Crítica | Outras metragens

Nosso Panfleto Seria Assim

Perseverança

(Nosso Panfleto Seria Assim, BRA, 2024)
Nota  
  • Gênero: Documentário
  • Direção: Leandro Olímpio
  • Roteiro: Leandro Olímpio
  • Duração: 25 minutos

Leandro Olímpio por muitos anos foi jornalista e se aproximou dos trabalhadores de uma refinaria de petróleo no litoral paulista de Santos e também em Cubatão, local que recebeu holofotes agora com a estreia de Pedágio, de Carolina Markowicz. Lá acabou conhecendo e iniciando amizade com Fábio Mello, um dos líderes sindicais e combativa figura contra a venda do pré-sal ao mercado exterior. A forma como essa figura é mostrada e seu empenho em ser ouvido a qualquer custo, em grande parte das vezes em vão, é a mola propulsora do tocante Nosso Panfleto Seria Assim. Um grito por atenção de um homem que só queria mostrar o que ninguém queria ver, e por isso acabou lutando com poucos ao seu lado no ímpeto de alertar a todos. 

Não é difícil se sensibilizar pela luta de Fábio, um líder nato cuja voz não tem descanso. Se suas plataformas não alcançarem o eco necessário, sua própria força de vontade o fará. Nosso Panfleto Seria Assim abre com o personagem na porta da refinaria tentando ser ouvido empregado por empregado, que passam por ele quase tratando-o como invisível. Ver alguém ser sistematicamente ignorado, não ter um olhar sequer direcionado a seus pedidos, isso vindo de alguém que está lutando por todos, é algo que resvala na dor de assistir. A forma empática com que Olímpio mira sua câmera para Fábio deixa a situação ainda mais melancólica, que ainda assim ergue imagens para tornar a luta desse homem em algo cheio de valor. 

É através de seus discursos e ações que Nosso Panfleto Seria Assim monta um quadro não de precarização do trabalho, mas de inutilização de um discurso onde não há nada de negativo, muito pelo contrário. A tal da precarização até existe, afinal é pensando em possíveis ameaças que muitos dos colegas do protagonista não o ouvem, mas o filme quer ampliar seu olhar mais para esse agente de mudança. Como trata-se de uma produção de apenas 25 minutos, o estudo de personagem que poderia ser feito aqui não consegue se expandir, deixando suas observações para o campo da leitura de suas motivações. No exíguo tempo que dispõe, Olímpio rapidamente complexifica as movimentações de uma figura arrebatadora. 

Apoie o Cenas

Documental na forma mais positiva possível, estamos diante de um título cuja força cênica é centralizada na descoberta de uma figura central que justifica uma possível desistência da direção em estetizar o todo. Porque a história de Nosso Panfleto Seria Assim abdica de artifícios para se provar atraente, através da carga de sedução imbuída em filmes sobre mão de obra explorada. Como a reproduzir mestres como Leon Hirszman na hora de mostrar um universo que Gianfrancesco Guarnieri tão bem conhecia, estamos diante de uma visão nada romântica de Eles não Usam Black-Tie. E é exatamente da forma seca que a produção acaba conseguindo extrair cada vez mais emoção e imagens que impactam pela crueza. 

É quando enfim chegamos no embate entre Fábio e policiais durante uma tentativa de greve e aí Nosso Panfleto Seria Assim engata uma sucessão de grandes momentos ininterruptos, mostrando a dualidade entre a força e fragilidade de um homem perseverante. Quando o maior problema de uma produção é ter a duração que tem, justamente por cortar nossa relação com o universo e o protagonista, é sinal de que o acerto foi grande. Tão delicado quanto dotado de uma força que não imaginamos, diretor e dirigido mantém intacto aqui a força e a qualidade do cinema proletário, aquele que só precisa de uma voz potente para continuar se mostrando moderno. Fábio Mello mostra que, se infelizmente o país não tem muito interesse em ser justo, felizmente fomos apresentados a alguém como ele.

Um grande momento

Da sirene ao choro

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
Assinar
Notificar
guest

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

1 Comentário
Inline Feedbacks
Ver comentário
Silvio Muniz
Silvio Muniz
25/01/2024 12:31

Filme excelente! Só ua correção: Leandro Olimpio por muitos anos foi jornalista, e não sindicalista, trabalhando pelo Sindicato cobrindo greves nas unidades da estatal no litoral Paulista e também na Refinaria de Cubatão.

Botão Voltar ao topo