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Os Croods 2: Uma Nova Era

Tentando chegar no amanhã

(The Croods: A New Age, EUA, 2020)
Nota  
  • Gênero: Animação
  • Direção: Joel Crawford
  • Roteiro: Kevin Hageman, Dan Hageman, Paul Fisher e Bob Logan
  • Duração: 95 minutos

Atenção! O texto a seguir foi escrito por uma mulher e fala de um filme calcado no patriarcado que quis se reinventar. O ano era 2013 e a Dreamworks Animation voltava à Idade da Pedra para contar a história de um pai que estava vendo uma filha crescer, tendo que se acostumar com a ideia de que o tempo passava e que um dia o ninho ia começar a esvaziar. E qual era a grande ameaça para o macho alfa? Um outro macho que tinha aparecido do nada e se aproximado do bando trazendo novidades, ameaçando a seu poder como líder e atraindo o interesse de sua filha mais velha. Os Croods foca na recente e a princípio estressada relação entre Grug e Guy e faz graça falando sobre esse duelo entre homens, tocando em temas como masculinidade tóxica e patriarcado.

Aquele primeiro filme traz conceitos bem antigos relacionados à mulher, como, por exemplo, o interesse amoroso da Eep como um dos principais motivos para ir embora, porque naquela época isso ainda era um dos poucos motivos que justificava a vontade de se distanciar da família, ainda mais quando homens eram tidos como tão necessários para a sobrevivência — pelo menos é o que se sabe ainda hoje. Mas, ainda bem, isso ficou para trás. Se naquele tempo as coisas ainda passavam despercebidas por muitos, depois de muita conscientização e conversas sobre o machismo estrutural, hoje em dia isso não cabe mais. Ainda que o male gaze sobre, o foco em Os Croods 2: Uma Nova Era se distancia dos atritos de Grug e Guy e se volta para as mulheres, que têm personalidades muito melhor desenvolvidas.

Os Croods 2: Uma Nova Era

Os roteiristas Kevin e Dan Hageman, Paul Fisher e Bob Logan, os quatro envolvidos em Lego Ninjago: O Filme e os dois últimos em Uma Aventura Lego e Hotel Transilvânia, se esforçam para fazer tudo certo. Poderiam ter feito melhor se tivesse chamado roteiristas mulheres para para integrar o time? Poderiam. Mas eles até conseguem divertir dentro de um imaginário feminino que começa a ser desconstruído ao romper com determinações bem nocivas. O filme tem o desejo de se renovar, de deixar o passado para trás. Assim como Guy, tem como objetivo seguir a luz e encontrar o seu amanhã e essa é uma analogia interessante: Os Croods 2 parte da Idade da Pedra e encontram o Amanhã que o personagem busca há luas e luas, ou pelo menos o que pode ser o começo dessa nova era do título.

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Claro que muita coisa ainda está ali, mas vem com outras interessantes. Por exemplo, quando Eep conhece Dawn, o roteiro brinca com o fato de não escolher o caminho mais óbvio desse encontro. Abre mão da disputa e cria uma relação que é super interessante, mas não resiste a fazer graça com o comportamento das duas, os gritinhos agudos e coisas do gênero. Todos os enaltecimentos das mulheres vêm seguidos de pequenos deslizes do tipo, alguns são marcas de anos e mais anos de representações viciadas, outros são tentativas infelizes de fazer com que as coisas funcionem, mas que esquecem de considerar individualidades femininas — não sabem que não é só trocar o sexo do personagem.

Porém, seria injusto falar que aquilo que faz não funciona enquanto entretenimento. Além disso, é inegável que, quando Grug, Guy e Phil são escanteados da trama e se veem em situação de perigo, quando o filme é assumido pelas mulheres capitaneadas pela Gran e suas novas Thunder Sisters, isso tem um valor de representação que merece alguma atenção. E Joel Crawford faz direitinho, não apenas aí. O diretor mescla bem ação e humor, e constrói um filme seguro no ritmo, que apraz com suas inserções de videoclipes e a apresentações de personagens em meio à ação que lembram desenhos antigos.

Depois de todo o tour por muitas paisagens e de chegar a um novo lugar, que possibilita novas piadas e novas interações, novos desafios e combates, Os Croods 2: Uma Nova Era se divide em duas experiências distintas. Contextualmente, deixa muito claro, por onde quer que se olhe, que é um filme que quer chegar lá e até faz alguma coisa para conseguir, mas não há como não dizer que não falta nada. Como produto de entretenimento, funciona muito bem e tem ótimos momentos, para pequenos e adultos, fazendo rir um bocado e torcer também. É divertido, muito, e é também um começo atrapalhado, mas não deixa de ser um começo.

Um grande momento
Thunder Sisters

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Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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