- Gênero: Drama, Romance
- Direção: Kogonada
- Roteiro: Seth Reiss
- Elenco: Colin Farrell, Margot Robbie, Phoebe Waller-Bridge, Kevin Kline, Lily Rabe, Billy Magnussen, Hamish Linklater, Jodie Turner-Smith
- Duração: 108 minutos
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Kogonada estreou no cinema com um filme que simboliza não apenas a liberdade que se extrai de um cineasta de primeira viagem, como um marco prévio a uma mudança cada vez mais sentida. Ainda que Columbus não tenha mostrado sucessores dentro de sua própria obra, a distância que o separa do filme novo de seu diretor é alarmante em muitos sentidos. Não sobrou muita coisa daquele realizador em A Grande Viagem da sua Vida, novo título que ele assina, que em tudo parece o oposto de sua estreia. Soa quase como uma deturpação do que foi observado na sua estreia, partindo do ponto de que esse encontro nunca demonstra qualquer possibilidade de completude. Pelo contrário, o absoluto vazio daquelas vidas dispara um encontro possível repleto de tentativas de não ser visto como um clichê, e por isso mesmo não soar qualquer outra coisa que não exatamente essa.
Tudo o que existe de humano e natural na sua estreia, é substituído aqui por uma situação artificial que extrapola o próprio conceito de artifício. Porque Charlie Kauffman e Michel Gondry estão por aí, fazendo filmes com bandeiras fincadas no artificialismo e ainda assim absolutamente humanistas e até realistas, por mais paradoxal que isso seja. A Grande Viagem da sua Vida não é provido de elementos suficientes para que o espectador se importe com o que está assistindo, quase resultando em uma proposta estéril de eventos. Apesar de estarem sempre sendo confrontados com eventos de muitas naturezas – na verdade, um compêndio sobre a vida de cada um e os momentos que gostaríamos de consertar – sua dupla de protagonistas não são exatamente afetados por aqueles esforços, porque não causam sequer reflexão na tual viagem, concreta ou metafórica.
O ponto de partida (e todo o desenvolvimento) estarem a mercê de algo próximo ao realismo fantástico não é um problema, mas sim a falta de comprometimento da produção com algo muito mais simples: carisma. E isso não se compra, ou tem ou não tem. E a verdade é que A Grande Viagem da sua Vida, embora imagine tê-lo por conta dos astros em seu cartaz, faz tanto esforço para encontrar charme em torno das mais de duas horas de projeção, que nunca consegue alcançar esse tom de maneira natural. Ao invés disso, é um filme que soa o tempo todo estar à beira da programação, sem uma saída sequer que não seja identificada como robótica. Ou no mínimo encampada com o mais profundo vazio cênico e estético.
Dramaticamente, A Grande Viagem da sua Vida apela para o óbvio, e não será difícil encontrar admiradores entre grupos menos analíticos. Afinal, trata-se de um processo que se assemelha a tantos títulos anteriores, como Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças, O Show de Truman e Sinédoque, Nova York. O que está nesses filmes e não no roteiro de Seth Reiss (e muito menos na realização de Kogonada) é a veracidade com que seus temas são abordados e apresentados, e não apenas o apelo emocional proporcionado por sua premissa. Não importa se o que vemos é possível ou não, e nesse caso se aplica o que J. M. Barrie montou para seu clássico Peter Pan: se você acreditar no impossível, ele existirá. Não é o caso aqui.
Os casos de Colin Farrell e Margot Robbie são os exemplos perfeitos para essa situação. Nenhum dos dois parece muito disposto a encarar de frente a proposta do filme, e isso não é acarretado por falta de talento de ambos. Indicados ao Oscar, estamos diante de dois atores sempre comprometidos com o seu ofício, mas a sua tentativa de encarar uma proposta lúdica para contendas psicológicas facilmente tratáveis na análise não é bem sucedida porque eles percebem os mesmos pontos que o espectador. Farrell em particular se mostra deslocado no que está fazendo, sem jeito de vestir uma roupa que parece não caber em ninguém. Por mais que A Grande Viagem da sua Vida tentasse incutir entre eles a ideia da falta de química como um elemento básico entre dois estranhos, o que vemos é exatamente o que é, e que torna-se mortal em um romance: falta química aos atores, e aí não existe proposta que resista.
Em linhas gerais, A Grande Viagem da sua Vida é um filme onde os elementos certos não funcionam quando acrescidos uns dos outros. Não adianta misturar ingredientes disparatados; chocolate e macarrão são deliciosos, mas não no mesmo prato. Como um crescente senso de desconforto, o filme tem o êxito de nos fazer esquecer mesmo os elementos fúteis de seus componentes (a beleza de Robbie, por exemplo), porque a ideia é apenas sair daquela experiência e esquecê-la, como os personagens fizeram com aqueles pedacinhos de suas vidas. A cena final ainda mostra que nem tudo está perdido para a ‘sessão da tarde’ mais próxima mesmo que isso signifique tornar as coisas ainda mais esquecíveis.
Um grande momento
David é o pai


