Crítica | Streaming e VoD

Intervenção

Ah, se o roteiro fosse bom…

(Intervenção, BRA, 2019)
Nota  
  • Gênero: Ação
  • Direção: Caio Cobra
  • Roteiro: Rodrigo Pimentel
  • Elenco: Bianca Comparato, Marcos Palmeira, Dandara Mariana, Rafael Losso, Rainer Cadete, Babu Santana, Zezé Motta
  • Duração: 90 minutos

Foi um longo caminho até a estreia de ‘Intervenção’, produção que a Netflix disponibiliza a partir de hoje rodada há quase 4 anos, e que durante um bom tempo tentou estrear no circuito, sendo constantemente adiado e acabando por se tornar mais uma vítima da pandemia no nosso cinema, tendo sua distribuidora, a Paris Filmes, vendido seu passe para o streaming assim como aconteceu com outros. Enfim podemos conferir mais um filhote de ‘Tropa de Elite’ e ‘Alemão‘, com todas as acusações morais que poderiam ser feitas a qualquer filme sobre a relação entre o mundo do crime e a polícia no Brasil, mas sem as qualidades técnicas que sobram nesses títulos.

Dirigido pelo estreante em ficção Caio Cobra e escrito por Rodrigo Pimentel e Gustavo de Almeida, o filme é repleto de boas intenções, e tenta ampliar o leque da discussão sobre corrupção policial, posicionamento da sociedade diante dos desmandos coletivos, o papel do tráfico dentro das comunidades e a relação perniciosa da comunidade com ele – a ideia era excelente. O resultado é um filme acima de tudo didático, que parece ter sido produzido para o exterior, porque mesmo adolescentes já têm conhecimento de tudo que o filme mostra. E a forma como ele mostra essas relações, seus resultados e suas ações, sempre esbarra em um tom professoral em diálogos pouco convincentes, como se aqueles dados fossem desconhecidos.

É uma forma pouco elegante de tratar de um assunto que merecia uma postura menos posada, com mais integração entre narrativa e direção, que parecem seguir caminhos distintos. Cobra não consegue conduzir com segurança o projeto, mas constantemente tenta criar para desenvolver seu filme, mas é sabotado com regularidade por desenhos de personagens esquemáticos e situações estereotipadas, ainda que em intenções de quebrar a visão a respeito da ordem das coisas. Isso vai de encontro com as soluções narrativas que o filme cria, que são de procedência inferior ao trabalho estético, porque a estrutura geral é quadrada.

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Acaba valendo pouco então a crítica que o filme faz a todos os lados da equação, principalmente porque nenhuma voz tem um embasamento reverberado no próprio filme. Sei que Pimentel é um profissional da área retratada, mas parece que sua função como roteirista não foi ainda completamente favorecida, porque cada passo dado pelo filme tem uma clara motivação posterior demarcada. Ou os próprios diálogos expositivos de cada cena, que deixam o filme sem qualquer intenção de ambiguidade. Quando tudo se explicita, tudo perde o contorno viável para possibilitar mais de uma leitura; tão chapado que é, mesmo com a multiplicidade de vozes, todas elas soam rasas.

O elenco, no entanto, tem papel crucial para tornar todo o arranjo menos problemático, e o faz até com facilidade. Especialmente Marcos Palmeira e Babu Santana escapam com esmero das armadilhas e entregam performances admiráveis, mas Rafael Losso, Dandara Mariana e Vitor Thiré tem belos momentos também. A maior prejudicada pelo roteiro é a protagonista Bianca Comparato, que não consegue se desvencilhar da postura que a narrativa cria para ela. A atriz faz o que pode para tornar sua postura crível, mas o roteiro a coloca no olho do furacão das soluções narrativas ruins, sempre com um posicionamento politicamente correto, até sair radicalmente do trilho e a personagem perder toda a credibilidade.

Com o elenco tentando e o diretor que não consegue injetar mais gás do que o roteiro permite, ‘Intervenção’ carece de uma base de segurança que nunca aparece, deixando uma produção à deriva. Seus momentos tensos são bem segurados pelo trabalho de Cobra, mas quando o filme depende das linhas que montam seu cerne narrativo, o trabalho emperra e revela suas fragilidades. Aí parece cair por terra qualquer acusação de fascismo ou afins que poderíamos vir a fazer, porque o filme sozinho já se implode narrativamente; sobra ao espectador resgatar os sobreviventes.

Um grande momento
Dois policiais feridos no corredor

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Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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