ideais me parecem ser motivo suficiente.

    Abração

  5. Claro, Demas!
    Gosto quando discordam porque isso nos obriga a refletir. É saudável!

    Concordo com você. Se fosse dirigido por héteros seria parcial também e essa parcialidade poderia atrapalhar ainda mais do que a de Van Sant.

    Sobre a omissão, muitas coisas aconteceram com Harvey Milk para que ele resolvesse levantar a bandeira do homossexualismo e sair do armário.
    Ninguém acorda um dia e resolve se assumir para todo mundo sem um motivo.
    Acho que essa informação acrescentaria ao filme, entende? Nem que fosse dada por alto.

    A insegurança está na segunda inclusão para mim. Gosto da conversa depois, inclusive. Mas nos momentos finais, ela sobra.

    Isso para mim, é claro!

    Beijocas

  6. Cecília,
    vou discordar, ok?
    Se fosse escrito e dirigido por heteros, seria parcial também, não seria? Sempre é, uma vez que não dá para tirar nossa visão de mundo/vida daquilo que escrevemos, falamos, fazendo, você não acha?
    Também não vejo omissão e sim um recorte: dentre tantas coisas da vida de Harvey Milk, o roteirista escolheu a política como foco. E eu acho que, ainda assim, numa fala ou noutra, vamos percebendo detalhes das vidas dos personagens, embora eles estejam a serviço da “causa”.
    E não vejo a inclusão de “Tosca” como insegurança não. Sabia que essa ópera de Puccini era a preferida de Harvey Milk? Taí um detalhe menos político do personagem.

    Abração

  7. Oieee!

    Sérgio – Acho que não, mas também acho que esta não era exatamente a proposta do filme.
    Ainda não vi Frost/Nixon…

    Wally – Hoje a pessoa mais crítica que eu conheço me ligou dizendo que gostou muito.
    Eu gostei, mas não é um filme especial para mim.
    Como você disse, dividiu opiniões.

    Demas – Parcialidade porque é uma história por alguém que está intimamente ligado à causa, pois tanto o roteirista como o diretor são homessexuais e não podem se manter completamente imparciais, o que é compreensível.
    Omissão ao se deixar levar pelo lado mais político, ignorando detalhes pessoais que poderiam fazer a diferença.
    Insegurança ao inserir as duas cenas de ligação com a ópera Tosca (principalmente a última), deixando transparecer que não acreditava na força natural do filme e precisava deixá-la mais dramática.
    Quanto às duas atuações, ambas são excelentes!

    Claudio – Ele é maravilhoso mesmo, sempre. Mas dessa vez eu fiquei impressionada com o desprendimento e a capacidade de mutação.
    Achei a atuação de Rourke maravilhosa e também digna de todos os elogios e prêmios.
    Acho que ele nunca chegará nem aos pés do artista que é Penn, mas ainda assim merece aplausos.
    Ah, acho que o Vincent Vega de Travolta também não consegue chegar nem perto do Ram de Rourke.

    Beijocas para todos!!!

  8. Gostei de Milk, mas claro que não é dos melhores filmes do ano. A atuação de Penn, contudo, acho fenomenal. Ele é um verdadeiro ás no que faz e conseguiu fazer um personagem dificílimo sem caricaturas, muito comum em personagens homossexuais. Rourke está muito bem, o Lutador é melhor que Milk, mas Rourke não se compara a Penn. Nunca se comparou. Foi apenas um bom retorno às telas, como Travolta em Pulp Fiction. Mas nem Travolta nem Rourke serão Penn.

  9. Cecília,
    é isso mesmo. Talvez “Milk” não seja um grande filme, mas é – com certeza – um filme que deve ser visto: pela história do personagem central e pelas boas atuações. Não entendi o finalzinho do seu texto. Parcialidade? Omissão? Insegurança do diretor?

    Abração

    PS: Difícil também comparar as atuações de Rourke e Penn. A verdade é que eu ficaria feliz com o Oscar nas mãos de qualquer um deles.

  10. O filme dividiu alguns, mas acho que trata-se de um filme do qual gostarei muito…veremos. Ainda confio em Van Sant e Penn é sempre sensacional.

    Ciao!

  11. Gostei muito de Milk… ao contrário de vc e de várias outras pessoas acho que o lado intímo e pessoal de seus personagens foi explorado e estudado de maneira detalhada e abrangente. Diferente do chato Frost/Nixon…

    Até mais!

  12. Olá, pessoas!

    Márcio – Vi os dois sim. Tanto Rourke como Penn estão simplesmente fantásticos. Mas acho que para a composição do personagem Penn foi muito mais exigido.
    Acho que num mundo justo os dois empatariam!

    Kau – Sério. Não chegou a ser uma decepção para mim, mas não achei essas coisas todas que andam dizendo por aí.
    Quando digo lado humano, falo do que a questão de maneira geral causa em cada um dos que veem (isso sem acento é horrível) o filme e não da abordagem de Van Sant, que também achei um pouco omissa.
    E todo mundo está demais no filme, né? Fiquei surpresa com todas as atuações.

    Beijocas para vocês!

  13. Bom texto, Ciça. Milk foi minha grande decepção da temporada. Minha nota foi 6,5 e sinto uma falta imensa de sensibilidade e, principalmente, humanização ali. Gus deixa de lado a vida dos personagens e aborda somene o viés político de tudo, o que me irritou.

    Mas Seasn Penn é impressionante!

    Beijos!

  14. Não tive vontade ainda de ver este filme e acho que não vou ter. Nada de preconceitos, apenas não me chama nenhuma atenção.

    Você já assistiu o lutador? Queria alguma comparação de quem viu o Lutador e Milk para saber se Sean Penn atuou tão bem assim para ser melhor que Mikey Rourke. Ele detona em lutador!

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