Crítica | Outras metragens

Fotos Privadas

(Fotos Privadas, BRA, 2020)
Nota  
  • Gênero: Ficção
  • Direção: Marcelo Grabowsky
  • Roteiro: Marcelo Grabowsky, Aline Portugal e Manoela Sawitzki
  • Duração: 20 minutos

Eu sou a sobra junto com as sobras
Eu não sou mais
Eu prometi que nunca mais
Que tanto faz, mas Deus bem sabe
Do quanto eu peco

Rafa e Mateus formam um casal que busca reacender o desejo chama um terceiro elemento para ir até a casa deles fazer um ménage. Está dada a partida de Fotos Privadas, filme de Marcelo Grabowsky que teve sua estreia no Festival Mix Brasil no ano passado e agora também concorre na Mostra de Curtas brasileiros em Gramado.

Na curiosidade, no temor e na tentativa de descontrair o espesso espaço da espera que vai se formando entre Rafa e Mateus, Fotos Privadas abre com uma cena imaginativa onde os offs dos dois se misturam as percepções de pessoas passando pela calçada em frente ao prédio, com bares circundando o perímetro. Típicos jovens “Santa Ceciliers” (versão mais descolada e tropicalista dos “Vila Madaleners”, jovens amantes de plantas, de discos de vinil e de esquerda segundo os editores da revista Veja SP) que moram juntes, dividem contas e a cama enquanto estudam/trabalham eles tem um baque com a chegada do convidado.

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Como numa dança a princípio sincopada e depois ruidosamente desencontrada, Fotos Privadas expressa o desacerto entre Rafa e Mateus quando o primeiro se deixa seduzir pelo estranho, já quando este o confunde e acha que ele é o arquiteto e não o médico. Instituindo para além do tesão uma relação de poder, Rafa se sente validado enquanto penetra aquele corpo que não é o do seu companheiro, mais velho e estabelecido profissionalmente – mas não necessariamente mais maduro.

Entre pequenas elipses, as Fotos Privadas do título aparecem no celular de Rafa. Está identificado o escape, não necessariamente os motivos das ranhuras na relação conjugal monogâmica mas uma apraz sinalização de que nada está bem. Mateus não aceita o convite do visitante para fumar maconha, hábito que ele e Rafa não possuem mas que o namorado logo trata de adotar. Os nudes, as fotos privadas fortificam um novo (amor?)

“Eu te amo só que não tá dando mais”

Sem querer dar ou receber Mateus, fumando um cigarro na varanda, constata que a relação se esvai. O corpo que não está mais ali tampouco é o de Rafael, andando apressado pelo Minhocão, madrugada adentro, para ter ao menos mais um vislumbre da fagulha da sensação de excitação. Da novidade.

Grabowsky, em colaboração com Aline Portugal e Manoela Sawitzki escreveu pensando na era dos relacionamentos líquidos, efêmeros ou não tanto, dessa era só desejo e do vínculo que começa a se solidificar nos aplicativos de paquera, na troca ou no rapto de imagens do corpo que é almejado. Erótico e melancolicamente conectado com o cancioneiro contemporâneo alternativo nacional, Fotos Privadas absorve o amargor do desencontro dos sentimentos, o “gozo triste” que caracteriza alguns fins e joga sal em feridas que demoram mas um dia vão cicatrizar.

Um grande momento
“Você esqueceu a carteira só pra me ver de novo”

[49º Festival de Cinema de Gramado]

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Lorenna Montenegro

Lorenna Montenegro é crítica de cinema, roteirista, jornalista cultural e produtora de conteúdo. É uma Elvira, o Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema e membro da Associação de Críticos de Cinema do Pará (ACCPA). Cursou Produção Audiovisual e ministra oficinas e cursos sobre crítica, história e estética do cinema.
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